Artur Gomes
vampiro goytacá
canibal
tupiniquim
poesia prosa
viagens metafóricas por realidades reinventadas
almoço quartetos
ouvindo hermetos
na ausência quântica
afogado em casa
nessa correnteza
de maresia rasa
para Eurídice Hespanhol
queremos saber mais como foi que os Portugueses
trucidaram os índios na confederação dos Tamoios. para isso devo seguir os
passos de Anchieta e me embrenhar pelo litoral. seguir as entranhas das
florestas é o que me resta. Cristina Bezerra cuidará do virtual.
Rúbia Querubim
Cidade VeraCidade
as vezes me inquieto e me pergunto: uma cidade só é uma cidade,
se de forma total e plena ela se concreta?
se conhecimento é o que liberta e indignação o que desperta, não
me espanto, entretanto Nilo Peçanha deve estar se perguntando:
"por onde andará minha biblioteca" ?
Federico
Baudelaire
vampiro goytacá
nesse país do zeus me livre
da calhordice de deputados e
senadores
que um escrivão já confessou
nesse congresso em bacanal
quem foi que o livro rasgou?
em ave-maria voz digo:
bendito meu pão
que o diabo amassou
no livro profano pergunto
:
por onde andará Macunaíma?
e me responde Fulinaíma
:
“ainda estou aqui
aqui ainda estou”
pá/lavra
a palavra fala
grita
canta irrita
encanta
quando a verdade
na cara
se levanta
irina me olhou
com dois olhos grandes
de jabuticaba
me avisa
:
e se não fosse apenas brisa
na prova dos nove alegria
sorriu
quando lhe convidei a dançar
na roda de poesia
Car Navalha Na Carne
quantas navalhas
na carne enterrei
quantas feridas já
sangrei
na pele nos nervos no osso
do boi só para ti
quantas lágrimas já chorei
quantas vezes mergulhei
n
o fosso fundo do poço
e ainda estou aqui?
ins/piração
bebo em fontes preciosas e viajo em pétalas/diamante onde a
lira muito mais que um sol brilhante cristalino é gema pura que descobri desde
menino os olhos verdes quase azul safira multi/cor da oxum/menina que decretou
o meu destino minha sina de poeta medieval e trovador
todos nós à meia noite
kabruncos lobisomens
lamparões ou serAfins
estrupícios garrutios
severinos querubins
amantes de uma cidade
nas ruas da solidão
querendo-a veracidade
com tudo que seja não
ser transmutado no sim
Canibal Tupiniquim
muito mais que SerAfins
todas nós somos Vampiras
numa página a gente transa
noutra página a gente pira
Rúbia Querubim
lanterna
lamparina
lampião
farol da barra
vela lamparão
cabra da peste
corisco
kabrunco
no olho do furacão
EU
tenho
muito mais que 25 mil palavras sem perguntas
mais que 25 mil perguntas sem respostas
eu tenho um presente às minhas custas
um futuro à minha frente
um passado às minhas costas
muito mais que um instante no meu cérebro
mutações em pré-juízo
judas o resto da cruz
jesus cristo cortador de cana
boi-pintadinho
Suor & Cio
Couro Cru & Carne Viva
SagaraNAgens Fulinaímicas
Juras Secretas
Pátria A(r)mada
O Poeta Enquanto Coisa
O Homem Com A Flor Na Boca
Itabapoana Pedra Pássaro Poema
e não é cena dela
muito mais que Além da Mesa Posta
escrevo para rasgar tudo de mim
não apenas o que você gosta
minhas hipotemusas
estão completamente libertinas/desvairadas
simplesmente desnudadas
com os Retalhos Imortais
do velho lobo Ponte Grande SerAfim
o Vampiro Goytacá Canibal Tupiniquim
santíssima trindade
brincando de zeus e vênus
plantei uma conchinha do mar no teu umbigo
- mora comigo - o amor nunca é de menos
transcende o sol e sua luz
atravessa o litoral da santa cruz
afrodite me atirou na tempestade
quando subi a pedra do arpoador
para o salto no abismo
a flor de cactos feriu meus olhos
ali sangrei – matei a morte
a santíssima trindade
me deu o norte para ainda estar aqui.
Simone Bacelar - Como você imagina que os leitores irão se conectar com o personagem principal de "Vampiro Goytacá"? Há elementos específicos na cultura Goytacá que você acha que serão especialmente ressonantes ou intrigantes para o público?Artur Gomes – Apesar de ser Goytacá o vampiro é um andarilho que anda os telhados do presídio Federal de Brazilírica, um observador atento do que se passa pelos bastidores dos palácios. Acredito que ele tenha nascido em 2000 em alguma passagem do livro BraziLírica Pereira : A Traição Das Metáforas
Simone Bacelar - Quais são os desafios e as recompensas de
escrever um livro que mistura elementos sobrenaturais com uma rica herança
cultural como a dos Goytacás? Como você equilibra o respeito pela história e as
lendas dessa cultura com a liberdade criativa necessária para desenvolver a
narrativa?
Artur Gomes – Os desafios são muitos, e
enormes, já as recompensas não posso
prever se virão. Tentei algumas narrativas provocativas
deixando a interpretação por conta de cada um. Não sei como o leitor campista, irá recebê-las
ou digerí-las , mas esta nem é a meu ver a grande questão, a questão é provocar esse choque, sonhar tirar a cultura Goytacá da sua estagnação espacial
e levá-la a outras plagas, erguê-la acima da planície para que outros ou mais olhos
possam lê-la, já que não foi escrita pelos “historiadores oficiais”, graças a
deus sim senhor. É poesia e ficção, não existe
compromisso com a “história”, mas com a criação.
Fernando
Rossi - Como foi pensado a construção do "Vampiro Goytacá"?
