vampiro goytacá
canibal
tupiniquim
*
poesia muito
prosa
viagens metafóricas por realidades reinventadas
Entre/Vistas
Simone Bacelar - Como você imagina que os leitores irão se
conectar com o personagem principal de "Vampiro Goytacá"? Há
elementos específicos na cultura Goytacá que você acha que serão especialmente
ressonantes ou intrigantes para o público?
Artur
Gomes – Apesar
de ser Goytacá o vampiro é um andarilho pelos telhados do presídio federal de
brazilírica, um observador atento do que se passa pelos bastidores dos
palácios. Acredito que ele tenha nascido em 2000 em algma passagem do livro
BraziLírica Pereira : A Traição Das Metáforas
Simone Bacelar - Quais são os desafios e as recompensas de escrever um
livro que mistura elementos sobrenaturais com uma rica herança cultural como a
dos Goytacás? Como você equilibra o respeito pela história e as lendas dessa
cultura com a liberdade criativa necessária para desenvolver a narrativa?
Artur
Gomes – Os
desafios são muitos, e enormes, mas as recompensas não posso prever se virá.
Sei que as narrativas dos personagens são provocativas em todos os sentidos da
vida humana. Sinceramente não sei como o leitor campista, irá recebe-las e
digerí-las, mas esta não é a meu ver a grande questão, que é exatamente
provocar esse choque, tentar tirar a cultura goytacá da sua estagnação e
levá-la a outras plagas fora da planície para que outros olhos possam ler, o
que não foi escrito pelos “historiadores oficiais”. Por ser um livro de poesia
e ficção não existe de minha parte nenhum compromisso com a “história”, e sim
com a criação.
Fernando Rossi - Como foi pensado a construção do
"Vampiro Goytacá"?
Artur
Gomes – Foi
sendo criada aos poucos, no correr dos anos, a partir do que cada personagem
viveu e escreveu a partir do momento em que foram criados. Eles não nasceram no
Vampiro Goytacá, já estavam presentes em livros anteriores. E a ideia de
“Vampiro” me surgiu de estalo, num período em 2023 em que fiquei hospedado no
Hotel Amazonas, observando aqueles paredes, caminhando por entre os seus
corredores. Ah! Quantos mistérios, quantas estórias que não foram contadas.
?
Fernando
Rossi - Onde
termina a ficção e fica a realidade nessa obra?
Artur
Gomes – A
ficção começa a partir do fato de que cada personagem tem suas viagens, suas
narrativas, suas vivencias detalhadas por vários “campos” do planeta terra, não
são campistas, e nem nela moram, são seres andantes, viajantes no tempo e no
espaço, mas acredito que não termina, o livro é uma obra inacabada, e as
realidades nele são viagens reinventadas.
Dinovaldo
Gillioli - Quando
venta a poesia na sua cachola de pólvora, que fogo anuncia?
Artur
Gomes – O fogo
de Iansã é vento de tempestade, todos os meus personagens femininos tem um
pouco dessa ventania da não definição em suas sexualidades, não só os femininos
mas alguns masculinos também, acredito que a poética neles nasce daí, do desejo
de matar a fome comendo o que estiver ao alcance de suas mãos.
Dinovaldo
Gillioli - Das palavras que ficam, das que somem, o que
mais te provoca lobisomem?
Artur
Gomes –
Acredito que em cada um de nós poetas, tem um pouco de vampiro um pouco de
lobisomem e as palavras que fiam são exatamente aquelas, que no momento exato
flui do homem e sua hora e as que somem são exatamente aquelas que tem mesmo
que irem embora.
Tanussi
Cardoso - Em sua obra, há uma carga estreita entre sua
vida e sua poética. Questões como a linguagem, o ofício do poeta e, igualmente,
os grandes desafios cotidianos, incluindo a amorosidade carnal e espiritual,
tudo isso, num verdadeiro comprometimento com o mundo que nos cerca. A sua
poesia – para quem acompanha sua obra – tem voz própria, única, reconhecida à
primeira leitura. De que modo você pensa a coisa ética na produção de um
artista?
Artur Gomes – Creio que todas essas questões colocadas
acima foram aos poucos me dando a consciência do que é ser poeta, artista, um
ser dedicado a criação de linguagens e
os desafios do cotidiano que nunca foram poucos. Se eu fosse pensar em ética,
talvez não escreveria metade do que tenho escrito ao longo desses 51 anos de
produção poética. Me preocupa mais a experimentação, o processo criativo para
chegar na finalização de uma escrita, seja ela prosa ou verso. Talvez meus personagens
nem tenham ética mesmo, pois se tivessem não satisfariam os meus desejos da
forma que podem e querem.
Tanussi Cardoso - Você, além de um poeta exponencial, é um
grande produtor e agitador cultural, desde o final dos anos 70. Qual a
importância dos eventos e movimentos culturais, na produção brasileira atual?
Artur Gomes – A partir da minha entrada para o Teatro em
1975, comecei a perceber a diferença como um público percebe o texto lido, e o
texto falado. E aí entendi que a poesia muitas vezes precisa da fala para ser
melhor sentida por quem ouve, que vai muito
além do que é entendido por quem lê. E aí entra também a questão da
falta de incentivo a leitura, para a maior parte da população do planeta terra.
E os Saraus, as Balbúrdias são fundamentais a meu ver para tentar preencher esses vazios, essas
lacunas.
Tanussi
Cardoso - Em que momento ou circunstância você se deu
conta da poesia possível em você? Ou seja: de onde vem e como nasceu o Artur
poeta?
Artur Gomes – Artur Gomes o ser humano, nasceu em 27 de agosto de 1948 na Cacomanga,
começou a escrever poesia na tipografia da Escola Técnica de Campos em 1961. E
a partir de 1973 começou a publicar. Mas acredito que o Artur Gomes poeta
nasceu pra valer a partir de 1983 quando começou a ter contato com a poesia dos
grandes mestres da poética universal, com a criação do projeto: Mostra Visual De Poesia Brasileira. E a
partir daí começou em 1985 com o livro
Suor & Cio, a focar todas as questões que envolvem os relacionamentos humanos dentro da sociedade
ondem vivem.
Tanussi Cardoso - Para você a literatura, ou a arte em geral, exige algum papel social de
seu criador? Se positivo, qual seria o papel social do artista, principalmente,
o do artista brasileiro?
Artur Gomes – Acredito que sim. Porque toda arte e a
literatura a meu ver também é, tem seus princípios e fundamentos. E o homem é
um ser social que mesmo sendo um artista não pode se eximir dessa condição.
Agora no Brasil, essa talvez seja a questão mais complexa para quem tenta viver
de sua arte, porque aí começa a surgir por exemplo, os valores dos mercados de
arte, a não aceitação de um grande
público consumidor, e isso acaba levando a maioria do artista brasileiro, a
seguir por caminhos que menos conflitem a sua arte, seja música, poesia,
teatro, artes plásticas, cinema, com as
condições impostas pelos donos do
mercado.
Tanussi Cardoso - Como você vê a poesia
brasileira contemporânea?
Artur Gomes – Vejo com uma diversidade nunca antes vista e uma expansão imensa na
quantidade de poetas que surgem em todos os cantos e recantos do país, e do
planeta, produzindo uma poética de altíssima voltagem. E muitos deles
utilizando-se dos recursos tecnológicos que tem em mãos, com muita
sensibilidade e inteligência.
Eugênia Henriques - Irina, esse ser meio apaixonante... Irina
existe mesmo ou é um lindo nome propício a uma rima ?
Artur Gomes – Irina é ficção de uma paixão platônica pela
palavra e não apenas pela rima. Acho que ela deve existir sim no
subconsciente ou no inconsciente coletivo
desse personagem que é um ser vivo pra muito além das mortes. Meus personagens ou
até mesmo certas palavras me vem assim num sopro ao sabor do vento em minha
viagens metafóricas.
Eugênia Henriques - O Vampiro Goytacá Canibal Tupiniquim é
médium? Exótico é o coração do Vampiro Goytacá: ora povoado de musas ora cravando os dentes em alguma carne
insensível. Como pode, no coração dele, coabitar lirismo e atrocidade?
Artur Gomes – Acredito sim, que em todo ser humano cabe
um pouquinho de mediunidade, ou uma multiplicidade de Eus, que nos possibilidades
a metamorfose das personalidades que extravasamos de acordo com o nosso
instante no “estado de poesia”. O Vampiro Goytacá Canibal Tupiniquim, no livro não
é um. São 12 personas em seus estados
brutos de lirismo ou em seus momentos de amores traídos e não concretizados
como tudo o que não fizeram em seus encontros marcados.
Carmen Moreno - O poema “Meu
santo dai-me” revela a poesia, e a arte em geral, como um remédio. As
diferentes linguagens artísticas, tão bem integradas na sua criação, curam sua
alma e seu corpo? Curam o Vampiro?
Artur Gomes – Meu corpo e
minha alma sim. Mas se curam o Vampiro Goytacá ainda não sei, porque ele
continua atravessando os telhados do presídio federal de brazilírica para
provocar suas balbúrdias ante o estado de coisas em que nos encontramos. E
talvez seja esse fogo, essa febre ardente como água quente que o faça assim em
vários multiplicado.
Carmen Moreno - Neste livro,
que reafirma seu perfil autoral, o inconsciente flui de forma generosa,
agrupando palavras em metáforas originais e dinâmicas. Há, inclusive, muitas
referências a autores e leituras diversas. Como funciona seu processo de
seleção, ou “organização”, para o formato de texto, desse fluxo farto do seu
inconsciente criador?
Artur Gomes – O meu processo
de criação não é muito organizado não. Só a partir de alguns poemas, textos,
narrativas escritas, que vou entendendo com mais clareza qual o personagem, de
quem é a v0z autora desse poema ou dessa narrativa, ai é que penso como
organizar em livro a sequencia do seu repertório. Como já afirmei várias vezes,
não planejo muito as coisas, deixo que elas fluam e ocupem o espaço branco da página, para que eu possa
refletir o que fazer com elas.
Carmen Moreno - O livro é
permeado por uma atmosfera de humor e leveza, mesmo quando o teor do poema/
texto retrata um fato mais denso. O humor também é sua marca na vida?
Artur Gomes – Acho que sim, o
humor deve ter sido herdado de Oswald de
Andrade e o teatro apesar de ser arte dramática, foi o me ajudou a ser bem
humorado, muitas vezes irônico e sarcástico até. Aprendi a contornar os dramas
da vida real com a fantasia das metáforas, as figuras de linguagens do meta/poema/meta.
Uma forma que encontrei de rir do trágico sem fazer tragicomédia.
Antônio Cunha - Amigo Artur, o
Vampiro Goytacá é o nosso Canibal Tupiniquim. Quem é, quem são ou o que são os
Bispos Sardinha da vez?
Artur Gomes – Acho que são
vários espalhados pelos telhados dos presídio federal de brazilírica. Os fantasmas
que precisam ser trucidados urgentemente para que o país volte a ser um país. E
que talvez país mesmo nunca tenha sido.
Antônio Cunha - A poesia não
pode acomodar. Na sua, a palavra arde. Esta é a meta e o alvo?
Artur Gomes – O alvo são os
olhos dos distraídos e acomodados, os que poderiam e podem fazer alguma coisa
para que essa cruel realidades das coisas que vivemos no Brasil fosse mudada,
mas pelo contrário só contribuem para que a realidade continue e se perpetue
mais cruel ainda.
Antônio Cunha - Você é um
poetator. Há algo na poesia que só a palavra dita alcança para além da palavra
escrita e vice-versa?
Artur Gomes – Sem dúvida
acredito, porque testemunho os resultados de tudo o que escrevo quando é lido,
e quando é por mim interpretado, dito, falado. Por isso uma das coisas que contribuíram
a me levar para o teatro foi querer aprender
a escrever poesia. Em 1975, tinha 3 livros publicados, e me incomodava não
saber o que os leitores acharam, que sensações ou impressões tiveram do que
leram. Daí a partir do teatro, comecei a ter essas respostas e do furor que a
poesia falada pode provocar em quem ouve.
Lado B –
Lado A
O lado B sempre conta uma história que mesmo sendo a mesma o
lado A não tem coragem de contar assim como marisa pode ser mim mesma federico
baudelaire também pode ser federika lispector euGênio mallarmé rúbia querubim
todos serAfim do mesmo canibalismo tupiniquim
desses templos trevosos que mostram escancaradamente onde foi parar a
humanidade não apenas estes mas também os outros nove se debatem na estrada do
desespero procurando a fresta alguma luz no fim do túnel nos telhados de
assombradado ou nas vozes de lobisomens que ecoem dentro das paredes do hotel
amazonas afogadas que foram nas águas do paraíba quando ainda império galvez
passou por aqui
Experi/mentalismo
recluso na estação 353 uso tempo para exorcizar o mal secreto na
contra/mão Wally Salomão: experimentar o esperimental - uilcon pereira me
ensinou as sample/ações nas sagradas
escriduras de jommard muniz de britto um grito:
joaquim branco em sua zona de conflito:
“gigantes medonhos / arrastando a noite / clarenigma / pássaros de sonhos / apartando os olhos / negrenigma”
genocidas no congresso aprovam leis para liberação de agrotóxicos e a gente se
ferra: Yara Fers e seu peito perfurado da terra:
“enfio as mãos na terra
para escrever o poema
e as mãos não estão
sujas
remexo o barro
as pedras
sinto os grãos
enfiados nas unhas
em simbiose
e minhas mãos
não se sujam
é a terra que está
suja de mãos”
adeus sementes de abóbora in-natura que mastigo para aliviar a profilaxia prostática nesse tempo estático nada do que penso da estética sobre a ética passeia entre meus olhos soturnos guima meu mestre guima em mil perdões eu te peço o poema pode ser um beijo em tua boca por quê trancar as portas tentar proibir as entradas ? te beijo vestida de nua comigo ninguém pode espada de são jorge ogum de cia sputinik no quintal alegria a prova dos nove do meu cão experimental sei por onde vou não faço parte do outro lado da parte dessa escória que enferruja a história que passou nem do diabo a quatro quando muito cito Oswald e também cito Torquato neto do meu pai se chama Dedé meu afilhado em Deus eu tenho fé um dente de alho sobre a mesa Carlos Gurgel viajou de Natal pra Fortaleza antes do amanhecer
um girassol riscado a giz o dia ainda vai raiar um poema ainda
vai nascer no vai e vem dos seus quadris Cazuza pra desvendar na atual
constituição qual é o nome da meretriz o homem com a flor na boca ainda
desfolha a bandeira com sua língua de
trapo no pantanal desse país.
