Uma
didática da invenção
O rio que fazia uma volta
atrás da nossa casa
era a imagem de um vidro mole...
Passou um homem e disse:
Essa volta que o rio faz...
se chama enseada...
Não era mais a imagem de uma cobra de vidro
que fazia uma volta atrás da casa.
Era uma enseada.
Acho que o nome empobreceu a imagem.
Manoel
de Barros
poeminha
do contra
todos esses que estão aí
atravancando o meu caminho
eles passarão
e eu passarinho
Mário Quintana
um dia me lanço na trama
noutro me arrisco no jogo
não tenho medo do drama
quero o circo pegando fogo
6
outubro - 2022
a mulher dos sonhos
voltou ontem
sedenta faminta insaciável
esgotou-me
à última gota
mesmo vazio
me senti um tanto cheio
nem foi delírio loucura
porque vi no meu e-mail
o nome da criatura
Artur
Gomes
A Traição Das Metáforas
Alpharrabio Edições - 2000
Jura secreta 13
o tecido do amor já esgarçamos
em quantos outubros nos gozamos
agora que palavro Itaocaras
e persigo outras ilhas
na carne crua do teu corpo
amanheço alfabeto grafitemas
quantas marés endoidecemos
e aramaico permaneço doido e lírico
em tudo mais que me negasse
flor de lótus flor de cactos flor de
lírios
ou mesmo sexo sendo flor ou faca fosse
Hilda Hilst quando então se me amasse
ardendo em nós salgado mar
e Olga risse
pulsando em nós flechas de fogo
se existisse
por onde quer que eu te cantasse ou Amavisse
eu te desejo flores lírios brancos
margaridas girassóis rosas vermelhas
e tudo quanto pétala
asas estrelas borboletas
alecrim bem-me-quer e alfazema
eu te desejo emblema
deste poema desvairado
com teu cheiro teu perfume
teu sabor teu suor tua doçura
e na mais santa loucura
declarar-te amor até os ossos
eu te desejo e posso :
palavrArte até a morte
enquanto a vida nos procura
Artur Gomes
Juras Secretas
Editora Penalux – 2018
Uma educação pela pedra: por lições;
para aprender da pedra, frequentá-la;
captar sua voz inenfática, impessoal
(pela de dicção ela começa as aulas).
A lição de moral, sua resistência fria
ao que flui e a fluir, a ser maleada;
a de poética, sua carnadura concreta;
a de economia, seu adensar-se compacta:
lições da pedra (de fora para dentro,
cartilha muda), para quem soletrá-la.
Outra educação pela pedra: no Sertão
(de dentro para fora, e pré-didática).
No Sertão a pedra não sabe lecionar,
e se lecionasse, não ensinaria nada;
lá não se aprende a pedra: lá a pedra,
uma pedra de nascença, entranha a alma.
João
Cabral de Melo Neto
Publicado no livro A educação pela pedra (1966).
A escrita
A folha de pele alva
cativa-me...
embriaga-me...
penetra-me n'alma.
Pego de um lápis, se por
agora,
a fim de acariciá-la,
dentro de uma simbiose
liamada de prazer.
Sinto frio, calor, suo
demasiadamente
vendo cada sílaba ser
contorneada.
Orgasmos literários vão e
vêm...
Como quem morre, escrevo
versos.
Caio Valeriote
A FOGUEIRA
Em dezembro, sonhar com
janeiro,
em janeiro pensar:
fevereiro
vai ser bem diferente
A semana inteira chocar o
sábado,
no sábado, esperar o
domingo.
No domingo dizer: no
outro, quem sabe?
O tempo todo apoiar-se na
bengala
da ilusão, a preferir a
cegueira
à visão do abismo.
Cansei-me da farsa.
Fiz uma fogueira, joguei
a esperança dentro dela
e arregalei os olhos.