Artur Gomes – Foi sendo criada aos poucos,
no correr dos anos, a partir do que cada personagem viveu e escreveu a partir
do momento em que foram criados. Eles não nasceram no Vampiro Goytacá, já
estavam presentes em livros anteriores. E a ideia de “Vampiro” me surgiu de
estalo, num período em 2023 em que fiquei hospedado no Hotel Amazonas,
observando aquelas paredes e corredores, aqueles muros, colocando a pele os
poros em contato com o cheiro do pátio. Ah! Quantos mistérios, quantas estórias que
não foram contadas, quantos fantasmas e lobisomens ainda habitam aqueles
telhados?
Fernando Rossi - Onde termina a ficção e
fica a realidade nessa obra?
Artur Gomes – A ficção começa a partir do
fato de que cada personagem tem suas viagens, suas narrativas, suas vivências
detalhadas por vários “campos” do planeta terra, não são campistas, e nem em
Campos dos Goytacazes moram, são seres andantes, viajantes no tempo e no
espaço, mas acredito que não findam aqui
, o livro é uma obra inacabada, e as realidades nele são realidades absurdas
e reinventadas.
Dinovaldo Gillioli - Quando
venta a poesia na sua cachola de pólvora, que fogo anuncia?
Artur Gomes – O fogo é de Iansã é vento de
tempestades, relâmpagos coriscos e trovões, todos os meus personagens femininos
tem um pouco dessa ventania da não definição em suas sexualidades, não só os
femininos mas alguns masculinos também, acredito que a poética neles nasce daí,
do desejo de matar a fome comendo o que estiver ao alcance de suas mãos.
Dinovaldo Gillioli - Das palavras que ficam, das que somem, o que
mais te provoca lobisomem?
Artur Gomes – Acredito que em cada um de nós
poetas, tem um pouco de vampiro um pouco de lobisomem e as palavras que ficam
são exatamente aquelas, que no momento exato flui do homem e sua hora e as que
somem são exatamente aquelas que tem mesmo que ir embora.
Tanussi Cardoso - Em sua obra, há uma carga estreita entre sua
vida e sua poética. Questões como a linguagem, o ofício do poeta e, igualmente,
os grandes desafios cotidianos, incluindo a amorosidade carnal e espiritual,
tudo isso, num verdadeiro comprometimento com o mundo que nos cerca. A sua
poesia – para quem acompanha sua obra – tem voz própria, única, reconhecida à
primeira leitura. De que modo você pensa a coisa ética na produção de um
artista?
Artur Gomes – Creio que todas essas questões colocadas
acima foram aos poucos me dando a consciência do que é um ser poeta, artista,
um ser dedicado a criação de linguagens
e os desafios do cotidiano que nunca foram poucos. Se eu fosse pensar em ética,
talvez não escreveria metade do que tenho escrito ao longo desses 52 anos de
produção poética. Me preocupa mais a experimentação, o processo criativo para
chegar na finalização de uma escrita, seja ela prosa ou verso. Talvez meus
personagens nem tenham ética mesmo, pois se tivessem não satisfariam os meus
desejos da forma que podem e querem.
Tanussi Cardoso - Você, além de um poeta exponencial, é um
grande produtor e agitador cultural, desde o final dos anos 70. Qual a
importância dos eventos e movimentos culturais, na produção brasileira atual?
Artur Gomes – A partir da minha entrada para o Teatro em
1975, comecei a perceber a diferença como um público percebe o texto lido, e o
texto falado. E aí entendi que a poesia muitas vezes precisa da fala para ser
melhor sentida por quem ouve, que vai muito
além do que é entendido por quem lê. E aí entra também a questão da
falta de incentivo a leitura, para a maior parte da população do planeta terra.
E os Saraus, as Balbúrdias são fundamentais a meu ver para tentar preencher esses vazios, essas
lacunas.
Tanussi Cardoso - Em que momento ou circunstância você se deu conta da poesia possível em
você? Ou seja: de onde vem e como nasceu o Artur poeta?
Artur Gomes – Artur Gomes o ser humano, nasceu em uma madrugada do dia 27 de agosto
de 1948 na Fazenda Santa Maria de Cacomanga, começou a ter contato com poesia na tipografia da Escola Técnica de Campos em 1961 onde estudoo no Ginásio
Industrial até o ano de 1964 . E começou a escrever poesia na mesma Tipografia em
1968 da então Escola Técnica Federal de Campos e partir de 1973 começou a
publicar.
Mas acredito que o Artur Gomes poeta nasceu pra
valer a partir de 1983 quando comecei a ter contato com a poesia dos grandes
mestres da poética universal, com a criação do projeto: Mostra Visual De Poesia Brasileira. E a
partir daí veio em 1985 o livro Suor & Cio, a focar todas as
questões que envolvem os relacionamentos
humanos dentro da sociedade onde vivem.
Tanussi
Cardoso - Para você a literatura, ou a arte em geral,
exige algum papel social de seu criador? Se positivo, qual seria o papel social
do artista, principalmente, o do artista brasileiro?
Artur Gomes – Acredito que sim. Porque toda arte e a poesia
também é, tem seus princípios e fundamentos. E o homem como me disse certa vez
o Padre Olímpio, é um ser social/político/religioso, e sendo
um artista não pode se eximir dessa condição. Agora no Brasil, essa talvez seja
a questão mais complexa para quem tenta viver de sua arte, porque aí começa a
surgir por exemplo, os valores dos mercados da arte, a não aceitação de um grande público
consumidor, e isso acaba levando a maioria do artista brasileiro, a seguir por
caminhos que menos conflitem a sua arte, seja música, poesia, teatro, artes
plásticas, cinema, com as condições impostas pelos donos do mercado.
Tanussi Cardoso - Como você vê a poesia brasileira contemporânea?
Artur Gomes – Vejo com uma
diversidade nunca antes vista e uma expansão imensa na quantidade de poetas que
surgem em todos os cantos e recantos do país, e do planeta, produzindo uma
poética de altíssima voltagem. E muitos deles utilizando-se dos recursos
tecnológicos que tem em mãos, com
sensibilidade e inteligência.