O chão que nos espera
tem pessoas que ainda gostam de fantasias ilusões
ideias que não cultivo mais a pedra pólen inda me guia quando admiro céus sóis
estrelas luas cheias vez em quando pedalo até a praia a procura de ouvir o
canto da sereia à beira mar yemanjá
continuo caminhando nesse chão que nos espera poesia além da morte bem
pra lá dos girassóis para encontrar nas pradarias a orelha de van
gog e seu instante em desespero
não espero muito como alguém que do outro lado do oceano me espera
nem todo poema curto
nem todo endereço acerto
a meta do poeta é o alvo
o alvo do poeta é a meta
a flecha estendida no arco
o arco estendido na seta
eu quero teus olhos de vidro
não poema em linha reta
nem toda cidade prova
nem todo poema povo
a clara da gema nova
pode estar dentro do ovo
a massa e o biscoito fino
o biscoito fino pra massa
no Dia D da fornalha
acendo a fogueira na praça
*
portugais meus eus meus ais
pátria fátria minha de onde veio meu pai e alguns
meus ancestrais
desejos ocultos poemas não escritos
fonema não falados
circunstanciais
meu porto tejo rio que não passa
em minha
aldeia e agora vem coimbra lisboa mais
antiga que me navega ao braga me descuida
e me desfaz
redes sociais
depois de tanto amor
apenas um oi
como uma foice
me corta do face
mostra a outra face
sem nenhum receio
não sei pra
onde vai
nem de onde veio
amazônica
eu te desejo flores
e um facho de fogo
em couro cru & carne viva
o lance da vida é um jogo
de dados – mistérios
desvendamos sem medo
assim como música do chico
tatuarei os sinais dos teus dedos
em minha pele
sem nenhum segredo
o secreto me foi roubado
na missa do sétimo dia
meu profano
bem mais que
sagrado
pano de chão pra poesia
não
vendo ilusões
diante
da miséria
que assassina corações
"Nunca fomos catequizados fizemos foi
carnaval".
Oswaldo
de Andrade.
Nunca
fomos colonizados, fizemos foi Balbúrdia anti-colonial.
Sady Bianchin
Ou a gente se Raoni
Ou a gente se Sting
Luis Turiba
uma
cidade sem memória não é uma cidade
Federico Baudelaire
Campos
precisa acordar para voltar a ser
Rúbia
Querubim
tocar-te por dentro lentamente calmamente como quem morde a maçã na boca da serpente e uiva mastigando a
carne como sobremesa
Artur
Kabrunco
o gosto da tua carne não conheço não me deste
o endereço
Federika Bezerra
transverso anjo avessso
atravesso as artérias da cidade águas do paraíba emporcalhadas de esgotos
Irina Serafina
como poesia devoro para
matar a fome quando oro o prazer tem outro nome
Artur Gomes
absinto impossível te
sentir mais do que já sinto
Pastor
de Andrade
cidade veraCidade nossas
angústias penduradas nos varais
Federika Lispector
viva a
lira do delírio antropofágica paulistana metendo a língua desbragada nos
bordéis de copacabana
Lady Gumes
o delírio
é a lira do poeta se o poeta não delira sua lira não concreta
Artur
Fulinaíma
desde os
tempos de moleque para descascar carne de manga faca facão canivete arma branca
de pivete nos quintais da cacomanga
EuGênio Mallarmè
não tenho
papas na língua nem pastor me come as
coxas eu sou do mar da tempestade beira mar é quem lambe
as minhas ostras
Gigi
Mocidade
Artur Kabrunco e suas metáforas vagabas me enclausuraram entre os corredores do presídio federal de brazilírica perdi a lírica nem sei o que estou fazendo por aqui - enlouqueci
Macabea – A Outra
eu tenho o sangue
afro que ainda
corre em minhas veias
sou a lama do mangue
a bio/diversidade
flor do lácio serafim
nos currais desta cidade
arquitetura/poesia
enquanto arquitetos desenhistas
desenhavam eu foto.grafava escrevia poesia muitas vezes a arquitetura do poema me
vem em linhas fulinaímicas
sinuosas se em verso ou prosa não explico o que me importa é o ofício ao qual
eu me dedico
por
enquanto
vou
te amar assim em segredo
como
se o sagrado fosse
o
maior dos pecados originais
e minha língua fosse
só furor dos canibais
veraCidade
por quê
trancar as portas tentar proibir as entradas se já habito os teus cinco
sentidos e as janelas estão escancaradas ? um beija flor risca no espaço
algumas letras de um alfabeto grego signo de comunicação indecifrável eu tenho
fome de terra e esse asfalto sob a sola dos meus pés agulha nos meus dedos
quando piso na augusta o poema dá um tapa na cara da paulista flutuar na zona
do perigo entre o real e o imaginário joão guimarães rosa caio prado martins fontes
um bacanal de ruas tortas eu não sou flor que se cheire nem mofo de língua
morta o correto deixei na cacomanga matagal onde nasci com os seus dentes de
concreto são paulo é quem me devora
selvagem devolvo a dentada
na carne da rua aurora
balburdiar eis o verbo
ver pra crer
:
difícil
de falar
ótimo de fazer
amor
balbúrdia gozosa
jorrando poesia
enquanto
goza
fazer balbúrdia
jogo de cartas
sem baralho
:
dá prazer
mas dá
trabalho
serAfim 1
- artur gomes
curta brisa
não tem jeito
a vida é uma fera
quando menos se espera
uma hora qualquer
a máquina dá defeito
então o que me resta
para não perder o fim da festa
- fechar a boca
cortar um kilo disso
outro daquilo
e nada de comer aquilo
porque o vento me avisa
a melhor coisa é comer a
brisa
e curtir a atriz enquanto ela
me desliza
entre o poeta e a musa
para May Pasquetti
houve um tempo de comunhão e
sacramento de bento ao parque das ruínas a poesia deslizava em minha íris
retina brisa flutuava entre confete
purpurina mesmo não estando em teresina
- tanta poesia me deixou tesa
domingo de rock em santa teresa me larguei a falar quintana sem me preocupar
que dia era da semana de tanto comer poema
me tornei atriz de cinema a vida tem coisas que não avisa chega de
surpresa me pega e eterniza
não acredita?
me veja lá no curta brisa.
A inocência do mortos
para Adriano Moura
mesmo ainda não tendo lido
ouso dizê-lo: objeto direto -
substantivo - a inocência dos mortos
espanta a ignorância dos vivos
Pensamento Chão
para Viviane Mosé
lavo a palavra solidão que no palácio da
cultura é quebrada pelo barulho das espátulas raspando paredes e
teto até os livros sentem a falta
de afeto por não serem tocados por mãos ávidas por leitura -
meta poema
para Ribamar Bernardes
meta poema direto na veia
meta abstrata concreta simbolista meta poema em linha curva pra não cruzar com
a linha reta a meta do poeta é a lata me dizia gilberto gil quando a letra não
maltrata se a musa é arquiteta
meu santo dai-me
para
Juliana Stefani
certa vez Tchello d´Barros
meu parceiro KINO3
para curar hipertensão
me recitou 1 soneto por dia
e 3 haicais de 8 em 8 horas
ora bolas
nunca tive pretensão
de ter saúde de ferro
dizem que não falo - berro
e quando xingo poesia
o silêncio grita pro meu
santo
dai-me 0 chá que preciso
para arrancar esse dente do
juízo
e se ainda não melhorar
me diz o Ribamar
procure a UPA
unidade de poesia autônoma
para arrancar esse dente
me diz Tchello novamente
e se doença for crônica
nem Mário Quintana
só uma Crônica por semana
e não se envergonha
porque nem te CONTO mininu
me diz Jiddu Saldanha
lendo a dica de primeira
que me deu Ricardo Vieira
nesta insana quinta-feira
1 poema visual de 12 em 12
horas
mas só se for recaída mesmo
meu irmão
complementou Tchello ao
telefone
só uma sopa de letrinhas
pode amansar hipertensão
e aplacar a tua fome
imaginem se vou suportar
daqui pra frente
essa dieta alimentar ? :
sem açúcar állcool farinha carboidrato
chocolate
: me faz pensar :
sai pra lá nutricionista
me deixa :
vou virar peixe
morar no mar e comer peixa
para ademir assunção
um nome escrito
no vento
não quero o
sentido normal
da coisa como me
aparenta
quero a
realidade
exatamente como
a gente
simplesmente inventa
nonada
ela me inspira me transpira me transborda estico a
corda para alinhar o plumo no rumo certo do poema a seta no foco o poema em
linha torta para entortar a linha reta
no concreto do
abstrato
na argamassa do concreto
sou
vampiro bêbado de sangue
assassinei os alpharrábios
para inventar meu alphabeto
*
vamos comer mastigar chupar beber
devorar deglutir cuspir escrever xingar falar sobreviver
sobrevoar os telhados de todos os fantasmas goytacá os ancestrais invadir os palácios
de todos tupiniquins canibais mesmo que o templo esteja escuro não
me mostre o que preciso não quero perder o meu juízo nos currais de assombradado tem um
morcego nas cancelas principais vamos pichar nos muros : sem justiça
não haverá paz
para Luiz Ribeiro in memória
no lado esquerdo
do peito
o direito não
conforta
nem comporta a estrada
que preciso
nu poema
a porta
que se abre
à procura do inciso
31 janeiro
2010
era um domingo de sol rock and roll e poesia irina gozou comigo quando
beijei santa teresa no parque das ruínas com uma bela imagem de cristo tatuada
em nossas costas depois de uma noite de sonhos amanhecemos nas laranjeiras
dentro do severina o famoso botequim
mais uma vez me beijou e ali no pé do ouvido me falou bem assim: -
vamos pra saideira meu vampiro goytacá canibal tupiniquim - meu serafim –
a saideira foi itacoatiara itaipu engenho do mato dentro engenho de dentro fora quando penso que clara está vindo irina já foi embora
*
o barro de
alguns barracos continuam entranhados na carne com seus nomes tapera cacomanga cupim queimado
cambaíba ururaí olinda morro grande santa cruz quilombo lagamar guriri itapemirim
trago a
poeira na sola dos meus pés o sangue das pessoas trouxe impregnados nas
unhas vampiro goytacá canibal tupiniquim
*
no branco do papel deponho a faca a foice navalha canivete já fui moleque pivete das esquinas dos bordéis da rua do vieira paraíso perdido joazeiro coqueirinho nas mallarmargens da br já fui do breque dos pandeiros das cuícas do couro cru na carne viva goytacá boy perdido na paulista
roubei poemas do piva para vender nas
lanchonetes mar a vista em bertioga e o coisa ruim do ademir continua na ponta
da língua da memória quando criança brincava nos sonhos com cobras de pique esconde
*
no porão da casa onde aprendi a enxergar clara/luz na escuridão quando seus olhos de vidro viraram espelhos para os meus numa madrugada 27 agosto 1948 datas também me acompanham desde que vi o primeiro clarão diurno quando o trem passou para dores de macabu quando estive na bolívia senti o cheiro de corumbá ali de perto em assunção do paraguai porto viejo canavarro o barro vermelho no carnaval pelas fronteiras cerveja com caldo de piranha a dona de um bordel no pantanal chamava os jacarés com nomes de jogadores de futebol quando perdi o avião pra boa vista
*
tem noites
que a lua cheia me chega com sangue entre os dentes com aquele gosto de veneno
escorrido das serpentes tem dias que as serpentes me chegam com gosto de lua
cheia
*
a mulher dos sonhos me deixou de quatro a ver navios com pavio aceso essa palavra incendeia os poros pelos orifícios esse meu ofício de perfurar na carne o que não cabe in-verso nem por um segundo nem por um milímetro nesse acampamento logo depois da febre como marimbondo provo o teu veneno
*
quem me vê
assim
tão comportado
não sabe
o que se passa
aqui no centro
não sabe do vulcão
em erupção
nesse serTão
do mato dentro
a traição das metáforas
para juliana stefani
dandara ainda mora naquela beira de estrada com seu
vestido amarelo no rio grande do sul mesmo que não esteja ainda a vejo atravessando
a calçada saindo do carro azul abrindo o portão da casa de 7 portas douradas com
mil garrafas de vinho psicografadas na sala por algum poeta dos
pampas que escreveu por aquelas rampas o que testemunhou nos vinhedos quando
italianos chegaram nas serras dos meus segredos
origem
sou afro-tupi guarani goitacá que subiu o paraíba para o litoral
paulista nasci na cacomanga bicho do mato curupira carrapato sou campista não
tiro onda de turista sou retalhos imortais do serAfim comigo é assim : nem
fiado nem à vista
II
áfrica sim minha
mãe de sangue cresci mamando do teu leite lambendo o sal da tua carne quente bebendo
água suja no tanque sou fel pimenta azeite quem quiser que me aguente eu sou a
lama do mangue
metáforas em
linhas curvas
quando manhã
canta e não chove lucia me fala das coxas de yve mergulhadas no pontal até a
última sílaba do poema letras salgadas de mar embora mesmo que agora chova e a
noite seja um relâmpago de estrelas sinto que nos falta um vagalume para
alumiar a escuridão tantas vezes lamparina acesa no bar de neivaldo foram
lâmpadas florescentes entre olhos famintos de luz no verão de 2010