Astrid Cabral
O COISA RUIM
me querem manso
cordeiro
imaculado
sangrado
no festim dos canibais
me querem escravo
ordeiro
serviçal
salário apertado no bolso
cego mudo e boçal
me querem rato
acuado
rabo entre as pernas
medroso
um verme, pegajoso
mas eu sou osso
duro de roer
caroço
faca no pescoço
maremoto, tufão, furacão
mas eu sou cão
lato
mordo
arreganho os dentes
incito a revolta dos deuses
toco fogo na cidade
qual nero
devasto o lero lero
entro em campo
desempato
eu sou o que sangra
um poeta nato
Ademir Assunção
do livro Zona Branca (2001)
AGOSTO À CONTRAGOSTO
Posto que vasto é o tempo
E visto que nos é imposto
Viver só um tempo sucinto
Numa sina à contragosto
E a soma insana dos anos
Aos poucos sela um desgosto
No raso espaço do espelho
O tempo esculpe seu rosto
Tchello
d`Barros
Além
de mim
Quero
apenas
Além de mim, quero apenas
essa tranqüilidade de campos de flores
e este gesto impreciso
recompondo a infância.
Além
de mim
– e entre mim e meu deserto –
quero apenas silêncio,
cúmplice absoluto de meu verso,
tecendo a teia do vestígio
com cuidado de aranha.
Olga Savary
Eu
quando olho nos olhos
sei quando uma pessoa
está por dentro
ou está por fora
quem está por fora
não segura
um olhar que demora
de dentro de meu centro
este poema me olha
Ali
ali
só
ali
se
se alice
ali se visse
quanto alice viu
e não disse
se ali ali
se dissesse
quanta palavra
veio e não desce
ali
bem ali
dentro da alice
só alice
com alice
ali se parece
Paulo Leminski
Amanhã
meu corpo dói
se
não é de danças e de bênçãos
que
eu o cubro
Amanhã
as ondas devolvem
o
que sem sentir com o dentro
eu
mergulhei
Amanhã
o coração regurgita
onde
eu pisei
sem
caber todo o meu ser
Clara Baccarin
Amavisse
Como se te perdesse, assim te quero.
Como se não te visse (favas douradas
Sob um amarelo) assim te apreendo brusco
Inamovível, e te respiro inteiro
Um arco-íris de ar em águas profundas.
Como se tudo o mais me permitisses,
A mim me fotografo nuns portões de ferro
Ocres, altos, e eu mesma diluída e mínima
No dissoluto de toda despedida.
Como se te perdesse nos trens, nas estações
Ou contornando um círculo de águas
Removente ave, assim te somo a mim:
De redes e de anseios inundada.
Hida Hilst
Ao teu
lado
toda a história do amor:
acordar ao teu lado
de bruços
a penugem das costas, em remoinho
(e esta ave nascida bem no meio das hastes
das duas pontas de faca
nas omoplatas
Mar Becker
Canção
Amiga
Eu preparo uma canção
em que minha mãe se reconheça,
todas as mães se reconheçam,
e que fale como dois olhos.
Caminho por uma rua
que passa em muitos países.
Se não me vêem, eu vejo
e saúdo velhos amigos.
Eu distribuo um segredo
como quem ama ou sorri.
No jeito mais natural
dois carinhos se procuram.
Minha vida, nossas vidas
formam um só diamante.
Aprendi novas palavras
e tornei outras mais belas.
Eu preparo uma canção
que faça acordar os homens
e adormecer as crianças.
Carlos
Drummond de Andrade
o negro do céu
abrilhanta a lua
ai, que frio!
em meus sonhos
o telefone toca
acordo.