Eugênia Henriques - Irina, esse ser meio apaixonante... Irina
existe mesmo ou é um lindo nome propício a uma rima ?
Artur Gomes – Irina não é assim tão santa como uma bela rima
. Irina é ficção de uma
paixão platônica pela palavra que lhe dá o nome
como um bom prato que a gente come para saciar a fome. Acho que ela deve existir sim no inconsciente coletivo personagem que é um ser vivo para muito além
das mortes. Certas palavras me vem assim num sopro ao sabor do vento nas minhas
viagens metafóricas.
Eugênia Henriques - O Vampiro Goytacá Canibal Tupiniquim é médium? Exótico é o coração do Vampiro Goytacá: ora povoado de musas ora cravando os dentes em alguma carne insensível. Como pode, no coração dele, coabitar lirismo e atrocidade?
Artur Gomes – Acredito sim, que em todo ser humano cabe
um pouquinho de mediunidade, ou uma multiplicidade de Eus, que nos possibilita
a metamorfose das personalidades que extravasamos de acordo com o nosso
instante no “estado de poesia”. O Vampiro Goytacá Canibal Tupiniquim, no
livro não é um. São 12 personas em seus
estados brutos de lirismo ou em seus momentos de amores traídos e não
concretizados como tudo o que não fizeram em seus encontros marcados.
Carmen Moreno
- O poema “Meu santo dai-me” revela a poesia, e a arte em geral, como um
remédio. As diferentes linguagens artísticas, tão bem integradas na sua
criação, curam sua alma e seu corpo? Curam o Vampiro?
Artur
Gomes – Meu corpo e minha alma sim. Mas
se curam o Vampiro Goytacá ainda não sei, porque ele continua atravessando os
telhados do presídio Federal de Brazilírica para provocar suas balbúrdias diante
do estado de coisas em que nos encontramos. E talvez seja esse fogo, essa febre
ardente como água quente que o faça assim em vários multifacetado.
Carmen Moreno
- Neste livro, que reafirma seu perfil autoral, o inconsciente flui de forma
generosa, agrupando palavras em metáforas originais e dinâmicas. Há, inclusive,
muitas referências a autores e leituras diversas. Como funciona seu processo de
seleção, ou “organização”, para o formato de texto, desse fluxo farto do
seu inconsciente criador?
Artur
Gomes – O meu processo de criação não é
muito organizado não. Só a partir de alguns poemas, textos, narrativas
escritas, que vou entendendo com mais clareza qual o personagem, de quem é a
v0z autora desse poema ou dessa narrativa, ai é que penso como organizar em
livro a sequência do seu repertório. Como já afirmei várias vezes, não planejo
muito as coisas, deixo que elas fluam e ocupem
o espaço branco da página, para que eu possa refletir o que fazer com
elas.
Carmen Moreno
- O livro é permeado por uma atmosfera de humor e leveza, mesmo quando o teor
do poema/ texto retrata um fato mais denso. O humor também é sua marca na vida?
Artur
Gomes – Acho que sim, o humor deve ter sido herdado de Oswald de Andrade e o
teatro apesar de ser arte dramática, foi o que me ajudou a ser bem humorado,
muitas vezes irônico e sarcástico até. Aprendi a contornar os dramas da vida
real com a fantasia das metáforas, as figuras de linguagens do meta/poema/meta.
Uma forma que encontrei de rir do trágico sem fazer tragicomédia.
Antônio
Cunha - Amigo Artur, o Vampiro Goytacá é
o nosso Canibal Tupiniquim. Quem é, quem são ou o que são os Bispos Sardinha da
vez?
Artur
Gomes – Acho que são vários espalhados
pelos telhados dos presídios brazilíricos. Os fantasmas que precisam ser
trucidados urgentemente para que o país volte a ser um país. E que talvez, país
mesmo de fato nunca tenha sido.
Antônio
Cunha - A poesia não pode acomodar. Na
sua, a palavra arde. Esta é a meta e o alvo?
Artur
Gomes – O alvo são os olhos dos
distraídos e acomodados, os que poderiam e podem fazer alguma coisa para que
essa cruel realidades das coisas que vivemos no Brasil fosse mudada, mas pelo
contrário só contribuem para que a realidade continue e se perpetue mais cruel
ainda. Mais que nunca é preciso “desafinar o coro dos contenters”
Antônio
Cunha - Você é um poetator. Há algo na
poesia que só a palavra dita alcança para além da palavra escrita e vice-versa?
Artur
Gomes – Sem dúvida acredito, porque
testemunho os resultados de tudo o que escrevo quando é lido, e quando é por
mim interpretado, dito, falado. Por isso uma das coisas que contribuíram a me levar para o teatro foi querer aprender
a falar poesia. Em 1975, tinha 3 livros já publicados, e me incomodava não
saber o que os leitores achavam quando liam, que sensações ou impressões
tiveram do que leram. Daí a partir do teatro, comecei a ter essas respostas. o
furor que a poesia falada pode provocar em quem ouve.
Jiddu
Saldanha - irmão, meu mestre
Artur Gomes. Viajamos por muitos lugares, com vivências que me fazem chorar porque só quem viu viu, só
quem viveu viveu...
Simplesmente
LINDRO! como você conseguiu tornar a poesia uma causa de vida, durante
toda uma vida?
Artur Gomes – Acho que a própria vida vivida foi me levando a
fazer da poesia o meu ofício, a minha forma de viver e me relacionar com as
pessoas mais próximas, ou até mesmo as mais distantes mas que de alguma forma
tenha tido a felicidade de me contactar com elas. Só através da poesia consigo
dizer o que é mais fundo, mais profundo em mim. Isso foi um processo de
aprendizado, não nasceu de uma hora para outra.
Muitas circunstâncias fatos, amores
vividos, amores perdidos, vitórias e fracassos, cada um desses acontecimentos
acredito que foram sedimentando um caminho para que eu pudesse me compreender
melhor e entender todo o sentido do que seja nossa vida aqui nesse planeta
terra.