minha escrita
grita
muitas vezes
invento
palavras soltas ao vento
a flor dos meus delírios
tem cheiro de poesia relâmpagos de iansã incêndio no meio dia netuno em
polvorosa me disse em verso e prosa que ela vem com o frescor da maresia e eu
serei o seu ogum anjo da guarda e companhia hoje mesmo distante essa preamar me
incendeia ondas espumas explodem na areia tempestades trovoadas ventania e nem
sei se estando perto calmaria
estação 353
para cecília in memória
eu planto
minha estação existe
a adubagem orgânica está completa
não sou negacionista nem sou triste
sou poeta
irmão das coisas da alegria
eu sinto o gozo no tormento
atravesso noites e dias - invento
eu sei que planto
e o sistema é bruto
mas a terra gira como pomba gira
amora minha eterna namorada
e amanhã eu sei colherei teus frutos
nessa minha estação amada
*
hoje me surgiu esta ideia:
estava lendo antonio cícero
e antonio carlos secchin
e ai pensei - ler ler ler ler re-ler
não escrever - parece-me brincadeira
aprendizado para vida inteira
do mim dentro de mim
o Eu dentro do Eu
o Não dentro do Sim
metáfora 1
suspenso no ar às vezes penso se devo pensar tanto como um poema de
mayakówski ela um dia virá ao meu encontro e ressuscitará o poema que ontem não
nasceu a vida não é só flores ela me disse clarice em cada coisa tem o instante
em que ela é as vezes também penso ela não virá aí vou para praça jogar milho
aos pombos ao jardim zoológico dar comida aos patos os meus sapatos já conhecem
os anos de espera na última primavera os lírios não nasceram e as rosas eram só
espinhos com minha língua na faca cortei a fala ainda na garganta e fui pra
sala afiar o taco ela não sabe que o vinho que guardei pra ela é de uma safra especial de bacco
hipotemusa
a menina da
lanchonete hoje rói as unhas de ira pira quando quero o que ela pensa que é apenas bolero na praça
são salvador com esse poema torto que te leva ao desconforto de pensar o que
não sinto como ela vive sozinha entre pastéis e empadas sua vida é hora marcada
de entrada e de saída não conhece uma outra vida por isso me olha estranha com
uma sede faminta de comer meus olhos com
palavras – quando te digo : não minta
hipotemusa 1
a menina da
lanchonete
em frente a
floricultura
são salvador
mexe na flor
dos cabelos
dedos entre
pelos
enquanto
aguço os olhos
pensando mar
de abrolhos
na terceira
margem do rio
leio um
poema no cio
grafitado em isopor
não sendo
assim
que seja como for
hipotemusa 2
ela bagunça
meus 7 sentidos
aguça
lambuza
planta um
punhado de brócolis
no pé do meu
ouvido
me dá de
beber mastruz com leite
de comer
esphirra koreana
lhe chamo de
sacana
ela me diz
que é bacana
me fazer de
pé de moleque
pra lamber
meus sustenidos
hipotemusa 3
ela agora usa piercing no nariz
sem medo de ser feliz
joga capoeira no mercado
aprendeu dançar suing
não dá mole pra racista
nem pra patrão
que escraviza empregado
essa garota
me alucina não sabe ficar quieta com santa teresa no parque das ruínas tem mais
de mil desejos um deles é quebrar meus óculos com sua fome de beijos tem mais
de mil ofícios um deles é mapear o litoral das minhas costas pelas praias de
são francisco essa garota é bárbara afrodite artemanha de iansã me banha com
sua língua de vênus as terças-feiras de manhã
hipotemusa 5
quero botar no seu orkut um
negócio sem vergonha um poema descarado já chegando fevereiro e meu rio de janeiro
fica lindo mascarado
quero botar no seu e-mail um
negócio por inteiro eu não sou zeca baleiro pra ficar cantando a mama que ainda
tem medo do papa
meu negócio é só com a mina que me trampa quando trapa meu negócio
é só com a mina que me canta ouvindo rappa
hipotemusa 6
vou encontrá-la no rio psiu poético
sentidos todos plural um tanto cético nessa ponte para o nada - duvido que não
exista alguma esperança nos olhos de uma criança disse-me a hipotemusa no
amarelinho da lapa antes de atravessarmos para o ccjf com alguma poesia na
manga do lado esquerdo do pulso rasgar o verbo da fome e entregar a cara à tapa
hipotemusa 7
hoje acordei
com uma vontade da porra de trepar na goiabeira talvez assim quem sabe ela me
chame de jesus e tire ele da cruz
ou
quem sabe bacurau ou quem sabe bacuri para acabar com carkamanos
ou
então até quem sabe ela me chame de exu cabra da peste do nordeste koreano
hipotemusa 8
pode ser que
ela nem saiba o quanto o tanto o torto pode ser que ela me queira bem debaixo
do vestido e me chegue como sempre me rasgando a roupa me lambendo a boca sem
vergonha alguma e me pegue bem assim descabelado displicente distraído pra
querer mais uma poesia pra entortar 7 sentidos
ela me deu um beijo na boca e me disse carne seca me interessa assada na
brasa como sua língua quente salivando entre meus dentes enquanto conto
peixinhos na baia da guanabara na hora do gozo pode cuspir na minha cara essa
gosma de lesma na calçada pedra faca trinca ferro na janela casa mal assombrada
cosme velho coisinha de sal e o bruxo ainda escreve dentro dela
hipotemusa
10
quando alvoroçar os teus cabelos
quero outras coisas alvoroçadas
poros pelos entradas
maria padilha
pomba gira cigana
presente na trilha
de qualquer oxossi caçador
beatriz sua filha de santo
foi quem vi no espelho
da minha mesa de búzios
quando joguei para xangô
hipotemusa
11
fulinaimânica sagarânica
fulinaímica sagarínica
algumas vezes muito prosa
tantas vezes muito cínica
hipotemusa 12
foi em são carlos a última vez que fui encontrei alzira pira da pira de
piracicaba incendiou minha carne devorou meu esqueleto o lance só acaba quando
mergulhamos em são josé do rio preto era uma japinha que conheci em batatais depois
da prova dos 9 deu adeus e nunca mais
hipotemusa
13
como ninfa estrangeira ontem me veio envolta de plumas em estado de
poesia na baia da guanabara estudava antropologia pelas marinas do rio no sexo
sempre quentinha feito uma gata selvagem gozando a vida no cio vestida em pele
de algas despida nos desvarios lambeu o mel entre as coxas desapareceu no navio
hipotemusa
14
nem bem
havia anoitecido no parque das ruínas teus olhos de lamparina tocaram a pedra
do reino nas águas da guanabara coisa rara aquele peixe brilhante dentro
daquela boca com seios de primavera e vinhos da santa ceia em tua língua muito
louca
jura secreta 101
todo dia que não amanhece
anoitece
quem nunca leu sagaranagens
não pode dizer que me conhece
*
hoje na michigan vi o cara de bunda pra lua tirando cocô de cachorro na calçada torta tonto na califórnia cachorros moram em apartamentos bem diferente lá no engenho de dentro os cães uivam na ferrovia não são lobos mas parecia o outro cara dando marretadas na laje na esquina da santo amaro estação corpo belo universo paralelo vida louca vida Irina sorria enquanto beijava o sorvete trepada na padaria na outra esquina do dia rúbia querubim quase entuba enquanto volto pra munduba setenta e um guiado por federika a flor delírio de oxum
anjo torto
quando nasci torquato neto
veio ler a minha mão
tinha chegado de teresina
com uma garrafa de cajuína
e um livro na outra mão
e eis o que o anjo me disse
apertando a minha mão
com um poema entre os dentes
:
vá bicho!
não tenha medo do inferno
seja um poeta moderno
cheire as flores do mal
que a poesia de Baudelaire
vai te salvar no final
*
minha irina toda via
é travessa e
atravessada
em
transversas travessias
trepa sempre
nas esquinas
contra o
poder da tirania
*
no princípio era fábula depois veio o verbo logo depois a ficção e aí começou a invenção bem depois das sagaranagens antes fulinaimargens depois das fulinaimânicas atrás das fulinaímicas nem circo nem tarde de mímica apenas alguma paisagem na janela da viagem quando lia o lado b me transmutando em alquimia
*
a selva de concreto fala pelos seus poros ela veio de outra mata virgem agora devorada pelos dentes da cidade irina evapora não chora mamãe não chora a vida é assim mesmo inda não fui embora
onde tudo
é carnaval
minha madrinha se chamava cecília nunca soube onde minha mãe a conheceu por muitos anos morou na rua sacramento ao lado do colégio estadual nilo peçanha primeiro endereço que conheci nesta cidade antes de estudar no grupo escolar xv de novembro de onde muitas vezes assisti desfilar a mocidade louca ao lado do meu padrinho benedito que inventou deixa que eu chuto meu guardião absoluto
*
entre muros e paredes do presídio federal de brazilírica macabea foi jantada pelo pastor de andrade no carnaval da mocidade tem memórias por lá adormecidas que ninguém ousa contar a hipocrisia varreu daquele território a rebeldia marca registrada de um tempo que não podemos apagar trago nas nervuras entre a carne e os ossos marcas de explosões da caldeira na tipografia das letras onde tentaram me domesticar
mas sou vampiro goytacá
endiabrado serAfim
sou
canibal tupiniquim
meus 7
sentidos
fulinaíma me veio no vento um
instrumento invento para acrescentar a minha escrita para escancarar a minha
fala percorria a bandeirantes quando me dirigia para campinas com
oficina de artifícios e não sei em que ofício a pedra do rock rola a pedra do
vento voa depois de um instante qualquer que seja o estalo nos meus 7 sentidos
já perdi a conta do tanto faz então pra mim tanto fez o faz de contas que me
quiseram impor sem ao menos saber se quero o tempo ajusto as pedras que rolam
meu calcanhar é testemunha em toda veracidade verdade deve ser dita em qualquer
tralha da cidade porque bem sei por quantas trilhas já trilhei para chegar até
aqui
*
afora em mim grafitemas nenhuma figuralidade frutas legumes verduras quem cala a fala consente houve um tempo que a dita/dura calou a fala da gente grafito em tua carne de pedra medusa de sete patas poema de sete cabeças miragens do amor que enlouqueça apóstolos na santa ceia miró brincando de circo com os olhos na lua cheia
jura secreta 102
a carne que me cobre é fraca
a língua que me fala é faca
o olho que me olha vaca
alfa me querendo beta
juro que não sou poeta
a ninfa que me ímã quando arquiteta
o salto da abelha quando mel em flor
pulsa pulsa pulsa pulsa
na matéria negra cor
quando a pele que te veste é nada
éter pluma seda pelo
quando custa estar em arcozelo
desatar a lã dos fios do novelo
no sol de amsterdã desvendar hollandas
e os mistérios da palavra por entre o nó dos cotovelos
meus dedos esticados
como cordas de pianos
roçam teus olhos azuis
eu tenho planos
de te tocar com blues
quem diria
filho de lavrador
e mãe analfabeta
um dia no brasil
ainda
existe uma mulher
que me lança chamas
que me distorce o crâneo
me disseca e me atraca
quando chego ao cais
com
esse barco em movimento
essa carcaça de lâminas e ossos
uma mulher que me estica o plumo
e
me satisfaz
me
enrola em desenredos
e me deixa arame farpado
a ponto de me sangrar os dedos
vampiro lobisomem
tenho
frequentado os telhados junto aos fantasmas da planície visitando os territórios
lamacentos da cidade em cambaíba por exemplo espreito os fornos crematórios de
um passado inda recente voltei aos braços dos desamparados indigentes da contra
mão os que foram trucidados por gritarem contra ditadura e escravidão
*
do som dessa palavra
nasce uma outra palavra
fulinaimicamente
no improviso do repente
do som dessa palavra
nasce uma outra palavra
fulinaimicamente
*
muitas vezes
descrevo minha musa
num poema menos lírico
mais intenso
mais irônico menos penso
muitas vezes
quero estar em alfa
mas estando em beta
a massa do abstrato
na argamassa do concreto
minha musa é linha curva
não poema em linha reta
teatro do absurdo
no próximo dia seis vou me despir de vez rasgar os p(l)anos no próximo dia
seis no parque desengano plantar amoras pedra
bonita – metáforas para os olhos de quem
não vê isa bela acha bonito tudo aquilo que não falo no próximo dia seis desmontar o circo no universo paralelo
montar pirandello beckett ionesco artaud fernando
arrabal no próximo dia seis vou me despir pro carnaval
resumo
ela tinha as mãos tão suaves que tocavam-se como quem tem a
pele sob a chuva de setembro eu procurava colher maçãs no horto de santa maria
madalena olhava a montanha e lembrava-me de selvagem que fui aos olhos dela
enquanto ainda vivia na tapera o meu cavalo deixava na porta da cidade escrevi
sobre isso no poema quando o tempo rasgou meu corpo na calçada e trouxe-me
folhas de papel em branco.