a lua no céu
estrelas cintilam
oh, insônia
a lua sumiu
o céu escureceu
nada aconteceu
Cesar
Augusto de Carvalho
do livro Curto Circuito
Editora Patuá - 2019
www.editorapatua.com.br
cheguei ao céu
diz o pinheiro
eu sempre quis
mas
o meu lugar
é a raíz
Nenhum ser é plenamente voo
se não sabe da magia da terra
ou totalmente luz
se o escurecer lhe cega
Todo horizonte é terrível
se o voo nega
o passo elementar
Logo sigo quase pássaro
Hamilton Faria
Poemas da janela
DA
INCAPACIDADE DE SENTIR LUTO
amas parasita, diz e diz, não hesita:
o amor, errante, além de tudo cego
feito um imenso morcego negro
que, imerso em trevas, só vê o ego
ouves senão por apupos meigos
inflação económica de si mesmo
insuflada por espelhos vesgos
e promessas de paraísos temos
no vazio de si inflas de ilusão
e epifania um Pai de aluvião
que cadencie carnificina e gozo
o ego cego que tem por coração
blindado e oco veloz do ai se esvazia
veloz esqueces crimes e imune à punição
desobrigas-te de tudo
e até do luto
Ademir
Demarchi
FAVELA
Meio-dia.
O morro coxo cochila.
O sol resvala devagarzinho pela rua
torcida como uma costela.
Aquela casa de janelas com dor-de-dente
amarrou um coqueiro do lado.
Um pé de meia faz exercícios no arame.
Vizinha da frente grita no quintal:
— João! Ó João!
Bananeira botou as tetas do lado de fora.
Mamoeiros estão de papo inchado.
Negra acocorou-se a um canto do terreiro.
Pôs as galinhas em escândalo.
Lá embaixo
passa um trem de subúrbio riscando fumaça.
À porta da venda
negro bocejou como um túnel.
Raul
Bop
Flor dos
Santos
Santa Bárbara que nos livra do corisco.
São Bento que cura mordida de cobra,
São Gonçalo casador.
São Jorge que me cedeu o seu nome
pra meu pai me batizar,
que escolheu o seu dia
pra eu chegar nesse mundo,
que só não me deu seu cavalo
porque o pobre do bichinho
não podia descer da lua!
Pulei tanta tacha de engenho,
passei tanta correnteza,
conheci tanto perau fundo!
E você, meu anjo da guarda,
nunca me disse seu nome,
pra eu fazer um poeminha pra você!
Jorge de
Lima
Let's
Play That
quando eu nasci
um anjo louco muito louco
veio ler a minha mão
não era um anjo barroco
era um anjo muito louco, torto
com asas de avião
eis que esse anjo me disse
apertando minha mão
com um sorriso entre dentes
vai bicho desafinar
o coro dos contentes
vai bicho desafinar
o coro dos contentes
let's play that
Torquato Neto
Memória
Em meu dedo
o teu dedal
(tento, mãe
costurar tua memória
prender-te ao que me resta)
Incertos pontos
que a vista embaçada
não deixa urdir
Dalila Teles Veras
NA GARGANTA
Se
me perguntares outra vez porque escrevo
gritarei
contigo todo o meu poema reduzido:
Escrevo
porque preciso
–
tenho a alma entalada na garganta
e
um coração refém dos meus ouvidos
isso
é tudo.
Nic
Cardeal
NÃO HÁ VAGAS
O preço do feijão
não cabe no poema.
O preço do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone a sonegação
do leite da carne do açúcar
do pão
O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.
Como não cabe no poema
o operário que esmerila
seu dia de aço e carvão
nas oficinas escuras
— porque o poema, senhores,
está fechado:
“não há vagas”
Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço
O poema, senhores,
não fede
nem cheira
Ferreira
Gullar
Antologia Poética
O
Bicho
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
Manuel
Bandeira
O mundo que eu venci deu-me um Amor
O mundo que eu venci
deu-me um amor,
Um troféu perigoso, este cavalo
Carregado de infantes couraçados.
O mundo que venci
deu-me um amor
Alado galopando em céus irados,
Por cima de qualquer muro de credo.
Por cima de qualquer fosso de sexo.
O mundo que venci
deu-me um amor
Amor feito de insulto e pranto e riso,
Amor que força as portas dos infernos,
Amor que galga o cume ao paraíso.
Amor que dorme e
treme. Que desperta
E torna contra mim, e me devora
E me rumina em cantos de vitória...
Mário Faustino
PARA UM
NEGRO
para
um negro
a cor da pele
é uma sombra
muitas vezes mais forte
que um soco.
para um negro
a cor da pele
é uma faca
que atinge
muito mais em cheio
o coração.