Antes que alguém
morra escrevo prevendo a morte
arriscando a vida antes que seja tarde e que a língua da minha boca não cubra
mais tua ferida.
Cesar Augusto de Carvalho - No subtítulo, “poesia muito prosa” você já anuncia que seus poemas o aproximarão mais da prosa poética do que aos padrões formais de versificação. Por quê, exatamente nesse, Vampiro Goytacá, você optou pela, como gosto de chamar, proesia?
Artur Gomes – Em livro anteriores, eu já experimentava
narrativas em prosa, mas de uma forma tímida, cautelosa, nesse como percebi que
em algumas narrativas os personagens, não teriam condições de escrever com o
rigor que o poema exige, em verso, resolvi ampliar o leque da escrita em “proesia”
mesmo.
Cesar Augusto de
Carvalho - Em seus livros anteriores
há inúmeras referências à obra uilconiana. Aliás, um deles leva o sobrenome de
Uilcon no título, o BrazyLírica Pereira. Neste Vampiro você cita figuras de
linguagem criadas pelo Uilcon Pereira como, por exemplo, Assombradado, Biute e
outras referências mais. Sinto, como leitor, que a influência de Uilcon em seu
estilo vai além das referências. Minhas suspeitas têm algum fundamento?
Artur Gomes – Sim, ninguém melhor que você para testemunhar isso. Uilcon foi e continua sendo um grande guru, mestre, de muitos escritores que tiveram a felicidade de conviver com ele, e se enriquecer com a literatura criativa que dele conseguimos extrair. Convivi com Uilcon de 1983 a 1996, pessoalmente nos grandes encontroes, promovido pelo Gabriel de La Puente(nossa Ponte Grande), e na farta correspondência que trocamos por todo esses 13 anos. Meu livro Suor & Cio de 1985, tem prefácio assinado por ele.
Erorci Santana escreveu uma bela
resenha sobre o BraziLírica Pereira : A Traição das Metáforas também tocando
nesse assunto das referências. Nesse Vampiro Goytacá, eu crio a partir de
Assombradado e todos os personagens os serAfins que são derivações “biúticas”
mesmo, sem nenhuma vergonha de ser.
tem pessoas que ainda
gostam de fantasias ilusões ideias que não cultivo mais a pedra pólen inda me
guia quando admiro céus sóis estrelas luas cheias vez em quando pedalo até a
praia a procura de ouvir o canto da sereia à beira mar yemanjá continuo caminhando nesse chão que nos espera
poesia além da morte bem pra lá dos girassóis para encontrar nas pradarias
a orelha de van gog e
seu instante em desespero não espero muito como alguém que do outro lado do
oceano me espera
o alvo do poeta é
a meta
nem todo poema curto
nem todo endereço acerto
a meta do poeta é o alvo
o alvo do poeta é a meta
a flecha estendida no arco
o arco estendido na seta
eu quero teus olhos de vidro
não poema em linha reta
nem toda cidade prova
nem todo poema povo
a clara da gema nova
pode estar dentro do ovo
a massa e o biscoito fino
o biscoito fino pra massa
no Dia D da fornalha
acendo a fogueira na praça
amazônica
tuas digitais tatuarei
em minha pele
sem segredo
que o secreto me foi
roubado
na missa do sétimo dia
me profanou
o mais que sagrado
pano de chão pra poesia
não vendo ilusões
diante
da miséria
que
assassina corações
Oswaldo de Andrade.
Nunca fomos colonizados, fizemos foi Balbúrdia
anti-colonial.
Sady Bianchin
Ou a gente se Raoni
Ou a gente se Sting
Luis Turiba
uma cidade sem memória não é uma cidade
Federico Baudelaire
Campos precisa acordar para voltar a ser
Rúbia
Querubim
tocar-te por dentro lentamente calmamente como quem
morde a maçã na boca da serpente e uiva mastigando a
carne como sobremesa
Artur
Kabrunco
o gosto da tua carne
não conheço não me deste o endereço
Federika Bezerra
transverso anjo avessso
atravesso as artérias da cidade águas do paraíba emporcalhadas de esgotos
Irina Serafina
como poesia devoro para
matar a fome quando oro o prazer tem outro nome
Artur Gomes
absinto impossível te sentir mais do que já sinto
Pastor
de Andrade
cidade veraCidade nossas
angústias penduradas nos varais
Federika Lispector
viva a lira do delírio antropofágica paulistana metendo a língua desbragada nos bordéis de copacabana
Lady Gumes
o delírio é a lira do poeta se o poeta não delira sua lira não concreta Artur Fulinaíma
desde
os tempos de moleque para descascar carne de manga faca facão canivete arma
branca de pivete nos quintais da cacomanga
EuGênio Mallarmè
não tenho
papas na língua nem pastor me come as
coxas eu sou do mar da tempestade beira mar é quem lambe
as minhas ostras
Gigi Mocidade
Artur
Kabrunco e suas metáforas vagabas me enclausuraram entre os corredores do
presídio federal de brazilírica perdi a lírica nem sei o que estou fazendo por
aqui - enlouqueci
Macabea – A Outra
Por Onde Andará Macunaíma?