Itabapoana Pedra Que Voa
dia desses sonhei com
alquimia
ciência da transformação
na prova dos nove é alegria
o coração da pedra vira pássaro
e voa para outra dimensão
serAfim 2
- rúbia querubim a desejada
de federico baudelaire
entre os dentes
trago uma língua afiada
carnavalha
para tudo que me valha
irina agora também é modelo dessas pinturas clássicas que a
gente não sabe qual foi o pincel
usado pelo pintor
*
a
travessia vou fazendo
no
inverso
entre
os lábios da tua boca
e
as letras do teu inverso
além de tudo meu olho foca
meu olho toca meu olho vê
tudo aquilo que você não lê
*
quieta aqui nessa solidão capixaba quantas
vezes me vem em sonhos ou alucinações contemporâneas tudo o que não fui eu não
era a bruna beber muito menos débora seco mas ele gostava até queria que fosse
assim como biúte me chamava de vários nomes ao mesmo tempo aquela profusão de
palavras como inseto em volta da lâmpada e os cálices nos lençóis de algodão as
vezes linho para atiçar nossa luxúria com a contribuição da enel que nos
deixava quase sempre no escuro na guarapari do espírito santo uma noite ele
passou o tempo todo lendo pagu no meu ouvido e macabea não se conforma por ter
sido deixada de lado nas artes cínicas do presídio federal de brazilírica
trafega com seus fantasmas pelos corredores falando para o vento que entra
pelos buracos das
fechaduras
*
nasci no dia nacional do samba talvez por isso aos 15 entrei para mocidade independente de padre olivácio – a escola de samba oculta no inconsciente coletivo instituição criada pelo intrépido artur gomes uma filial da igreja universal do reino de zeus pastor de andrade o antropófago não anda muito satisfeito com meu comportamento a frente da bateria da escola mas como sou capixaba e não amo capixaba e a única coisa de capixaba que gosto é a torta e o quibe de peixe amor com capixaba não faço já disse isso milhão de vezes mas faço amor não faço guerra e quem quiser que me queira por essa terra inteira
quieta aqui nessa solidão capixaba quantas
vezes me vem em sonhos ou alucinações contemporâneas tudo o que não fui eu não
era a bruna beber muito menos débora seco mas ele gostava até queria que fosse
assim como biúte me chamava de vários nomes ao mesmo tempo aquela profusão de
palavras como inseto em volta da lâmpada e os cálices nos lençóis de algodão as
vezes linho para atiçar nossa luxúria com a contribuição da enel que nos
deixava quase sempre no escuro na guarapari do espírito santo uma noite ele
passou o tempo todo lendo pagu no meu ouvido e macabea não se conforma por ter
sido deixada de lado nas artes cínicas do presídio federal de brazilírica
trafega com seus fantasmas pelos corredores falando para o vento que entra
pelos buracos das
fechaduras
*
não conheço
mas é como
se conhecesse
disse-me ontem
a psicóloga
antes que
amanhecesse
depois de uma noite
de trégua
depois de passar a régua
na direção dos caminhos
os olhos da janela
me espreitam
enquanto devoro
este poema
salgado
de sol
sede
eu tenho sede de água
eu tenho sede de mar
girassol nos meus cabelos
espuma de sal esperma e pelos
por onde eu possa delirar
eu tenho sede de sexo
em noites claras de luar
*
se eu não beber teus olhos
não serei eu nem mais ninguém
quando beijar teus lábios
desço garganta mais além
quando tocar teu íntimo
onde o desejo é mais intenso
jura secreta não penso
bebo em teus seios também
*
a flor da tua pele
me provoca
me toca
e não sei o que fazer
me perco nas esquinas
do teu corpo
em noites de lua nova
como uma prova de física
que eu nunca soube resolver
espírito santo
guarapari aqui estou
aqui me encontro
em estado de espírito santo
nesse mar azul e branco
como as cores da portela
o rio já passou em minha vida
nas marés de um serAfim
mar é o que me fica
como
o deus que me habita
sem princípio meio ou fim
*
musa que é musa
não tem vergonha de nada
escancara a cara no espelho
se desnuda pra fotografia
teu corpo camisa de vênus
a flor da pele irradia
rasgando a camisa de força
tua carne só poesia
mulher de nuvens
para micaela albertini
fosse eu uma mulher de nuvens
não estaria aqui presa
a este mar nas marés suor ou cio
passaria com o vento
sem deixar rastros vestígios
pegadas
voaria sobre estradas
sem destino cais ou porto
viajar mesmo sem nenhum conforto
ou calmaria nas partidas
ventania nas chegadas
*
metáfora por
metáfora
se ele pensa também penso mas não compenso carência de ninguém e vou além do outro lado do carne tudo o que está dentro ou fora do corpo o que vai e vem na hora do sexo se não me agrada meto a faca corto metáfora por metáfora o músculo/pênis
que nunca me deflora
serAfim 3 - federico
baudelaire o mestre sala dos mares
meu abraço pra brasilha a minha
ilha de creta a catedral dos desamores
essa estranha cidade secreta onde o
fascismo e seus louvores um belo dia se instalou vai ser preciso muito amor vai
ser preciso muito sexo vai ser preciso muita luta chutar o balde convidar as
putas para cantar em alvoradas muitas vezes no congresso muitas vezes na papuda
quem sabe um dia a coisa muda quem sabe um dia essa pátria se desnuda e se
solte então dessa corrente com as mãos jorrando
outras sementes no carnaval de salvador
irina serafina
nem minha
nem tua
toda dela semi-nua
escrevo
como quem
pesca uma piaba
no rio ururai
vou por aí
de itabirina
a iriri
se não cansar
cato conchinhas
de anchieta
a quipari
*
você ainda não conhece tudo que um dia bem-te-vi no pontal de atafona no portal do imalaia ou na lagoa grussaí
você está se aproveitando da
nossa situação e está de olho na minha mulher não vai colar porque gigi
federika lady rúbia eugênia agora é minha quem mora com ela em iriri do
espírito santo sou eu pode tirar seu cavalinho da chuva seu tempo de guarapari
passou se não é capixaba que se dane quero mais que o quiabo voz carregue
porque sua banda de reggae aqui não toca aqui não é freguesia do ó e você nem
conhece quibe de peixe pra ficar jogando isca no meu quintal de areia sua
sereia já morreu faz tempo o templo agora é outro pastor de andrade me deu a
chave de entrada da cancela principal gado aqui não entra e o bom cabrito vai
berrar do lado de fora dos telhados assombradado ficou ali na outra esquina no
casarão dos fariseus essas coxas de meninas quem vai lamber sou eu
*
só quem sabe do riscado
entende o seu ofício
procura palavra nua toda viva toda crua
o resto que se foda
quero toda palavra toda
toda bruta toda puta
na artimanha do concreto
no abstrato do ereto
para rúbia querubim
a pétala da flor deságua sobre a flor da tua
pele nas águas salgadas desse mar nas correntezas desse rio eu bebo tudo que
revele cada gota dessa água na leveza do teu cio sob os lençóis da tua cama
acenderei os teus pavios
alfândega
em santa cruz de la sierra
o poema e o anjo torto
se beijam num copo de vodka
com pimenta boliviana
e traçam mayara cigana
que me deixou no desconforto
A
travessia
no inverso do meu tempo sem
lenço sem documento janelas
abertas ao vento
o poema freudelérico
não tem nada de pessoa
na vitrola rola um demônios da garoa
e o poema mete a língua
no avesso da linguagem
rasga
os tecidos da mortalha
assombrado
com o verbo desemprego
afia
ainda mais a carnavalha
com
sua faca de dois gumes
no descompasso do desassossego
bolivariando 2
eu sempre andei no encalço dos olhos de carolina na fantasia dos meus passos
tem confete/serpentina onde o profano e o sagrado em puerto viejo cavajarro se encontram em outro tom a
cigana boliviana com seus olhos de pimenta com suas pimentas nos olho me levou para lá sierra de santa cruz da bolívia onde se masca folhas de coca antes do coito das cinco sem chá e nem torrada e
cerveja muito menos o sexo ali é na porrada(verdade
não invento) com fogos de artifícios botando fogo em no carnaval no serTão do mato dentro
poética 43
a percepção acho que é um dom uma descoberta um pássaro que pousa em nossa cabeça e nos atira aos fios elétricos do corpo liberdade vem de dentro do motor dos músculos os ponteiros que só se movem quando querem o repouso absoluto é uma forma de silêncio não vejo muita graça em ser sozinho solidão as vezes faz bem noutras assusta mas se tenho um amor que ainda não me diz abertamente do diamante que mora dentro dele toco - a música dela tem itálias e palavrões as vezes quando me pergunto onde vou nem sempre tenho respostas aliás respostas é o que menos tenho encontrado para as 25 mil perguntas paradas no ar o rascunho dos meus primeiros dias ficou esquecido numa tipografia do tempo emoldurado na tinta que mudou de cor
poéttica
imburi – essa palavra estranha
só existe em são francisco
e me arrisco
a pensar que seja engano
o biscoito de polvilho
farinha branca no trilho
morreu mais um – menos nada
a tapioca na telha
e o sol sumiu na estrada
pedra dourada
amo a pedra
onde ela mora
estive lá
já vim embora
assim sozinho
mas é como se essa pedra
estivesse ainda em meu caminho
pérola dourada
houve
um tempo numa primavera passada conheci pérola dourada numa pedra onde o tempo agora é saudade por
toda pele grafia na minha íris/retina trouxe a pérola dourada na menina dos meus olhos olhando os olhos da menina em cada pedra que havia
*
no hotel amazonas - galvez o imperador do acre hospedou-se
em sua passagem por campos dos
goytacazes em direção a vitória do espírito santo e deixou por aqui o vampiro
goytacá que mora neste hotel até hoje e passa as madrugadas na janela do quarto
olhando o pátio interno tentando reencontrar o seu amor nina aroeira vestida de
benta pereira nos cavalos do imperador muitas vezes vi lágrimas descendo dos
seus olhos e as mãos apontadas para o telhado do outro lado do corredor
enquanto rezava para santo antônio se
espantou com alguns passos nos corredores da linda flor florlisbella
dos passos que não conquistou
princesa morta
I
dorme a princesa encantada
no portal dos desenredos
na bruma das madrugadas
evoé - Eros meus dedos
tocando o vinho na língua
da saliva em tua boca
ó princesa adormecida
que vens na pele da pedra
quantos anos quantas Eras
tivemos nesse abandono
por estações de primaveras
sem chegadas só partidas
nas luas de tanta espera
nas marés das despedidas
na carne o sal das promessas
silêncio o som das feridas
II
ó
princesa adormecida
enquanto guardas na flor da carne
dos teus lábios indefesos
sorrisos palavras mágicas
ou só meus poemas presos
o que imanta teus olhos
que ímã me tens me tesa
me armas com tuas entradas
de tantas delicadezas
elétrico me põe na fala
faíscas de um tempo aceso
no mito a chave da porta
a corda que o plumo estica
no mito a princesa morta
no
poema onde vivafica
pedra
brava
a vida aqui no recife é
pedra brava federika não dá mole só quer me ver duro não compartilha a grana
diz que não paga cerveja pra amante tremenda sagaranagem além de amante sou o
seu acessor nas artemanhas pelas areias da boa viagem pedra por pedra estou
pensando voltar pra itabira pra iriri nem pensar o espírito santo mora longe não passa por aqui federika está pior
que lampião pensei que vindo para pernambuco fosse amolecer o coração qual nada
virou
pedra e nem marreta quebra
o último
goytacá
quando te tocar
é para alvoroçar os teus cabelos
eriçar teus pelos
molhar os teus mamilos de saliva
com essa língua viva
aqui na minha boca
o último goytacá
coisa muito louca
feiticeiro – resistente
mastiga os mamilos da musa
armado de poesia até os dentes
serAfim 4 - gigi mocidade rainha da bateria
um dia desses
quero ser sérgio sampaio
porque hoje tô de bode
na cabeça um para raio
tô comigo ninguém pode
soltando bichos no porão
tô faísca tô kabrunco
tô um relâmpago lamparão
a vida não basta
se me bastasse seria outra
clarice quem sabe
beatriz que fosse
fruta que gosto de comer
antropofagia canibal
pronta para o bacanal
filha que sou deste país
de fevereiro
onde todo ano é carnaval
e a vida do meu pai
se foi em sangue
uma bala no estômago
e uma manchete de jornal
por mais paradoxal
que possa parecer
bailarina
não é um ser normal
como qualquer um outro ser
nesta noite quieta
entre lençóis e travesseiros
eu aqui inquieta no meu canto
ouço bob dylan
bebendo esse conhac
com tua língua
em minha boca
pelas noites lá do sul
meu brinquedo verde/azul
trago de volta os vinhedos
tua pele entre meus dedos
o poema e em guardanapo
até hoje está guardado
na moldura em teu retrato
voragem
para ferreira gullar - in memória
não sou casta
e sei o quanto custa
me jogar as quantas
quando vejo tantas
que não tem coragem
presa a covardia
eu sou voragem
dentro da noite veloz
e na vertigem do dia
*
acho que meus queridos estão todos pirados esses últimos anos de pandemia deve ter afetado as ondas elétricas dos múltiplos cerebelos os fios dos cabelos enferrujados de sal e maresia lá nos anos 90 uilcon serafim me alertava sobre essa onda magnética que se espalharia pelo planeta nos currais nos palácios nas bodegas ademar cardoso também em jardel ricardo pereira lima márcio coelho gabriel de lapuente antes até dos 80 no by brazil do black river de registro a batatais enquanto dalila do abc continua pilotando os alpharrábios zhôo muito zen pensava que tudo seria nuvem passageira enquanto césar conversando com raul já me dizia que a lucidez mora ali do outro lado esquerdo de assombradado enquanto rubens jardim só quer saber das mulheres com poesia cada uma em seu quadrado
*
geleia é um personagem misterioso meio dionisíaco que vivia nos porões do studio 52 lá pelos idos de 1987 nem sei quando onde como nasceu vivia aprontando com o seu projeto de psicanálise popular com um divã em cada esquina na primeira festa das bacantes nos altos da catedral quando pensávamos ser eunuco devorou a santíssima trindade dela hoje só resta rúbia querubim e um sacrossanto serafim que despachou federika para os corais do recife nas marés de pernambuco
*
vez em
quando geleia passeia pela igreja universal do reino de zeus para tirar um
sarro com seu pastor de andrade na missa pagã do sétimo dia coloca os dedos e
a hóstia na língua das ovelhinhas para a
encenação do ciúme nos olhos da sacristia em tudo que é sagrado pra ele não tem segredo os cinismos da hipocrisia em suas juras secretas decreta estado de sítio
em estado de poesia
com o amor trincando os dentes
parece até que eu não sabia
que ela fugiria da raia
golpe com rabo de arraia
deixa qualquer uma tonta
ela não estava pronta
se encontrava semi nua
sem coragem de despir o resto
sem coragem de encarar a cama
amarrou-se nas correntes
sem coragem de escancarar a porta
fechou-se então nas janelas
com o amor trincando os dentes
anti/lírica
um poema bashô aqui
nas 7 paredes do corpo
nos 4 cantos da casa
instigante satírico sarcástico
e ao mesmo tempo
esse ácido lirismo
é como um anjo
de belas brancas asas
que me toma arrasta domina arrasa
poética 86
teu silêncio
pedra na garganta
saliva seca
nessa língua faca
por quê não canta
a dor de cotovelo?