Adão Ventura
POEMA DO
AVESSO
O que há em
mim
é a lenta
preparação
do que há em
ti
sombra
segada
sangrada
e
sagrada
até
nos olhos
dos meninos
que nasceram
sem
olhos
vidência
única
(vide o
verso)
visão
múltipla
(vede o
anverso)
e tudo que
está do outro lado
do espelho.
Rubens Jardim
PONTA
DAS ASAS
e
se me fico assim
nessa espera doída de um abraço seu
dos que me acalentam
à borda do furacão
ou nessa angústia covarde
de que a ponta dos ossos de suas asas
arranhem minha alma já avariada
neste
aguardo ansioso de sua língua fervente
a lamber meu corpo a me acalmar o sono
ou o medo pavor de que o bifurcado escaldante
queime arranque minha pele
e
se me fico assim
com essas esperanças cegas
a me preparar para o pulo
Claudinei
Vieira
TANTO
ÓDIO, CARLOS
o mundo é grande
e tem extremos
tem estrelas e tem estrume
tem perfume e tem veneno
tem dias que a gente ama
tem dias que a gente briga
mundo mundo vasto mundo
mundo malo mundo bueno
não me chamo raimundo
mas algo estranho me intriga
como cabe tanto ódio
num caráter tão pequeno
Ademir
Assunção
Risca Faca – São Paulo
Selo Demônio Negro
2021
um uivo
ah, essa coisa de fazer poesia
e trazer tantos lobos para fora do covil
e lobas, todas no cio,
e tantos e tantos vazios
ah, essa coisa vã que é fazer poesia
e que não fala, uiva
e chora e sangra
estrangeira e nativa
numa ilha igual a todas as outras ilhas…
ah, essa coisa inútil que é fazer poesia
e ser um desnudamento tão íntimo
que de tão íntimo desnudamento
é igual em todos os falantes
ah, coisa inevitável
que é fazer poesia
Carolina Rieger
Biografia do livro
Acariciar-te nervura de planta
nádegas de lisura com inscrições
de longes Jerusalens
dobras e alças em esconso
de fósseis e sabedorias
abro-te para apalpar-te
de pálpebras despertas fecho-te
para te possuir fetiche de neutralidade
se é que se mostra o que se decide
Se és livro me deixas além
me purificas das fezes
em que me mantinha a ignorância
abro tuas pálpebras com gana de amante
com o gozo da fertilidade
que só tu guardas no limite
de finas superfícies desdobráveis
Salomão Sousa
Colheita
Colha-me logo.
Colha-me, pois
sou um pano leve
que voa entre os pássaros
de longas asas coloridas
sem tempo e sem retorno.
Colha-me e prove-me
enquanto há clarões vermelhos
se estendendo nas varandas das casas
enquanto suas mãos
possam me alcançar.
Celso de Alencar
2.
um dia de
manhã sentei naquele chão
tão preto
tão morto
fechei os
olhos garrada em seu sangue seco
e pensei em quem seria
quem foi
ele os invisíveis
abri
como uma refugiada de guerra
uma vaca magra na fila do abate
Nina Rizzi
RES
(Fragmento)
Lo real
con sus dos mil círculos
concéntricos
sus formas de agua
su gula de caos
desde la nada
lo real
corre(en)ti
es tu líquida morada
Lo real
con su aire espeso
sus sobras (pliegues) del cuerpo
lo incestuosolo injertado
a tiros de quema-ropa
lo real te provoca
te enfurece
Lo real
con su insecto de luz
se abre en piedra
con su faro nos conducecon
su furia nos enreda
Lo real - ¿crees? -
res
ist
e
Herbert
Emanuel
"anti-humano"
anti-homem-primeiro de abril,
homem cano, homem-milícia,
homem dano, homem-perícia,
homem ufano, homem-sevícia,
homem tirano, homem-polícia,
homem insano, homem-notícia,
homem engano, homem-malícia,
homem garrano, homem-inscícia,
homem profano, homem-icterícia,
homem miliciano, homem-puerícia,
homem palaciano, homem-sordícia,
homem inumano, homem-espurcícia,
homem americano, homem-imundícia,
homem antiafricano, homem-iniquícia,
peixes verdes, azuis e amarelos,
indóceis e insipientes, através
da névoa entoam seu nome:
homem psicopata, homem-arminha,
homem-aparência, homem-catástrofe.
esse anti-homem, armado
até os dentes, esvazia
qualquer poema.