no poema na metáfora
no palco no livro
na tela do cinema
no Acre na Amazônia
em Minas Bahia Pernambuco
Pará Sergipe Piauí
Rio de Janeiro Espírito Santo
Macuaíma está em todo canto
Paraná Santa Catarina
até nas mais remotas
matas virgens do Xingu
ou nas águas frias
do Rio Grande do Sul
ou nas termas quentes
do Rio Grande do Norte
Macunaíma vento forte
se misturou nas maravilhas
e também nas sutilezas
divina preguiça da beleza
das terras do bem virá
comeu o pão que o diabo amassou
quando se transmutou por São Paulo
no trampo do caos urbano
quase desapareceu do país
mas como um bom feiticeiro
seu pai não se enganou
te fez tornar-se encantado
para que o povo então entendesse
as profundezas do teu significado
Eva já subiu a serra de Pacaraima? já viu o sol nascer na terra de makunaima? já beijou a pedra marco zero de Roraima? Piamã disse que não, mas Irina já experimentou o experimental de Wally Salomão
de onde estou em Itabira eu te pergunto Nilson Siqueira por
onde andará Macunaíma? Eva não soube me
responder se subiu serra do pacaraima ou beijou a pedra de muiraquitã, Cy a
rainha mãe mato continua desfilando na Portela – Paulo Victor que esteve por
algum tempo incorporando Macunaíma escafedeu-se tomou chá de sumiço com medo de
Piamã com o seu descompromisso - preguiça só quem pode ter mesmo é o próprio
Macunaíma. Já dizia Mário de Andrade em, seus delírios febris.
serAfim 1 - artur gomes
onde vais cinzia farina
vestida de quase nada
rasgaram as letras do teu corpo
despiram tua carne de fada
A inocência do mortos
para Adriano Moura
mesmo não tendo lido ouso dizê-lo: objeto direto - é substantivo - a inocência dos mortos espanta a ignorância dos vivos
para ademir assunção
um nome escrito no vento
não quero o sentido normal
da coisa como me aparenta
quero a realidade
exatamente como a gente
simplesmente inventa
nonada
ela me inspira me transpira me transborda estico a corda para alinhar o plumo no rumo certo do poema a seta no foco o poema em linha torta para entortar a linha reta
no concreto do abstrato
na
argamassa do concreto
sou
vampiro
bêbado de sangue
assassinei
os alpharrábios
para
inventar meu alphabeto
no lado esquerdo
do peito
o direito não conforta
nem comporta a estrada
que preciso
nu poema
a porta
que se abre
à procura do inciso
o barro de
alguns barracos continuam entranhados na carne com seus nomes tapera cacomanga cupim queimado
cambaíba ururaí olinda morro grande santa cruz quilombo lagamar guriri itapemirim
trago a poeira na sola dos sapatos lama nos meus pés e o sangue das pessoas trouxe impregnados na ferrugem das unhas carcomidas
no branco do papel deponho a faca a foice navalha canivete já fui moleque pivete das esquinas dos bordéis da rua do vieira paraíso perdido juazeiro coqueirinho nas mallarmargens da BR já fui do breque dos pandeiros das cuícas do couro cru na carne viva goytacá boy perdido na paulista roubei poemas do piva para vender nas
lanchonetes mar a vista em bertioga e o coisa ruim do ademir continua na ponta
da língua da memória quando criança brincava nos sonhos com cobras de pique esconde
no porão da casa onde aprendi a enxergar
clara/luz da escuridão quando seus
olhos de vidro viraram espelhos para os meus numa
madrugada 27 agosto 1948 datas também me acompanham desde que vi o
primeiro clarão diurno quando o trem passou para dores de macabu quando
estive na bolívia senti o cheiro de corumbá ali de perto em assunção do
paraguai porto viejo canavarro o barro vermelho no carnaval pelas fronteiras
cerveja com caldo de piranha a dona de um bordel no pantanal chamava os
jacarés com nomes de jogadores de futebol quando perdi o avião pra boa vista
tem noites
que a lua cheia me chega com sangue entre os dentes com aquele gosto de veneno
escorrido das serpentes tem dias que as serpentes me chegam com gosto de lua
cheia algum poema na veia vestido de ventania
a mulher
dos sonhos me deixou de quatro a ver navios com pavio aceso essa palavra
incendeia os poros pelos orifícios esse meu ofício de perfurar na carne o que
não cabe inverso nem por um segundo nem por um milímetro nesse acampamento
logo depois da febre como marimbondo provo o teu veneno
quem me vê
assim
tão comportado
não sabe
o que se passa
aqui no centro
não sabe do vulcão
em erupção
nesse serTão
do mato dentro
a traição das metáforas
para juliana stefani
dandara ainda mora naquela
beira de estrada com seu vestido amarelo no rio grande do sul mesmo
que não esteja ainda a vejo atravessando a calçada saindo do carro azul abrindo
o portão da casa de 7 portas douradas com mil garrafas de vinho psicografadas
na sala por algum poeta dos pampas que escreveu por aquelas rampas o que
testemunhou nos vinhedos quando italianos chegaram nas serras dos meus segredos
sou afro-tupi guarani goitacá
que subiu o paraíba para o litoral paulista nasci na cacomanga bicho do mato curupira
carrapato sou campista não tiro onda de turista sou retalhos imortais do serAfim
comigo é assim : nem fiado nem à vista
II
áfrica sim minha
mãe de sangue cresci mamando do teu leite lambendo o sal da tua carne quente bebendo
água suja no tanque sou fel pimenta azeite quem quiser que me aguente eu sou a
lama do mangue
metáforas em
linhas curvas
quando manhã
canta e não chove lucia me fala das coxas de yve mergulhadas no pontal até a
última sílaba do poema letras salgadas de mar embora mesmo que agora chova e a
noite seja um relâmpago de estrelas sinto que nos falta um vagalume para
alumiar a escuridão tantas vezes lamparina acesa no bar de neivaldo foram
lâmpadas florescentes entre olhos famintos de luz no verão de 2010
minha
escrita
grita
muitas
vezes
invento
palavras
soltas ao vento
a flor dos meus delírios
tem cheiro de poesia
relâmpagos de iansã incêndio no meio dia netuno em polvorosa me disse em verso
e prosa ela “que também gostava de
bichos” vem com o frescor da maresia e eu serei o seu ogum anjo da guarda e
companhia hoje mesmo distante essa preamar me incendeia ondas espermas/espumas
explodem na areia tempestades trovoadas ventania e nem sei se estando perto calmaria
estação 353