derruba essa parede
que te cerca
desamarra essa corda
que te enforca
rasga essa mortalha
que te mata
*
penso em vão não
escrever certa vez comecei um poema com vírgula as curvas dos seios no branco
do papel o caminho entre tecidos sob a pele para o túnel onde não passam
automóveis a vírgula não é ponto apenas um sinal no início do poema que não
precisa ter ponto final apenas curvas em direção a outras curvas para encontrar
as outras vírgulas no início do poema
*
diante do espelho
sou
e sempre serei outra
agora o que não sou
fica do outro lado de fora
a lâmina acesa, a brasa
o sal do suor do cio
o mar entre minhas coxas
e mangue entre minhas pernas
os caranguejos que me invadem
sempre que me olham
*
hoje vou comer coxinhas na santa ceia paulistana vou comer fiado vou comer de graça coxinha só se paga a prazo a perder de vista na pia no banheiro no telhado na cozinha coxinha se come aos montes nas ruas nas praças nos palácios nas garagens coxinha é massa de manobra amassada com trigo com farinha carne que se presta pra usar comer e jogar na lata de lixo
coxinha não é gente
coxinha é pior que bicho
linguagem
abraço este poema
como se beijasse meu poeta
com suas linhas tortas
em meu corpo tatuado
teu nome e sobrenome
como um gozo ardente
tua língua ativa
me lambendo quente
e todo líquido escorrendo
por entre o vão dos dentes
toda nudez não será
castigada
estou nua em pelo
disfarçando o pesadelo
para olhar do alto
o palácio do assalto
e seus metralhas
minha língua é faca
não é palha
é palavra pronta
pra cortar a carne
como fio de navalha
onde houver canalha
toco fogo dentro
pecadora confesso
estando toda no cio
no corpo querendo tudo
minha mãe que me descreve
já me conhece do parto
eu sou vadia e não te iludo
eu tenho as veia abertas
um furacão entre as coxas
um vulcão no ventre/útero
mas só um homem me come
desde a minha tenra idade
nas ostras cravei meu nome
eu sou gigi mocidade
*
fico nua para o vento
relâmpagos trovões
tempestades temporais
e ventania
não tenho em mim calmaria
trago vulcões em pensamento
a tentação sou eu
deito pra lua
só ela p(h)ode como eu quero
penetrar-me com sua luz de fogo
me deleitar com seu leite
eu quero a lua cheia
que me entre o mar das cochas
e me engravide com seu manto
e que não fique algum quebranto
o mal olhado o olho gordo
que me lave com seu líquido
e me leve até são jorge
montado em seu cavalo branco
o rei está Nu
e a rainha
também
o palácio dava para
os fundos
do submundo
onde morava
a loucura tântrica
em suas garras semânticas
como física quântica
ela gozava solitária
no anoitecer de todo dia
serAfim 5 - federika lispector a ponta da lança
desconcerto
o poeta é um jogador
joga com palavras
letra por letra
sílaba por sílaba
com nomes sobrenomes
universo das coisas
artifício das cores
tira um sarro com metáforas
desconcerta a lírica
a métrica a fonética
e os significados
onde não tem sentido
enfeitiça o sub-mundo
enaltece o desdentado
espelho
flechas que sangraram oxóssi
em meu peito quebro
espelho do outro lado
da rua mato a fera
ogum me deu a lança
tua fúria não me alcança
não ando só yansã
me leva em sua ventania
trovão estampido coice elétrico
tenho o reflexo do fluxo
do sangue que me embala
bala na veia tiro de letra
*
não tenho trava não tenho treta
branca ou preta eu traço o tempo
ao sabor do vento que vem
ao sabor do vento que vai
onda do mar eu tenho o sal
e quero sol a solidão não pega
de surpresa nunca fui presa
fácil pra tua armadilha
eu tenho a trilha que os teus pés
jamais irão pisar
*
não tenho certeza que isto é um país ando por recife entre pedras como quem vomita um planalto dentro do palácio grafito a porra no muro tenho vontade de explodir este barril de pólvora esta é a palavra que não basta eu trovoada relâmpago ventania temporal elevada a múltipla potencialidade dessa miséria quântica
nessa imoral brasilidade
o dia que eu
estiver vestida
não me toque
deixe que eu troque
o sentido para o truque
na armadura de ogum
a trama pro desejo
que não dou a qualquer um
desassossego
o meu amor não tem sossego
morde lambe chupa come
teu corpo que ainda não conheço
tua carne - nem se quer tem endereço
o meu amor não tem apego
agarra larga prende solta
atira ampara - é cachoeira
escorre como trovoada
iansã em tempestade
o meu amor é livre e limpo
quando a alma está lavada
desejo sexo amor
paixão
fantasia
aos olhos de wermmer
tudo é possível crer
até em quem não cria
diante do espelho fico zen
chamo zeca baleiro de meu bem
canto a mama canto o papa
canto o negão do rappa
canto até quem não conheço
e não preciso de endereço
pra mandar cartão postal
canto a mina da esquina
que se chama lys cabral
*
lys não a de fando nem do bando do rancho da carmélia passeava certa noite em itapoã de bunda pra lua ouviu o canto da sereia se despiu de toda amélia foi me procurar na federal na ciranda do boi cósmico não ouviu seu pai de santo queria me dar por todo canto até mesmo na plateia mas voltou pro morro de são paulo para espanto da geleia
translúcida
levanta natureza morta você não é cubism0 de picasso nem surrealismo de dali diante os cabelos de aço de frida calo muitas vezes vejo muitas coisas ao mesmo tempo na fotografia dou um corte no pensamento para que o vento me traga o norte levanta pássaro sem sorte o passo em falso o cadafalso predestinada a sina
em sua morte
subversiva
1 - 15 – outubro - 2022
eu não sou santa nem casta a vida é bruta
e não me basta vou a luta uma
quadrilha de
filhos da puta tomou o congresso de assalto o lugar deles é a lata de lixo de
onde nunca deveriam ter saído vamos
enxotar essa putada varrer do mapa esses
canalhas nem que seja a golpe de gilete
a fios de navalhas se é esse o jeito ou única saída subverter a ordem o voto acelerar o ritmo da libertação a arte é arma e
não temos tempo de temer a morte arte é intervenção da massa armemos o povo para
o povo entender e aprender a ocupar
- democracia é palavra gasta - ferreia gullar
já nos dizia “a arte
existe porque a vida não basta” -
se a massa está inerte renascer oswald para fermentá-la vamos fomentá-la com
fermento dos biscoitos finos antes do
anoitecer - “quem sabe faz a hora não espera acontecer” - vamos a hora é essa eu tenho pressa não temos tempo
pra espera o trem das onze está partindo
e quem perder já era
a cara à tapa
tenho minha arma na língua
não nas coxas
veneno na saliva
só a cara é de anjo
o sal da ilha de creta
a pedra da boa viagem
tenho na bagagem
faca estilete canivete
afiada malandragem canavalha
de moleque para raspar pentelhos
rasgar bandeiras dessas cara/velas
da milenar tropicanalha
mitológica
fosse afrodite ou fosse vênus
mariana fosse quanto
a flor sagrada de lótus
secreto o espírito santo
os girassóis entre os cabelos
nos lábios lírios do campo
carnívora
o amor é feito de corpos
o amor é feito de membros
o amor é feito de meses
janeiro fevereiro março
todos os dias acordo e me lembro
o amor é feito de abril
maio junho julho
o amor é feito de agosto
setembro outubro novembro
o amor é feito dezembro
o amor é feito de anos
o amor é feito de agora
horas minutos segundos
é razão de estar no mundo
o amor se faz toda hora
serAfim 6 - artur kabrunco garrutio lamparão
Federika
Bezerra: A Porta/Bandeira que Bortou Olivácio Doido
Samba/Enredo do Grêmio Recreativo e Escola de Samba Mocidade Independente de
Padre Olivácio – A Escola de Samba Oculta no Inconsciente Coletivo no carnaval de 1993 - em 1995 integrou o
repertório do projeto Retalhos Imortais do SerAfim - Oswald de Andrade Nada
Sabia de Mim - Realizado pelo SESC-SP
Em
mil novecentos e vinte e cinco
na noite de orgias satanazes
um raio de trovão incandescente
rachou a Igreja em Goytacazes
um vulto do despacho então desceu
movido por farol de grande luz
tocou na pedra quebrou cruz
a Rainha do Fogo dessa gente
Federika
de ouro azul e prata
na porta da igreja foi parida
criada pelo Padre Olivácio
que logo depois lançou na vida
aos cindo de idade encantada
foi pega masturbando em sacristia
por causa de um sonho com o príncipe
DuBoi da mais sagrada putaria
Expulsa
da cidade foi pra longe
cresceu entre os jardins de JardiNÓpolis
mas se você pergunta Freud Explica:
- o seu palácio agora é em Petrópolis
Aos
dezenove plena de alegria
conheceu Gigi da Bateria
na porta do Beco de Satã
na festa federal do Bar da Lama
a Deusa dos Lençóis de toda cama
sorrindo para ver como é que fica
dá um corte na história
inverte o drama
e transforma Ouro Preto em Vila Rica
e assim vamos cantar em verso e prosa
a saga dessa Deusa Iansã
que em busca da mordida na maçã
sonhava encontrar Guimarães Rosa
Viemos
do SerTão para os seus braços
porque a Mocidade Independente
é a mais fina e pura Flor do Lácio
afilhada do secular Padre Miguel
e fiel ao seu pai Padre Olivácio
e para completar a grande roda
trazemos o cacique Pau Brasil
o centenário Oswald de Andrade
filho da paulicéia que pariu!
Passando pelas bandas do Catete
dançando na maior intensidade
macumba com o índio brasileiro
nossa Ex-Cola campeã da liberdade
Federika engravidou o grafiteiro
do famoso cacete Samaral
que escrevia pelos muros da cidade:
Mocidade já ganhou o Carnaval!
e assim vamos cantar na grande roda
tudo o que deu e o que não deu
o dia que um pastor bem collorido
pensou ser pai de santo e se fudeu
operação de risco
aqui assumo o kabrunco como sobrenome de um desses
12 apóstolos de zeus nessa profana e canibalesca santa ceia para
provocar os lobisomens assombrados espalhados pelos telhados dos laranjais de
são francisco
*
não sou de morder comer chupar calado como mordo chupo e canto com meu coração de galinha depois que boto o ovo e o sangue escorre pelo ânus depois da dentada do vampiro por mais que me chame espanto sou muito mais que isso lingüiça de chouriço sangue de porco na tripa cachorro louco cão danado nascer em agosto não me é desgosto pelo contrário me ins-pira por quê me chamas fulinaíma? fumaça escorre pelos orifícios de esqueletos refratários caramujos passeiam paredes emporcalhadas de vinhoto unhas navalhas sangram carnes dos deuses desencarnados os vermes ainda mordem nas camas dos palácios urubus pantanais pastos de minotauros no planeta não sei onde ó minha nossa senhora das tempestades quando me livrar desse pesadelo?
arte manha
depois de ler o mapa da tribo como um tigre incendiado me visto agora com a flor da pele de salgado maranhão nem sei se wally sabia dessa arte manha Salomão não posso dizer o que o poema espreita
nestas tardes de brazilha o sol o céu em
quantas bocas tudo que é meu está
guardado em tudo o que eu criei e o que ainda está pra ser criado e depois do que for re inventado na cor da pele um serAfim
res-guardarei como uma onça em
pantanal quem sabe até flor do cerrado mandacaru brotando em mim
*
talvez não tenha lógica o que
escrevo minha escrita grita do inconsciente coletivo vivo re-par-ti-do em três
em quatro em cinco em seis em sete quem não conhece não se mete
em tudo aquilo que
excita
*
salve meus erês meus eguns meus xangôs e meus exus salve meus
oguns meus oxossis omulus salve iemanjás oxuns e iansãs todas as manhãs que
ainda ardem minhas mordidas nas maçãs das coxas de nanãs
*
irreverência ou morte disse gigi mocidade pra federico baudelaire homem com flor na boca mestre/sala dos mares mocidade independente de padre olivácio escola de samba oculta no inconsciente coletivo não fujo do perigo no asfalto o beijo sujo é preciso estar atento e forte não temos tempo de temer a morte disse-me caetano na canção tropicalista o genocida anda solto não podemos nos perder de vista
*
tenho andado vermelho de sangue caranguejos explodem no mangue boca da barra guaxindiba gargaú balas pipocas nos becos na corda bamba do hemisfério sul tenho andado nas tralhas das trilhas vendo fantasmas nos telhados e o caroço desse angu nas entrelinhas dos tratados com cascavel surucucu quem foi que disse que essa terra é santa ? quem foi que disse que isso aqui é ilha? só pode ser filha da outra a que pariu o boi zebu
linguagem
o que vai
de um lado da ponte
a outra
é o que sai da boca
o que entra é a língua
a que entorta
beija sem pedir licença
chupa morde goza
na entrada e na saída
sem ter adeus na despedida
a traição das metáforas
durante a viagem olhava a paisagem através da
janela árvores montanhas casas abandonadas gado bovino ferro velho onde foi que
não estive neste país mal assombrado tenho a leve sensação que o outono nunca
vai chegar o patriarca nem vem vindo e um morcego continua na porta principal
na entrada da cidade minha avó xingava quando fugia do curral e minha mãe nunca
mais me esperou desde o dia em que me fui embora e o 02 não é apenas um
traficante de joias no lado b da nossa história
*
a paisagem vista durante a viagem na janela mexeu com as
minhas unhas sujas de lorca nem era nova granada de espanha nem canção de
milton nascimento ouvia caetano cantando -
"o haiti é aqui'
- com sua língua pontiaguda e pensava o
dia que o genocida vai me olhar com seus olhos ensandecidos detrás das grades
na papuda
poema atávico
e se a gente se amasse uma vez só
a tarde ainda arde primavera tanta nesse outubro quanto de manhãs tão cinzas nesse
momento em bento gonçalves mauri menegotto termina de lapidar mais uma pedra tem
seus olhos no brilho da escultura confesso tenho andado meio triste na
geografia da distância esse poema atávico tem a cor da tua pele a carne sob os
lençóis onde meus dedos ainda não nasceram algum deus anda me pregando peças num
lance de dados mallarmaicos comovido ainda te procuro em palavras aramaicas e a
pele dos meus olhos anda perdida em teu vestido
para gigi mocidade
procuro uma menina
que seja assim quase criança
que seja assim quase mulher
procuro uma menina
que saiba bem a diferença
entre o mal e o bem-me-quer
que saiba bem a flor que cheira
pra desfolhar o mal-me-quer
sabendo tudo brincadeira
saiba beijar o que ela quer
saiba que o beijo é um desejo
que nasce da flor quando mulher
saiba que o desejo quando beijo
não é por amor qualquer
*
miles davis fisgou na agulha
oscar no foco de palavra
cobra de vidro sangue na fagulha
carne de peixe maracangalha
que mar eu bebo na telha
que a minha língua não tralha?
