CONVERGÊNCIAS
A poesia visual de Tchello d´Barros
Em novembro na semana acadêmica do IFF - Campos Campus/Centro
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a desconfiguração do corpo
A dificílima, necessária e tormentosa
decisão de partir
Tem dias que
não dá vontade de falar,
carpir a paz, moer o amor,
colocar os sacos de lixo na rua,
arruar feito pedra, arrolar feito
pano,
ir até lá...
Não dá nem vontade
de rosnar.
Tem vezes que
não dá vontade de rir,
espremer a dúvida, rasgar o medo,
catar as folhas do céu cinzento,
amanhecer em primaveras,
folhear as manhãs,
sair daqui...
Não dá nem vontade
de grunhir.
Tem dias que
não dá vontade de urrar
torcer o sonho, secar a raiva,
estender as roupas no varal vazio,
amarrotar as tiras da existência,
varar feito pano, voar feito pedra,
ir até lá...
Não dá nem vontade
de falar.
Tem vezes que
não dá vontade de rugir,
premir o gozo, ferver a lágrima,
varrer a quina das paredes,
emparedar seus vultos,
adornar a esperança,
sair daqui...
Não dá nem vontade
de rir.
Aqui,
o estado atormentado
dos seres acabrunhados
a perigar...
Lá,
o estado tão almejado
das almas que hão
de se libertar...
Entre
esses dois estados,
estrelas de fogo, arcos luminosos,
anjos redentores, mares encantados,
milhares de dores, labaredas de
sangue,
demônios humanos, cavalos alados,
luas gigantes, campos floridos,
algum souvinir...
E a dificílima, necessária
e tormentosa decisão
de sair daqui,
ir até lá,
partir...
Joilson Bessa
Alphaville e Penha, 05, 06 e 07 de
outubro de 2022.
quem sou
nesse estado de coisas
tantas
um grito preso na garganta
e um outro
parado no AR
cacomanga
ali nasci
e minha infância
era só canaviais
ali mesmo aprendi
a conhecer
os donos de fazendas
e odiar os generais
Artur Gomes
Pátria A(r)mada
Desconcertos Editora
Nu
Quando estás vestida,
Ninguém imagina
Os mundos que escondes
Sob as tuas roupas.
(Assim, quando é dia,
Não temos noção
Dos astros que luzem
No profundo céu.
Mas a noite é nua,
E, nua na noite,
Palpitam teus mundos
E os mundos da noite.
Brilham teus joelhos,
Brilha o teu umbigo,
Brilha toda a tua
Lira abdominal.
Teus exíguos
- Como na rijeza
Do tronco robusto
Dois frutos pequenos -
Brilham.) Ah, teus seios!
Teus duros mamilos!
Teu dorso! Teus flancos!
Ah, tuas espáduas!
Se nua, teus olhos
Ficam nus também:
Teu olhar, mais longe,
Mais lento, mais líquido.
Então, dentro deles,
Bóio, nado, salto
Baixo num mergulho
Perpendicular.
Baixo até o mais fundo
De teu ser, lá onde
Me sorri tu'alma
Nua, nua, nua...
Manuel Bandeira
o brasil já foi ilha de vera cruz
e nunca foi ilha
já foi terra de santa cruz
e nunca foi santa
hoje ninguém mais se espanta
com o volume das trapaças
no curral das merdavilhas
Artur Fulinaíma
https://ciadesafiodeteatro.blogspot.com/
Uilcon Pereira nosso grande mestre - criou o verbo V(L)ER e nos dizia que era a única forma para aprender a ler poesia visual - em alguns textos do teatro do absurdo de Ionesco tenta nos ensinar a ler objetos. Aí eu me pergunto: qual a melhor forma de decifrar signos na poesia de Tchelo d´Barros?