para cecília in memória
eu planto
minha estação existe
a adubagem orgânica está completa
não sou negacionista nem sou triste
sou poeta
irmão das coisas da alegria
eu sinto o gozo no tormento
atravesso noites e dias - invento
eu sei que planto
e o sistema é bruto
mas a terra gira como pomba gira
amora minha eterna namorada
e amanhã eu sei colherei teus frutos
nessa minha estação amada
estava lendo antonio cícero
e antonio carlos secchin
e ai pensei - ler ler ler ler re-ler
não escrever - parece-me brincadeira
aprendizado para vida inteira
do mim dentro de mim
o Eu dentro do Eu
o Não dentro do Sim
metáfora 1
suspenso no ar às vezes penso se devo pensar tanto como um poema de mayakówski
ela um dia virá ao meu encontro e ressuscitará o poema que ontem não nasceu a
vida não é só flores ela me disse clarice em cada coisa tem o instante em que
ela é as vezes também penso ela não virá aí vou para praça jogar milho aos
pombos ao jardim zoológico dar comida aos patos os meus sapatos já conhecem os
anos de espera na última primavera os lírios não nasceram e as rosas eram só
espinhos com minha língua na faca cortei a fala ainda na garganta e fui pra
sala afiar o taco ela não sabe que o vinho que guardei pra ela é de uma safra especial de bacco
a menina da
lanchonete hoje rói as unhas de ira pira quando quero o que ela pensa que é apenas bolero na praça
são salvador com esse poema torto que te leva ao desconforto de pensar o que
não sinto como ela vive sozinha entre pastéis e empadas sua vida é hora marcada
de entrada e de saída não conhece uma outra vida por isso me olha estranha com
uma sede faminta de comer meus olhos com
palavras – quando te digo : não minta
hipotemusa 1
a menina da
lanchonete
em frente a
floricultura
são salvador
mexe na flor
dos cabelos
dedos entre
pelos
enquanto aguço
os olhos
pensando mar
de abrolhos
na terceira
margem do rio
leio um poema
no cio
grafitado em isopor
não sendo assim
que seja como for
hipotemusa 2
ela bagunça
meus 7 sentidos
aguça lambuza
planta um
punhado de brócolis
no pé do meu
ouvido
me dá de beber
mastruz com leite
de comer
esphirra koreana
lhe chamo de
sacana
ela me diz que
é bacana
me fazer de pé
de moleque
pra lamber meus sustenidos
hipotemusa 3
ela agora usa piercing no
nariz
sem medo de ser feliz
joga capoeira no mercado
aprendeu dançar suing
não dá mole pra racista
nem para patrão
que escraviza empregado
hipotemusa 4
essa garota me
alucina não sabe ficar quieta com santa teresa no parque das ruínas tem mais de
mil desejos um deles é quebrar meus óculos com sua fome de beijos tem mais de
mil ofícios um deles é mapear o litoral das minhas costas pelas praias de são francisco
essa garota é bárbara afrodite artemanha de iansã me banha com sua língua de vênus
as terças-feiras de manhã
hipotemusa 5
quero botar no seu orkut um negócio sem vergonha um poema descarado já
chegando fevereiro e meu rio de janeiro fica lindo mascarado
quero botar no seu e-mail um negócio por inteiro eu não sou zeca baleiro
pra ficar cantando a mama que ainda tem medo do papa
meu negócio é só com a mina que me trampa quando trapa meu negócio é só com a mina que me canta ouvindo rappa
hipotemusa 6
vou encontrá-la no rio psiu poético sentidos todos plural um tanto
cético nessa ponte para o nada - duvido que não exista alguma esperança nos
olhos de uma criança disse-me a hipotemusa no amarelinho da lapa antes de
atravessarmos para o ccjf com alguma poesia na manga do lado esquerdo do pulso rasgar
o verbo da fome e entregar a cara à tapa
hipotemusa 7
hoje acordei com
uma vontade da porra de trepar na goiabeira talvez assim quem sabe ela me chame
de jesus e tire ele da cruz
ou quem
sabe bacurau ou quem sabe bacuri para acabar com carkamanos
ou então
até quem sabe ela me chame de exu cabra da peste do nordeste koreano
hipotemusa 8
pode ser que
ela nem saiba o quanto o tanto o torto pode ser que ela me queira bem debaixo
do vestido e me chegue como sempre me rasgando a roupa me lambendo a boca sem
vergonha alguma e me pegue bem assim descabelado displicente distraído pra
querer mais uma poesia para entortar 7 sentidos
hipotemusa 9
ela me deu um beijo na
boca e me disse carne seca me interessa assada na brasa como sua língua quente salivando
entre meus dentes enquanto conto peixinhos na baia da guanabara na hora do gozo
pode cuspir na minha cara essa gosma de lesma na calçada pedra faca trinca
ferro na janela casa mal assombrada cosme velho coisinha de sal e o bruxo ainda escreve dentro dela
hipotemusa 10
quando alvoroçar os teus cabelos quero outras coisas alvoroçadas poros pelos entradas maria padilha pomba gira cigana presente na trilha de qualquer oxossi caçador beatriz sua filha de santo foi quem vi no espelho da minha mesa de búzios quando joguei para xangô
hipotemusa 11
fulinaimânica sagarânica
fulinaímica sagarínica
algumas vezes muito prosa
tantas vezes muito cínica
hipotemusa 12
foi em são carlos a última vez que fui encontrei alzira pira da pira de piracicaba incendiou minha carne devorou meu esqueleto o lance só acaba quando mergulhamos em são josé do rio preto era uma japinha que conheci em batatais depois da prova dos 9 deu adeus e nunca mais
hipotemusa 13
como ninfa estrangeira ontem me veio envolta de
plumas em estado de poesia na baia da guanabara estudava antropologia pelas
marinas do rio no sexo sempre quentinha feito uma gata selvagem gozando a vida
no cio vestida em pele de algas despida nos desvarios lambeu o mel entre as
coxas desapareceu no navio
hipotemusa 14
nem bem havia anoitecido no parque das ruínas teus olhos de lamparina tocaram a pedra do reino nas águas da guanabara coisa rara aquele peixe brilhante dentro daquela boca com seios de primavera e vinhos da santa ceia em tua língua muito louca
todo dia que
não amanhece
anoitece
quem nunca leu
sagaranagens
não pode dizer que me
conhece
anjo torto
quando nasci torquato neto
veio ler a minha mão
tinha chegado de teresina
com uma garrafa de cajuína
e um livro na outra mão
e eis o que o anjo me disse
apertando a minha mão
com um poema entre os dentes
vá bicho!