eros
tua blusa de seda
entre meus dentes
o nó se desfez depois do vinho
sob as folhas dos parreirais
vale - os vinhedos
quantas vezes eros
eletrizou os nossos dedos?
escridura
esse poema absurdo
direto no ouvido do surdo
escridura nos olhos dela
ela bem sabe o que desejo
ela bem sabe o que espero
tem canivete no sangue
tem um alfinete entre dentes
a faca que corta a navalha
sangrou as tripas no ventre
o beijo quando for que seja
de língua mordendo a carne quente
algaravia
eu
sou o vento que
remove teus cabelos e
repousa em tua face a
outra face do que sente mas
não vê a
palavra que um dia escreverá
– algaravia nas películas da memória na
ficção que entender come
poesia menina come
poesia pois
não há mais metafísica no mundo do que comer poesia
come poesia menina come poesia não há mais metafísica no mundo do que comer poesia come poema menina come poema temos delicados drops de anis ou chocolate de café para festejar leila diniz temos as líricas tímidas românticas abstratas metafóricas atrevidas temos os chuviscos bomucados maria mole rapadura temos também as ácidas viscerais eróticas concretas sensuais as que não livram a cara do fascismo e dão porrada em ditadura
embriague-se
já me dizia Charles Baudelaire
hoje estou em estado de vinho
só venha comigo quem flor acaso
bem-me-quer
suspenso no Ar não penso
atravesso
o portão da tua
casa
o corpo em fogo
a carne em brasa
tudo arde nas cinzas das
horas
no silêncio da
tarde
vou
entrando sem alarde
sem comício como o pássaro
que acaba de cantar
em pleno hospício
*
se me perguntam
respondo
:
não tenho a mínima ilusão pelo futuro dessa cidade veracidade
mas não me entrego
sou curisco kabrunco capeta
candeias
ainda tenho muitos poemas de brecht
pulsando em minha veias
pedra
pássaro poema
era uma vez
um mangue e por onde andará macunaíma na sua carne no seu sangue na medula no
seu osso será que ainda existe algum vestígio de macunaíma na veia do seu
pescoço? na teoria dos mistérios dos impérios dos passados nas covas dos
cemitérios desse brasil desossado? macunaíma não me engana bebeu água do
paraíba nos porões dos satanazes está nos corpos incinerados na usina de
cambaíba em campos dos goytacazes macunaíma não me engana está nas carcaças
desovadas na praia de manguinhos em
são francisco do itabapoana
*
leandra andra como quem escapa da cilada de uma palavra acesa e eu kabrunco acendo a lamparina para iluminar a encruzilhada ainda hoje os dentes mordem a lavra da palavra quando ela se despe atrás da porta para ter sua carne devorada no poema sem nenhum pudor ou receio de problemas
serAfim 7 - artur fulinaíma o outro
se o amor fosse apenas desejo quantos beijos neste dia roubaria do teu corpo por inteiro se a paixão fosse primeiro quantas horas passaria no teu corpo noite e dia de janeiro a janeiro se nada disso resolvesse fome sede fogo febre mergulharia em ondas novas todo mês de fevereiro
cidade
veracidade
campos
189
transverso atravesso esta cidade que me atravessa em silêncio ouço o gemido dos teus ecos por ruas avenidas e vielas sinto saudade dos terreiros de jongo nas favelas e as lavadeiras das pinturas aquarelas em teus aceiros fiz meus trilhos em cada trilha dos meus traços no encontro ao ururau no cais da lapa teu por do sol pode ser beijo ou também pode ser tapa quando olho a catedral e seu contorno seres famintos alimentando o desalento me solto ao vento quando penso o infinito beijo teu rio o paraíba que me leva em teu lamento me concentro em minha reza
carne viva
da loucura
escrevo pra não morrer antes da
morte me disse gigi mocidade no homem com a flor na boca transitivo ou intransitivo
vivo na mais sagrada ilógica do inconsciente coletivo na semeadura dos ossos
carnadura enquanto posso palavrar o que
procuro enquanto ócio vou lavrando o criativo na carne viva da loucura quando
da morte sobrevivo
*
inquieto procuro mais uma palavra
cínica fulinaimânica sagarínica no corpo da palavra corpo o sangue no corpo da
palavra polifônico sinético poema biotônico ressigni –ficar cada lugar na sua
coisa cada coisa em seu lugar o ser da coisa serafim vampiro goytacá canibal
tupiniquim cbf vergonha geral desastrosa overdose poética você entra com a dose
eu entro com a boca depois a gente troca para o over não dormir de toca meu
diário escrito em aramaico me persegue quero mais que o quiabo vos carregue uma
tragédia chamada enel se alastra pelo país quando nasci meu pai me deu caju
minha mãe severina cuscuz com carne seca no leite da manhã vã filosofiia lembra daquele dia dezembro mil novecentos
e noventa e quatro?
j medeiros deu um show trepado no túmulo do torquato saímos do cemitério pro mercado para lamber a cajuína era uma tarde de sol em teresina não sei se foi assim só sei do mal-me-quer nas pétalas das flores do mal tem euGênio mallarmè sangrei a carne da rosa com duas dentadas devorei as pétalas vermelhas de sangue abri um vinho com meu leque de vento e ofereci aos deuses das encruzilhadas com federika bezerra - a porta bandeira da imperial tropicanalha na escola de samba da poesia contemporânea brasileira não curto palavra morta oca prefiro minha língua torta lambendo a saliva viva no canto da tua boca
irina é um sol
que dói no crânio
quando dentes ardem
e mordem
os beiços da tarde
não posso permitir irina vestida de cetim de seda fina se a quero felimina vestida de sombra e luz a carne em flocos de lua olhos de não sonhar um abajur cor de carne nas pedras de lumiar
impossível pensar irina vestida com outras vestes este ser cabra da peste do inconsciente coletivo do imaginário incandescente
inútil pensar irina vestida de serpentina como fez cinzia farina em seu
poema visual era uma tarde de chuva num sonho de carnaval
naquela hora
marcada do encontro que não tivemos
muitas vezes demoro sim levo um
tempo para poder decodificar algumas informações não muito previsíveis nem
compreensíveis para massas cefálicas como as minha tenho andado em
estados como se tivesse não estado essa enel tem me furtado a
paciência muito mais que os amores não furtados acabei de ler saramago em seus
instantes de lucidez furiosa jiddu saldanha acaba de me dizer que continuo com
a mesm a fúria de antes e nem sei se isso é possível diante dessa letargia
nostálgica que as vezes me abate como uma lâmina ninja do cinema japonês li uma
resenha a pouco de um cara chamado fernando naporano lembrei-me de 1997 quando
juntos no festival de inverno de ouro preto criamos a antologia do requinte do
lírico ao delicado do erótico impressa em papel criado com folhas de bananeiras
com a super direção do mestre dos mestres sebastião nunes desse livro coletivo
nasceu a ideia final dos retalhos imortais do serafim iniciada em 1994 no cefet
campos e em 1995 no sesc consolação-sp daí em diante começamos a dar voz e fala
para alguns serafins que até hoje me acompanham
nessa não viagem que muitas vezes tento mas não
faço assim como o encontro com stella naquela hora marcada do encontro que não tivemos
meta metáfora no
poema meta
como alcançá-la plena
no impulso onde universo pulsa
no poema onde estico plumo
onde o nervo da palavra cresce
onde a linha que separa a pele
é o tecido que o teu corpo veste
como alcançá-la pluma
nessa teia que aranha tece
entre um beijo outro no mamilo
onde aquilo que a pele em plumo
rompe a linha do sentido e cresce
onde o nervo da palavra sobe
o tecido do teu corpo desce
onde a teia que o alcançar descobre
no sentido que o poema é prece
serAfim 8 - euGênio mallarmè o filho de Severina conterrâneo de torquato
eu sou menino eu sou menina e não
venham me dizer que lança perfume é parafina diversidade de gêneros podes crer
– não me alucina eu nasci da minha mãe que se chama severina lá dos sertões do nordeste nor/destino
nor/destina como o sal do maranhão bumba-meu-boi não desafina conterrâneo do torquato
eu nasci em teresina
*
aqui
em casa
lavo pinto
bordo
o corpo
a alma
os pelos
cada um que
pinte seus
delírios
cada um que
desenrole
seus novelos
*
irina me disse há um poema seu debaixo das
escadas atrás de cada porta dos palácios metaforicamente fulinaíma desvenda
todos os mistérios interplanetários na invasão dos intra poderes que comandam a
invasão cibernética dos ventos e por consequência
a invasão dos corpos
itabapoana
pedra de toque
língua de rock
blues bodoque
não gaste seu silêncio atoa
um beijo nessa pedra
e a palavra voa
ouvindo música pra remédio
quando se trata de metáforas macabea invade a meta do poema afora
e se esconde atrás do personagem trancada no sub-inconsciente semi-morta pra toda fauna toda flora na moralidade mata o que o corpo sente deixa a carne apodrecer ao sol da mordacidade
entre hóstias e cultos anti-bíblicos
castrada de toda e qualquer sexualidade prende o gozo na boca quando se masturba mentalmente ouvindo
música pra remédio travestida em todo tédio
você pensa que escrevo em rua reta ou estrada
sinuosa para você poesia é verso do inverso ou avesso de uma prosa? escrevi
pscanalítica 67 em mil novecentos e sessenta e sete numa madrugada de setembro
outubro quando visitei meu pai no henrique roxo e vi vespasiano contra a parede
dando cabeçadas no manicômio mais uma vida exterminada e no fim das contas
noves fora nada tudo o que eu queria dizer naquela hora explode agora quando
atravesso o portão da tua casa o corpo em fogo a carne em brasa sem pensar
estética estrutura estilo de linguagem sinto o desejo entre os teus mamilos a
espera do beijo da esfinge que devora
*
irina
serafina onça branquinha brincando de ninfeta com sua língua de fogo devassa o
imoral queima boletos da sabesp na cara de tarcísio desfila na paulista com sua
bu(a)nda de metal
tão distante teresina
me lembro da cajuína
saudade da faustina
que conheci no carnaval
da mostra visual de poesia
brasileira
tinha carlos careqa
jormmad muniz de brito
rubervam du nascimento
o verbo então carnal
argamassa no cimento
mas a carne tão macia
viva crua quase nua
acendeu a luz no apartamento
poética
38
se baudelérico ou baudelírico
só sei que ando meio mallarmélico
completamente absurdado
com esse leite condensado
na minha língua do meu delírio
Agora que Isadora em mim amoras no pomar da minha casa meu corpo incêndio no barril é pólvora a carne em chamas no esqueleto brasa o fogo acende os pavios entorpecidos e o instinto volta a fazer parte dos sentidos
a porta bandeira
a
pedra na carne
a carne na pedra
nem tudo o que me fere
fedra
nunca estou
mesmo estando
onde nunca estive
mesmo tendo estado
isso me provoca sérias dúvidas
dívidas pra resgatar no fim do mês
e o preço da carne seca
está mais caro no mercado
na pele do poema
o cavalo selvagem
cavalga a pele do poema
enquanto transa na pastagem
um novo trote
a deusa do rock
berra em outro canto
enquanto na voragem da vertigem
assento a pedra de xangô
na vitória do espírito santo
naquela noite de chuva
as cores no vestido de iansã passaram
despercebidas por aqui o sangue encarnado nas matas de oxossi e o olho do
dragão na ponta da espada de ogum ainda que aline na porta da casa velha
tivesse sobre a pele meus olhos presos por
palavras escritas na parede as sagradas escrituras não dissessem o
quanto ali brotavam flores naquela noite de chuva um coração estraçalhado
61
a
musa do guarda chuva
a musa do guarda chuva não mora mais aqui nem desfila em
minhas performances no teatro municipal baby magrelinha se mudou para santo
andré depois da tarde de chuva era um sábado de tropicanAlices e carolina na
outra ponta do tapete todo grafado em poesia a orquestra tocou uma valsa
dançamos a distância no meio do povo antes da chegada de pirandello na voz de
mônica cardela ainda não havia o homem com a flor na boca só algum tempo depois
cacá de carvalho me apresentou na sala maria antônia numa semana da usp tenho
desejos de sampa hoje amanheci com a traição das metáforas enroladas em minha
garganta coloco o vinil na vitrola enquanto cássia eller me canta
a carNAvalha em
são luis do paraitinga
certa vez foi ao carnaval de são luis do paraitinga queria conhecer o povo caiçara ver os folguedos de artifícios no jogo do baralho do batman com o coringa mas o dilúvio nos aterrou na estrada só chegamos em profunda madrugada nem ás de copas muito menos ás espadas em nossa bagagem cerveja era só o que restava no culler da federika a mulher mais rica do bordel da boemia muito mais até que a diva a maior puta do país no curral das éguas das planícies montanhosas na madrugada iluminada como se diz lá nas quebradas em são luis do maranhão
pohermeto
oswaldiano
que a cia das letras ainda não
publicou
pedaladas ao mar
quando invento
poema ao sabor do vento
as mambucabas quando chegaram em santa clara traziam pimentas caiçara conchas vermelhas de ubatuba salsinhas de itacoatiara miçangas azuis de são luiz do paraitinga trilhas da serra de paranapiacaba muitas garrafas de pinga para as mesas do interventor godot não perdia tempo metia a boca na moringa pensando que era um coringa dos bailes do imperador tomava banho em guaxindiba enrolado nos trapos do enxugador
faroeste
lamparão
para
torquato neto – in memória
quando saí de casa ia dar um tiro na cara do delegado mas estava
desarmado estão me colocando em histórias dos tempos do não sei onde como se eu
durando kid comesse a filha do conde nunca comi amarela em cinema mexicano
muito menos a ruiva do faroeste americano disseram que eu tive caso de amor que
se tornou pernambucano quando encontrei o poeta no trailer do ricardinho foi me
falando de mansinho como se trampa uma batalha pra não cair na armadilha a grana palavra cilada
agora não se
fala mais
agora não se fala nada
o
homem com a flor na boca