*
by Ziul Serip, in "Olhar de Guernica"
[inédito]
imagem: "Guernica" (desenho) by Pablo
Picasso (1881/1973).
QUE PAÍS É ESTE?
Fragmento
Universidade Livre de Alvito
(Afonso Romano de Sant'Anna)
1
Uma coisa é um país,
outra um ajuntamento.
Uma coisa é um país,
outra um regimento.
Uma coisa é um país,
outra o confinamento.
Mas já soube datas, guerras, estátuas
usei caderno “Avante”
— e desfilei de tênis para o ditador.
Vinha de um “berço esplêndido” para
um “futuro radioso”
e éramos maiores em tudo
— discursando rios e pretensão.
Uma coisa é um país,
outra um fingimento.
Uma coisa é um país,
outra um monumento.
Uma coisa é um país,
outra o aviltamento.
Deveria derribar aflitos mapas sobre
a praça
em busca da especiosa raiz? ou
deveria
parar de ler jornais
e ler anais
como anal
animal
hiena patética
na merda nacional?
Ou deveria, enfim, jejuar na Torre do
Tombo
comendo o que as traças descomem
procurando
o Quinto Império, o primeiro
portulano, a viciosa visão do paraíso
que nos impeliu a errar aqui?
Subo, de joelhos, as escadas dos
arquivos
nacionais, como qualquer santo
barroco
a rebuscar
no mofo dos papiros, no bolor
das pias batismais, no bodum das
vestes reais
a ver o que se salvou com o tempo
e ao mesmo tempo
– nos trai
2
Há 500 anos caçamos índios e
operários,
há 500 anos queimamos árvores e
hereges,
há 500 anos estupramos livros e
mulheres,
há 500 anos sugamos negras e
aluguéis.
Há 500 anos dizemos:
que o futuro a Deus pertence,
que Deus nasceu na Bahia,
que São Jorge é que é guerreiro,
que do amanhã ninguém sabe,
que conosco ninguém pode,
que quem não pode sacode.
Há 500 anos somos pretos de alma
branca,
não somos nada violentos,
quem espera sempre alcança
e quem não chora não mama
ou quem tem padrinho vivo
não morre nunca pagão.
Há 500 anos propalamos:
este é o país do futuro,
antes tarde do que nunca,
mais vale quem Deus ajuda
e a Europa ainda se curva.
Há 500 anos
somos raposas verdes
colhendo uvas com os olhos,
semeamos promessa e vento
com tempestades na boca,
sonhamos a paz da Suécia
com suíças militares,
vendemos siris na estrada
e papagaios em Haia,
nada nada congemina:
a senzalamos casas-grandes
e sobradamos mocambos,
bebemos cachaça e brahma
joaquim silvério e derrama,
a polícia nos dispersa
e o futebol nos conclama,
cantamos salve-rainhas
e salve-se quem puder,
pois Jesus Cristo nos mata
num carnaval de mulatas.
Este é um país de síndicos em geral
este é um país de cínicos em geral
este é um país de civis e generais.
Este é o país do descontínuo
onde nada congemina
e somos índios perdidos
na eletrônica oficina
Nada nada congemina:
a mão leve do político
com nossa dura rotina,
o salário que nos come e
nossa sede canina,
e a esperança que emparedam
a nossa fé em ruína,
placidez desses santos
e a nossa dor peregrina,
e nesse mundo às avessas
– a cor da noite é obsclara
e a claridez, vespertina.
Curadoria: Artur Gomes
Fulinaíma MultiProjetos
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