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A poesia visual de Tchello
d´Barros
Arte em Movimento
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A p e t
i t e
para Marceli A. Becker
basta o desgastante falar das maturações
do tempo do verbo que nunca alcança
tez algodoada de um azul inquebrantável
onde a palavra é lúcida e a poesia é mansa
que o fruto ainda verde caia sobre as mãos
em um só sentido, uníssono e irreversível
desfazendo-se em grãos ao puir nos dentes
e confronte a etérea solombra atmosférica
com toda a força desgarrada das urgências
interrompendo o tempo sacro da semente
bendita seja a palavra daquilo que se consome
bendita a rebelião do lado de dentro da fome
Amanda
Vital
Do livro Passagem
Editora Patuá - 2018
com uma câmera
nas mãos
um poema na cabeça
vamos filmar o poema
antes que desapareça
Artur
Gomes
https://coletivomacunaimadecultura.blogspot.com/
grafitemas
e figuralidades
estou escrevendo um mini conto um grafitema umas figuralidades não é coisa de cinema a mais nua e crua realidade certa noite ela me veio não era sonho era uma noite de chuva com seus dois grandes olhos e mãos tão pequenas como quem grafita na areia um espelho d´água à beira mar na lua cheia vinha vestida de letras como o som da flauta de bambu dentro do fonema veio de longe da outra margem do rio dentro da tapera o cauim me trouxe na tigela bebi como índio na hora que vê nascer o filho beijei teus cabelos de milho e ela me perguntou quem eu era
CÍCLICA
O que acaba aqui
alguma coisa começa
em algum lugar
O fim não cessa
de inventar começos
e tudo é inescapável
ao tempo que não finda
O que começa aqui
alguma coisa acaba
em algum lugar
O começo não cessa
de inventar fins
e tudo é inescapável
ao tempo que não começa
Dudu Galisa
TANTO ÓDIO, CARLOS
o mundo é grande
e tem extremos
tem estrelas e tem estrume
tem perfume e tem veneno
tem dias que a gente ama
tem dias que a gente briga
mundo mundo vasto mundo
mundo malo mundo bueno
não me chamo raimundo
mas algo estranho me intriga
como cabe tanto ódio
num caráter tão pequeno
Ademir Assunção
Risca Faca – São Paulo
Selo Demônio Negro
2021
terror
[sil guimarães]
perder a alma
o senso
o tino
perder a fala
a pátria
a palavra
respirar a pouca luz que
cerca um país feito jaula:
até como?
[imagem oscar niemeyer]
hoje que você se foi
e ninguém pode negar
o que está feito:
as palavras guardadas no peito
são flores-navalhas
no chão do real;
e um poeta conhece
o tambor da fúria
capaz de gerar um furor.
hoje que você se foi,
o tempo de chorar
também já foi embora,
e um poeta conhece o tamanho do verso
capaz de abolir o acaso,
que as palavras são lances de dardos.
hoje que você se foi,
os bois que berravam na chapada
viraram sócios do açougue:
os néscios e os midas de sempre
sinlen$ifraram nossa dor.
e neste cenário de real pavor,
como num lance de touradas,
o troféu é entregue ao matador.
Salgado Maranhão
Do Livro A Cor da Palavra
Prêmio da Academia Brasileira de
Letras - 2011
Poema do aviso final
(Torquato Neto)
É preciso que haja alguma coisa
alimentando o meu povo;
uma vontade
uma certeza
uma qualquer esperança.
É preciso que alguma coisa atraia
a vida
ou tudo será posto de lado
e na procura da vida
a morte virá na frente
e abrirá caminhos.
É preciso que haja algum respeito,
ao menos um esboço
ou a dignidade humana se afirmará
a machadadas.
Punk Koreano
para Jiddu
Saldanha
hoje acordei
com uma vontade da porra
de trepar na goiabeira
talvez assim quem sabe
ela me chame de jesus
ou então me salve
dessa terra de tanta cruz
ou quem sabe bacurau
até mesmo um bacuri bacuri
para acabar com os golpistas
desse brazyl americano
ou então ela me chame
de exu cabra da peste
cobra criada no nordeste
esse punk koreano
Eugênio Mallarmè
Do livro O Poeta Enquanto Coisa
Fulinaíma MultiProjetos
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