federico pensou iracema com seus grandes vestidos folgados como a grande ninfeta iolanda trajada em vestes de penas nos bailes do império em luanda nas barras das saias da fama ele então grafitou grumixama palavra que ouviu numa cena na língua da formosa dama no teatro da rua ipanema nos bordeís de copacabana os cogumelos de santa cecília nas barras incandescentes da cama pornofônicas palavras fonemas pitanga urucum colorau açucena com os caldos da salsaparrilha
qualquer grande orgia é pequena
garrutio
o sobrinho do meu tio
marcou o boi com ferro em brasa
por ordens de dom diego de la
riva
e na janela da grande casa
do mosteiro de são bento
azeredo
furtado garruchava
lençóis de trigos ao vento
enquanto o boi estribuchava
com a metáfora ensanguentada
no couro cru na carne viva
do santíssimo sacramento
lamparão
lamparina acesa no trovão
relâmpagos atravessam corredores
lá fora chove canivetes e navalhas
quebradeira geral no umbral
das coisas incompletas
relampejam nos currais sacramentados
entre a desgraça e a glória
e aqui incorporados
nos porões da nossa
história
são saruê
festa no sertão é bala
bola no buraco é búlica
cabral não descobriu a pólvora
por trás de cada coisa pública
a chama do lampião na palha
fogueira sempre quero acesa
linguagem meu fuzil metralha
explosão como feijão na mesa
são saruê 1
o vento nordeste
atiça meu ser cabra da peste
assumo o risco
sou diabo sou curisco
boto a peixeira na cinta
pra pular fogueira
em noites de são joão
meu xangô xangô menino
viva o povo nordestino
nosso deus é lampião
profana
tenho apenas
esse punhal
de prata
e a lua já
não é mais cheia
poesia
sempre na veia
e aquele
beijo guardado
que ainda
não foi roubado
na noite da santa ceia
serAfim 10 –
lady gumes ponte grande
com dois me deito
com três me levanto
com a graça de zeus
e do divino espírito santo
macabea chorava osso a ponte quebrada não me leva para o
outro lado olho o espelho d´água e tenho
certeza que vou me afogar engoli o vento da primeira madrugada a casa era cacos de vidros minha filha vaza os pés em rio das ostras nunca mais pensei o mangue
como a morada dos peixes e o canal passava atrás da varanda da cozinha hoje
estou sóbria muito mais que embriagada pela maresia com esse cheiro de sexo
evaporando pelo olhos e o corpo tremendo de susto por não ter com quem gozar
*
algumas imagens permanecem
na medula da memória e me mantém viva água viva ontem mesmo te vi à estrela
do mar e mesmo não estando foi como se
estivesse tatuada em minha pele com letras de sol e sal nos raios de luz do
luar beijei teu nome nas algas e
mergulhei no teu olhar
fulinaímica
não sei escrevo tanto
não sei se escrevo tenso
um fio elétrico suspenso
com tanta coisa no Ar
não sei se olho em teu olho
pra encontrar a entrada
da porta da tua casa
onde a palavra estiver
não sei se pinto um van gog
ou se escrevo um baudelaire
fricção
quem passou a língua nas coxas da caipora? me pergunta
federico baudelaire cheirando as flores d0 mal no sarau de euGênio mallarmè
gigi então invoca a dona santa federika que baixa na mesma hora - ora bolas fui
eu com minha língua de faca cortei a cara da vaca a começar pelas coxas depois
subi pelo corpo até o buraco da boca e
meti a língua na língua e na suruba das línguas a dela mordendo a minha a minha
mordendo a dela a arte então se revela não existe arte sem língua nem teatro
sem linguagem
a arte é uma grande suruba no segundo andar da padaria e o resto mais é paisagem no altar da perfumaria
irina
me disse ontem que não quer saber de nada que aconteceu ou que vai acontecer seu prazer é
mais intenso quando não sabe nem pensa no que irá fazer anda muito dada ultimamente não mente quando o assunto é paixão ou
sexo seu desejo é mais complexo que o recôncavo do convexo do baiano da santíssima salvador e seja como for tem andado muito pensativa com as frases
positivas do seu anjo serAfim nas páginas ainda brancas do vampiro goytacá
canibal tupiniquim
*
a poesia é meta física
meta quântica
itaipu é um paraíso
dentro do que restou
da devastada mata atlântica
serAfim 11 – irina serafina januária vascaína
irina serafina
quem quiser
que me defina
menina oxum
é por você que me deleito
só por você que me deliro
do lado esquerdo do peito
é por você que me trans-piro
por tudo que foi secreto
por tudo que é sagrado
por quanto já foi escrito
ou ainda não falado
na pedra itapemirim
na pedra de itaocara
guapimirim curumim
guarapari guanabara
em toda água seus mitos
tua flor de lótus tão rara
menina oxum infinito
minha folha verde bonsai
na-mora dentro de mim
de dentro de mim não sai
freudelírica
certa vez
em santa maria madalena
conheci helena
nem de triunfo nem de tróia
no pescoço não levava jóia
apenas um saco de ratos
com os trapos que eram teus
fez de mim gato e sapato
por entre as montanhas de zeus
*
certa vez em vila velha na vitória do espírito santo trepei no bonde no centro histórico da cidade velha enquanto andra mirava seus olhos sobre os meus entretanto no entanto nada me disse em seu silêncio de tanto de tanto dizer tanto no trem um tanto no centro um encanto metafórico no trem do engenho de dentro
*
da cana
o açúcar
o melado
a rapa dura
o chuvisco da gema do ovo
e a minha língua sacana
bagunçando a ditadura
falando a língua do povo
fosse apenas
uma palavra reta carinho afeto e uma que ainda falta nesse novo alfabeto que
procuro tateio no escuro outras palavras signos signi ficar signi ficando signi
ficado na hipotemusa do quadrado do cateto no silêncio que muitas vezes ouvi da
flauta do hermeto nas trinta e cinco pausas de renata persigo a trilha em
movimento pés descalços sobre a mata e as palavras brotam cachoeiras água
corrente vem da fonte como sementes desejadas de brotar
a flor do mangue
para cristina bezerra
um dia em gargaú
atravesso para o pontal
onde o paraíba beija atlântico
num ato transexual
outro dia na barra
onde o itabapoana
é quem beija o lixo atlântico
penso
quântico caranguejo
é o beijo do desprezo
são francisco não me engana
sagaranagens que faz comigo
eu procuro a flor do mangue
no litoral do teu umbigo
*
marcabra
perambulava ainda as tontas pelo mar vermelho procurando por carlitos argentino
(o criador dos moranguinhos) vomitava marimbondos depois que assistiu pelas
ruas assombradadas de campos ex-dos goytacazes as mirabolantes peripécias de lady
tempestade desnudando coronéis e lobisomens com suas rajadas de vento confesso
que não invento a hipocrisia dos homens
*
lady tempestade a freudelírica satiriza macabea no presídio
federal de brazilírica interpretando luz del fuego no festival internacional
das artes cínicas com uma serpente de cobre no pescoço
serafina macunaímica
ontem
disse que me amava
queria até transar comigo
hoje foge de mim
tranca a tranca do umbigo
fecha a porta entre as coxas
ela sabe que me deixa louca
e adora provocação
mas vou buscar no cu do mundo
sua libido o seu
tesão
dialogando com o
mestre
o poema pode ser
um trem fora do trilho
a ponte que caiu
a mulher que não deu filho
ou a pedra que pariu
domingo
mar de barco
mar de pele
mar de peixes
mar de algas
como um poema de olga
onda de sal nas minhas mágoas
como sua pele de mel
com sua pele de água
*
rasguei as velas
que teci em tempestades
rompi as noites
em alto mar de maresias
pensei teu corpo
pra amenizar tanta saudade
e vi teus olhos em cada vela que tecia
*
o
poema as vezes é sabre
lâmina
fina como o vento
ou folhas suspensas
sobre um verde
quase água
quase pluma
levita sobrevoa se espraia
na voragem do dia
como os dedos da moça
ao atiçar o clic
no instante exato da fotografia
cidade
voracidade
ainda ontem queria te ver mas não
pude – cidade rude oculta atrás do espelho do outro lado da calçada não
decifrei teu mapa muito menos cais da lapa onde queria mergulhar teu rio desbravar
teu cio para depois dormir
*
até
onde
teus
segredos me aceitam?
até
quando
teus mistérios me pertencem?
até
onde
teus silêncios tem meus gritos?
quando
me deixas assim aflita
perco
o chão por onde pisa
por
onde teu pé desliza
que
não sei quando ele está
e
se perco teus pés de mim
por onde vou caminhar?
*
se ela vier
no frescor da maresia
lhe darei milhões de beijos
antes do amanhecer
de um novo dia
e do corpo que comer
a carne
espalharei tabacaria
*
moro no teu mato dentro
não gosto de estar por fora
tudo que me pintar eu invento
como um beijo no teu corpo agora
desejo-te pelo menos enquanto resta
partícula mínima micro solar floresta
sendo animal da mata atlântica
quântico amor ou metafísica
tudo que em mim não há respostas
metáfora d´alkimim fugaz brazílica
beijo-te a carne que te cobre os ossos
pele por pele sobre as tuas costas
os bichos amam em comunhão na mata
como se fosse aquela hora exata
em que despes de mim o ser humano
e do corpo rasgamos todo pano
e como um deus pagão pensamos sexo
em todas minhas partes
concretas abstratas
o amor sempre retrata
todo espelho que vivi
mariana
gaivotas sobrevoam os cílios da lagoa teus cabelos louros espelham sal na lâmina d´água o
mar – complemento do teu nome naquela
noite de música mágica – quando vozes da
áfrica saltaram da garganta canto de todos os povos no verde da mata luzes na flor da
pele líquida cerveja na sede que não cessa éramos mais que tímpanos absortos
naquele espaço templo com os olhos
famintos devorando luas na constelação
de orions como uma flor de cactos sobre um chão de estrelas
meta morfose
muitas vezes no instante uma
mulher por perto noutras meio distante
como alcançá-la plena pele
pluma palavra carne sal água de mar
mesmo fosse água de rio se
o que gosta é tempestade só sabe amar por inteiro meu
eu perdido em sua fala
*
sou uma mulher da vida irina severina januária vascaína uso a minha arma branca pra enfrentar a tirania transo em qualquer rua de qualquer esquina qualquer encruzilhada de qualquer lua com jorge de ogum federico de oxum mallarmè de yansã não sou pagã fui batizada na igreja universal do reino de zeus nasci em ouro preto vila rica sou filha de deus irmã de federika
*
são fransciso um cisco risco de
mergulhar no precipício saltar o muro na porta do hospício risco
traço de palavras tortas palavra que não dizem nada risco de perder a curva e seguir
a linha reta medo é uma forma concreta de agarrar o abstrato
por
enquanto vou te amar assim sem segredo admirando o teu retrato
o tempo
tem seu avesso
para
Prata Tavares in memória
cidade quando penso nela lembro nossas angústias dormem em
camas de ferro madeira ou palha nossas
palavras também são foices facões ou car/navalhas nossos poemas estiletes
canivetes para rasgarem o pano de luxo das mortalhas nossas mágoas lavamos nas águas do paraíba
enquanto eles que pensaram serem donos
da cidade incineraram corpos
na usina cambaíba
*
esta noite me
preparo para o sagrado de amanhã alguma coisa me diz alguma coisa me conta que vamos
nos fartar de carne humana num banquete antropofágico algum acidente trágico pode
estar pra acontecer alguma força simbólica entre nós assim pressinto com a
química do absinto caldeirão da alquimia como nas noites da cacomanga
preparava minha tia alguma bruxa quem
sabe em campos dos goytacazes está pronta pra atacar ou quem sabe pastor de
andrade é quem vai nos apresentar
serAfim 12 – pastor de andrade o antropófago
absinto
impossível
te sentir mais do que já sinto
poesia muito prosa as vezes pedra noutras
vezes fedra quero dizer que ainda arde a palavra na palavra corpo quando carne
e sangue incendeiam paiol de milho na fazenda da infância cacomanga era um
tempo de fartura enxada na palavra do poema
*
ela vendia brigadeiro
e eu não fui
o primeiro
a provar
suas delícias
federico passou na frente
como
expresso do oriente
nos levando
à boa vista
de onde ela
tinha vindo
a curuminha
contente
vendeu tudo
em um dia
doce que o
povo comeu
sorrindo
ainda dizia
- vocês são
mais loucos do que eu
discípulo de rimbaud
minha tv pifou nem tenho ido ao cinema meu filme está carne da palavra esse poema é trágico me lembra infância lá na cacomanga televisão
nunca tivemos era rádio de pilha depois
de bateria meu pai criava porcos para vender na primavera e complementar o seu salário que nem o mínimo era carteira de trabalho nunca teve
como administrador de uma fazenda com mais de 1000 alqueires de terra com produção agropecuária canavieira e cerâmica industrial (usina de moer
gente) esse é um poema em linha reta nem sei por quê e para que me tornei poeta discípulo de rimbaud talvez só para
escrever que no brasil mesmo depois da
abolição escravidão nunca terminou
no curral das merdavilhas
*
desde que resolvi abrir o meu baú de ossos da memória que algumas pessoas que antes desfilavam por aqui como amigas agora fogem da página como diabo foge da cruz não escrevo para sacerdotes escrevo para quem vive em liberdade e faz da liberdade o seu sentido maior de viver não vivo atrás de portas/cortinas escondido embaixo de panos a minha língua é explícita linguagem voraz e sacana aprendi com oswald que humor sarcasmo ironia são armas mortais na cara da hipocrisia
*
itamarna é uma cidade morna quase cinza sem
brilho mesmo assim pelas noites passeiam por ali vaga-lumes vagabundos com suas
asas de lâmpadas lamparinas irina também passeia por ali pelas madrugadas
vestida de quase nada
mini conto
no livro as vísceras expostas em
grande estilo tudo aquilo que é ferida aberta passeia sobre o branco do papel
todos os órgãos extirpados por uma única facada
sagaraNAgens
minha ovelha preferida está se
rebelando os ensaios da mocidade
independente de padre olivácio
estão se aproximando e ela não dá as caras vou baixar decreto vou baixar o
santo e não diga no entanto que sou linha dura dessa rapadura você ainda não
viu ela não é santa e não duvido nada que a sua mãe foi a ovelhana que pariu
metafórica
dialética
quantas teorias terei
para escrever o que falo
quantos sapatos ainda apertam
os calcanhares do meu calo?