não tenha medo do inferno
seja poeta moderno
cheire as flores do mal
que a poesia de Baudelaire
vai te salvar no final
onde tudo é carnaval
minha
madrinha se chamava cecília nunca soube onde minha mãe a conheceu por muitos
anos morou na rua sacramento ao lado do colégio estadual nilo peçanha primeiro
endereço que conheci nesta cidade antes de estudar no colégio estadual xv de novembro de onde muitas vezes assisti
desfilar a mocidade louca ao lado do meu padrinho benedito que inventou deixa
que eu chuto meu guardião absoluto
entre
muros e paredes do presídio federal de brazilírica macabea foi jantada pelo
pastor de andrade no carnaval da mocidade tem memórias por lá adormecidas que
ninguém ousa contar a hipocrisia varreu
daquele território a rebeldia marca registrada de um tempo que não podemos
apagar trago nas nervuras entre a carne
e os ossos marcas de explosões da caldeira na tipografia das letras onde
tentaram me domesticar
mas sou
vampiro goytacá
endiabrado serAfim
sou canibal tupiniquim
afora em mim grafitemas nenhuma figuralidade frutas legumes verduras quem cala a fala consente houve um tempo que a dita/dura calou a fala da gente grafito em tua carne de pedra medusa de sete patas poema de sete cabeças miragens do amor que enlouqueça apóstolos na santa ceia miró brincando de circo com os olhos na lua cheia
o poeta é um
fingidor
chove aqui dentro
mais do que lá fora
eu tenho pressa
de olhar teus olhos
nesse mar de angra
o pau brasil ainda sangra
enquanto isso
ela passeia no egito
entre templos sagrados
dessas múmias quânticas
me perdoa
o poeta é um fingidor
mas eu não sou fernando pessoa
qual lamparina me ilumina
e por onde andará macunaíma?
sombras na parede as vezes me
invocam falas delírios outros nem precisa tapa na pantera muitas vezes uma dose
de conhac basta como quando editávamos o curta tropicalirismo jiddu me colocou
na mala da fama foquei lá e até hoje não achei outro endereço minha cama tem
colchão de palha e a tua tem lençóis que não conheço
quem diria
filho de lavrador
e mãe analfabeta
um dia no brasil
ser chamado de poeta
ainda existe uma mulher
que me lança chamas
que me distorce o crâneo
me disseca e me atraca
quando chego ao cais
com
esse barco em movimento
essa carcaça de lâminas e ossos
uma mulher que me estica o plumo
e
me satisfaz
me
enrola em desenredos
e me deixa arame farpado
a ponto de me sangrar os dedos
vampiro lobisomem
tenho
frequentado os telhados junto aos fantasmas da planície visitando os
territórios lamacentos da cidade em cambaíba por exemplo espreito os fornos
crematórios de um passado inda recente voltei aos braços dos desamparados
indigentes da contra mão os que foram trucidados por gritarem contra ditadura e
escravidão
do som dessa palavra
nasce uma
outra palavra
fulinaimicamente
no
improviso do repente
do som
dessa palavra
nasce uma
outra palavra
fulinaimicamente
no próximo dia seis vou me despir de vez rasgar os p(l)anos no próximo dia seis no parque desengano plantar amoras pedra bonita – metáforas para os olhos de quem não vê isa bela acha bonito tudo aquilo que não falo no próximo dia seis desmontar o circo no universo paralelo montar pirandello beckett ionesco artaud fernando arrabal no próximo dia seis vou me despir pro carnaval da irreal/idade botar fogo na cidade e nas fardas do imperador
resumo
ela tinha as mãos tão suaves que tocavam-se como quem tem a
pele sob a chuva de setembro eu procurava colher maçãs no horto de santa maria
madalena olhava a montanha e lembrava-me de quão selvagem
fui aos olhos dela enquanto ainda vivia na tapera o meu cavalo deixava
na porta da cidade escrevi sobre isso no poema quando o tempo rasgou meu corpo
na calçada e trouxe-me folhas de papel em branco.