mim
o enigma não está propriamente
na meta física da metáfora mar de carne e osso se eu não falasse ou não dissesse esse
relógio trágico com seus ponteiros
mágicos arrastando segundo por segundo
tudo o que não passa tudo o que não cessa
o fluxo em tua boca de vênus - minhas unhas
só o céu é testemunha desse instante único em que passeio em tua pele como
uma flor de lótus flor de cactos flor de
lírios ou mesmo sexo sendo flor ou faca
fosse mar de tanta espuma com minha
língua de espera em tua língua de amora em tua língua de mara em tua língua de mar
labirinto
beatriz – a morta
oswald de andrade re-visitado
como pedra me olhas
como fedra te vejo
vestida de carne nua
a língua na maçã navalha
tua alma transparente crua
o olho por detrás da porta
poema com pavio aceso
quando oswald pariu a morta
tinha o dente
nos teus olhos preso
angra
assim como
o pau-brasil
a flor do mangue
também sangra
a traição
das metáforas
caipora tem andado
atormentada pelos corredores do presídio federal de brazilírica a maconha
mofada de juiz de fora deve ter provocado um efeito negativo em
seus neurônios ela tem andado surtada delirando com perturbações mentais da
ordem dos apocalípticos seguidores do santo daime dai-lhe misericórdia santo zeus
caso contrário ela vai acabar no cais da lapa ou procurando jongo em custodópolis tendo alucinações com maria anita e se arriscando a levar uma coça de umbigo de
boi e aprender a não olhar só para o seu umbigo
*
na traição das metáforas macabea
já sofreu as consequências pelos mesmos delírios e nem psicanálise lhe devolveu
a sobriedade ficou cada vez mais dilacerada pela própria língua/espora com que
tentava ferir a barriga do cavalo ouça um bom conselho caipora aprendi
com chico buarque – “eu lhe dou de graça venha minha amiga faça como
eu faço inútil dormir que a dor não passa venha minha amiga brinque com o
meu fogo venha se queimar eu semeio vento na minha cidade vou pra rua e
bebo a tempestade”
*
gosto da leveza dos dedos deslizando feito pluma penetrar a carne e as sensações saltarem para o abismo do poema depois dos saraus ela ia de pele e na pele dela eu ia pra trancoso no litoral da bahia ou para raposo estação d´água de itaperuna curtir a pedra do toque ela sempre me disse sentir mais minha carne que a pedra do arpoador em maresia e sempre gozou mais quando a saliva por entre o
anus escorria
memórias no desassossego
não sou fernando pessoa mas acordei com o
coração em alvoroço aliás nem dormi literalmente no desassossego da memória
uilcon pereira passeava com o seu coração de boatos a procura do gabriel de la
puente que até hoje não sabemos a ponte por onde atravessou sem direito a
despedida a luz do farol da barra me vem aos olhos de um amor que vem chegando e
me promete acarajés e escadarias o tempo ah! o tempo e seus contornos
inesperados quando iria imaginar que depois de ouvir por tanto tempo com paixão
sem limites gil caetano
gal bethânia estaria agora assim tão assim no colo de uma baiana bebendo o
líquido bom que algum zeus me reservou e deixou guardado para mim?
*
e ela era uma estudante de
arquitetura que pintou poemas no cachorro louco e escavou imagens em
brazilírica pereira : a traição das metáforas - e quero dizer que ainda arde
tua manhã na minha tarde a tua noite no meu dia tudo em nós que já foi feito
com prazer ainda faria
*
certa vez numa
visita que fiz ao presídio federal de brazilírica pereira com o objetivo de
levar algum alívio para algumas daquelas almas pecadoras me surpreendi com a oferta
de macabea
:
- morda o meu
pescoço prove do meu sangue
- cruz credo zeus
me livre teu sangue não me serve deve
estar contaminado de repente com o veneno da serpente
*
o cu do mundo onde fica?
minha língua afiada
onde enfiá-la?
fulinaimagem
metáfora nua na janela
meter a língua na linguagem dela
*
rocei suas mãos em conchas pele
de ostra molhada mel escorreu por entre as coxas beijei o éter no ar pesquei
tua língua que voou depois do coito oito horas depois do abstrato esse lugar
enigmático onde estou quando te quero quero quero no pátio da sala plínio
marcos foi embora alceu valença manda um frevo na esplanada no festival de
pernambuco o eunuco dançarino enrola um papel de seda o pó da pluma na penumbra
penetrou minha asp/irina
A
mulher que goza assistindo
futebol
irina serafina januária vascaína goza assistindo futebol na televisão do vizinho da esquina geme berra urra quando atinge o ponto g eu peço não gema não grite e ela grita: - é gol de roberto dinamite
*
tem uma coisa aqui que ainda não sei decifrar o código do
significado 7776668 é o número do apartamento na quinta avenida e não estou em
new york nem em bagdá estou mirando itapoã em salvador dali me disse: meus
bigodes são mais lindos do que qualquer fellini no cinema meu sangue está na
lama misturado a cocaína com a língua clara dessa gosmenta gelatina - enquanto
do outro lado da avenida joaquim pedro de andrade me pergunta: e por onde
andará macunaíma?
*
sou a lenda
oculta
para o imposto de renda
deixa star
presente
na oferenda
que fiz ontem
pra minha mãe yemanjá
antropofagia
esse poema é um tratado
entre o poeta que tem fome de clareza
e sua musa simbolismo de beleza
se eu não beber teus olhos
não serei eu nem mais ninguém
disse o poeta a sua musa
ainda esfinge
beber na fonte dos seus olhos
sem medo de ser feliz
ela completa não quero
poema em linha reta
ainda sou clarice/beatriz
é ela quem me diz
mas eu não sou discreto
no abstrato do concreto
no concreto do abstrato
todo homem que tem fome
abapuru é o teu auto-retrato
Itabapoana Pedra Pássaro Poema
uma metáfora
não é apenas uma metáfora
quando a pedra é pássaro
em gargaú
às 5 horas da tarde
as garças voam
em direção
ao outro lado da pedra
em guaxindiba
tenho em mim
que pássaros voam
peixes nadam
quando procuram
outro pouso
bracutaia
eterna lenda
estranho pássaro
da pedra ouviu o grito
que voou
de gargaú pro infinito
*
em 1990 levando uma turma de estudantes da ETFC em uma excursão para ouro preto-mg artur gomes criou a mocidade independente de padre olivácio - a escola de samba oculta no inconsciente coletivo na rua federal do bar da lama e me deu o cargo de patrono da referida instituição lá pelos idos de 1974 padre olivácio tinha me dito : - o machado de xangô está em vossas mãos vá e faça justiça porque senão fizer ninguém fará.
*
devoro-te a carne
como quem bebe um vinho
numa sexta feira
7 de setembro
no desfile da independência
isabel inteira
pele osso pluma
plena de desejos
acordou entre meus dentes
na quinta da boa vista
*
com uma dentada na
veia do pescoço matei o prefeito de cambaíba limpei desossei lavei assei no mesmo forno da usina recheado com
maçãs do paraíso e servi a santa ceia
aos meus 12 apóstolos das bacantes com um farto altar das mil e uma noites
decorado com milhares de garrafas de
vinho para o deleite das 7 eras de vênus
afrodite quem quiser
A
Mocidade Independente de Padre Olivácio – A Escola de Samba Oculta No
Inconsciente Coletivo, nasceu em dezembro de 1990, durante uma viagem em que na cia de Guiomar Valdez, levamos uma turma de estudantes da então ETFC(IFF), a
Ouro Preto-MG, como premiação por terem vencidos a Gincana Cultural
desenvolvida durante o ano, pelo Grêmio Estudantil Nilo Peçanha. Lá conheci
Gigi Mocidade – A Rainha da Bateria, com quem vivi até 1996.
*
A Igreja
Universal do Reino de Zeus, criei em 2002 durante a 1ª Bienal do Livro de
Campos dos Goytacazes-RJ, que foi realizada nas dependências do Ginásio de
Esportes do então CEFET-Campos, onde na ocasião lancei o livro BraziLírica
Pereira : A Traição das Metáforas, em homenagem ao nosso grande e saudoso
mestre Uilcon Pereira.
O grande
objetivo da IURZ é homenagear deuses deusas da África e Grécia para de alguma
forma descobrir de onde vem as nossas ancestralidades. De alguma forma e em
alguns momentos mitologia grega e africana se misturam e viajando
metaforicamente nessas realidades reinventadas vim desaguar no Vampiro Goytacá Canibal
Tupiniquim.
Artur Gomes
É poeta. ator. produtor cultural e vídeo maker. Em 2023, criou o projeto Campos Veracidade para a Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima onde atualmente atua na coordenação cultural em Campos dos Goytacazes-RJ.
Livros Publicados: Um Instante No Meu
Cérebro(1973), Mutações Em Pré-Juízo(1975), Além Da Mesa Posta(1977), Jesus
Cristo Cortador de Cana(1979), Boi-Pintadinho(1980-1981), Suor & Cio(1985),
Couro Cru & Carne Viva(1987), 20 Poemas Com Gosto de JardiNÓpolis & Uma
Canção Com Sabor De Campos(1990), Conkretude Versus ConkrEreções(1994),
BraziLírica Pereira : A Traição das Metáforas(2000), SagaraNAens Fulinaímicas(2015), Juras
Secretas(2018), Pátria A(r)mada(2019), O Poeta Enquanto Coisa(2020), Pátria A(
r)mada, 2ª Edição revista e ampliada(2022), O Homem Com A Flor Na Boca(2023).
De 1975 a 2002 coordenou a Oficina de Artes
Cênicas da ETFC – CEFET-Campos – no IFF Instituto Federal Fluminense. Em 1993,
criou o projeto Mostra Visual de Poesia Brasileira, Mário de Andrade – 100
Anos, realizado pelo SESC-SP. Em 1995, criou o projeto Retalhos Imortais do
SerAfim – Oswald de Andrade Nada Sabia de Mim – realizado pelo SESC-SP. De 1996
a 2016, coordenou o Departamento de Audiovisual do Proyecto Sur Brasil – Bento
Gonçalves-RS – realizando Mostras Cine.Vídeo na programação do Congressso
Brasileiro de Poesia. Em 1999, criou o
FestCampos de Poesia Falada, projeto que é realizado até hoje pela Fundação
Cultural Jornalista Oswaldo Lima. De 2014 a 2016, dirigiu Curso de Artes
Cênicas no SESC – Campos. Em 2018 e 2019, o autor lecionou no Curso Livre de
Tetro da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima. Em 2018, participou como
convidado do I Festival Transepoéticas no Museu Naacional de Brasília-DF. Em 2021,
Curador do 1º Festival Cine Vídeo de Poesia Falada que é realizado na página
Studio Fulinaíma Produção Audiovisual no Facebook*.
Em 2019 criou o projeto Balbúrdia Poética, com duas edições realizadas na Taberna de Laura, em Copacabana – Rio de Janeiro, com a participação de diversos poetas convidados.
Em 2022, integrou a Mostra Bossa Criativa, Arte
de Toda Gente, realizada pela FUNARTE-Rio. Foi também curador da Mostra Cine e
Vídeo de Poesia Falada realizada pelo SESC Piracicaba. Realizou 7 edições do
projeto Geleia Geral – Semana de 22 – 100 Anos Depois, na Santa Paciência Casa
Criativa em Campos dos Goytacazes-RJ. Em 2023 realizou 8 edições do Sarau
Multilinguagens no Museu Histórico de Campos, no Teatro de Bolso, no Jardim do
Liceu e no Palácio da Cultura em Campos dos Goytacazes-RJ.
Em 2024 em parceria com Tchello d`Barros e Luis Turiba realizou a Balbúrdia Poética 3 – Torquato Leminski a + de 80 a ser realizada no dia 24 de Abril no Bar do Ernesto – Lapa – Rio de Janeiro
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