serAfim 2 - rúbia querubim a desejada de
federico baudelaire
nos currais dos mares salgados
Federico pensou Iracema
com seus grandes vestidos folgados
como a grande ninfeta Iolanda
trajada em vestes de penas
nos bailes do império em Luanda
nas barras da sai da fama
ele então grafitou grumixama
palavra que ouviu numa cena
na língua da formosa dama
no teatro da rua ipanema
nos bordeís de copacabana
os cogumelos de Santa Cecília
nas barras incandescentes da cama
pornofônicas palavras fonemas
pitanga urucum colorau açucena
com os caldos da salsaparrilha
qualquer grande orgia é pequena
entre os dentes
trago uma língua afiada
carnavalha
para tudo que me valha
irina agora também é modelo dessas pinturas clássicas que a gente não sabe qual foi o pincel usado pelo pintor
no inverso
entre os lábios da tua boca
e as letras do teu inverso
além de tudo meu olho foca
meu olho toca meu olho vê
tudo aquilo que você não lê
quieta
aqui nessa solidão capixaba quantas vezes me vem em sonhos ou alucinações
contemporâneas tudo o que não fui eu não era a bruna beber muito menos débora
seco mas ele gostava até queria que fosse assim como um biúte me chamava de
vários nomes ao mesmo tempo aquela profusão de palavras como inseto em volta da
lâmpada e os cálices nos lençóis de algodão as vezes linho para atiçar nossa
luxúria com a contribuição da enel que nos deixava quase sempre no escuro na guarapari
do espírito santo uma noite ele passou o tempo todo lendo pagu no meu ouvido e
macabea não se conforma por ter sido deixada de lado nas artes cínicas do
presídio federal de brazilírica trafega com seus fantasmas pelos corredores
falando para o vento que entra pelos buracos das fechaduras
não conheço
mas é como
se conhecesse
disse-me ontem
a psicóloga
antes que
amanhecesse
depois de uma noite
de trégua
depois de passar a régua
na direção dos des/caminhos
os olhos da janela
me espreitam
enquanto devoro
este poema
salgado de luz e sol
sede
eu tenho sede de água
eu tenho sede de mar
girassol nos meus cabelos
espuma de sal esperma e pelos
por onde eu possa delirar
eu tenho sede de sexo
em noites claras de luar
se eu não beber teus olhos
não serei eu nem mais ninguém
quando beijar teus lábios
desço garganta mais além
quando tocar teu íntimo
onde o desejo é mais intenso
jura secreta não penso
bebo em teus seios também
a flor da tua pele
me provoca
me toca
e não sei o que fazer
me perco nas esquinas
do teu corpo
em noites de lua nova
como uma prova de física
que eu nunca soube resolver
espírito santo
guarapari aqui estou
aqui me encontro
em estado de espírito santo
nesse mar azul e branco
como as cores da portela
o rio já passou em minha vida
nas marés de um serafim
mar é o que me fica
como o deus que me habita
sem princípio meio ou fim
musa
que é musa
não tem vergonha de nada
escancara a cara no espelho
se desnuda pra fotografia
teu corpo camisa de vênus
a flor da pele irradia
rasgando a camisa de força
tua carne só poesia
fosse eu uma mulher de nuvens
não estaria aqui presa
a este mar nas marés suor ou cio
passaria com o vento
sem deixar rastros vestígios
pegadas
voaria sobre estradas
sem destino cais ou porto
viajar mesmo
sem nenhum conforto
ou calmaria nas partidas
e ventania nas chegadas
o belo me excita quando vem assim seminua não
importa o sexo gênero cor na imagem que me traga essa leveza de estar como
pluma levitando sobre o poder da gravidade não importa o nome ou o tipo de
sangue que circula pelas veias nem o sal do suor sem ver o nome escorrendo pela
pele enquanto aqui teço homenagem ao eros que me come
metáfora por metáfora
se ele pensa também penso mas não compenso carência de ninguém e vou além do outro lado do cerne tudo o que está dentro ou fora do corpo o que vai e vem na hora do sexo se não me agrada meto a faca corto metáfora por metáfora o músculo/pênis que nunca me deflora
poema de 7 patas
para pisar a amargura
e extirpar de vez
o pus dessa gangrena
não sou santa maria madalena
queremos saber mais como foi que os Portugueses trucidaram os índios na confederação dos Tamoios. para isso devo seguir os passos de Anchieta e me embrenhar pelo litoral. seguir as entranhas das florestas é o que me resta. Cristina Bezerra cuidará do virtual.
serAfim 3 - federico baudelaire o mestre sala dos mares
irina serafina
nem minha
nem tua
toda dela semi-nua
escrevo
como quem
pesca uma piaba
no rio ururaí
vou por aí
de itabirina
a iriri
se não cansar
cato conchinhas
de anchieta
a quipari
você ainda não conhece tudo que um dia bem-te-vi no pontal de atafona no
portal do imalaia ou na lagoa grussaí você está se aproveitando da nossa
situação e está de olho na minha mulher não vai colar porque gigi federika lady
rúbia eugênia agora é minha quem mora com ela em iriri do espírito santo sou eu
pode tirar seu cavalinho da chuva seu tempo de guarapari passou se não é
capixaba que se dane quero mais que o quiabo voz carregue porque sua banda de
reggae aqui não toca aqui não é freguesia do ó e você nem conhece quibe de
peixe pra ficar jogando isca no meu quintal de areia sua sereia já morreu faz
tempo o templo agora é outro pastor de andrade me deu a chave de entrada
só quem sabe do riscado
entende o seu ofício
procura palavra nua toda viva toda crua
o resto que se foda
quero toda palavra toda
toda bruta toda puta
na artimanha do concreto
no abstrato do ereto
no suor que vem da luta
para
rúbia querubim
a pétala
da flor deságua sobre a flor da tua pele nas águas salgadas desse mar nas
correntezas desse rio eu bebo tudo que revele cada gota dessa água na leveza do
teu cio sob os lençóis da tua cama acenderei os meus pavios
alfândega
em santa cruz de la sierra
o poema e o anjo torto
se beijam num copo de vodka
com pimenta boliviana
e traçam mayara doida cigana
que me deixou no desconforto
A
travessia no
inverso do meu tempo sem lenço sem documento janelas abertas ao vento
o
poema freudelérico
não tem nada de pessoa
na vitrola rola um
demônios da garoa
e o poema mete a língua
no avesso da linguagem
rasga os
tecidos da mortalha
assombrado com
o verbo desemprego
afia ainda
mais a carnavalha
com sua faca
de dois gumes
no descompasso do desassossego
eu sempre andei no encalço dos olhos de carolina na fantasia dos meus passos
tem confete/serpentina onde o profano e o sagrado em puerto viejo cavajarro se encontram em outro tom a
cigana boliviana com seus olhos de pimenta com suas pimentas nos olho me levou para lá sierra de santa cruz da bolívia onde se masca folhas de coca antes do coito das cinco sem chá e nem torrada e
cerveja muito menos o sexo ali é na porrada(verdade
não invento) com fogos de artifícios botando fogo em carnaval no serTão do
mato dentro
poética 43
a percepção acho que é um dom uma
descoberta um pássaro que pousa em nossa cabeça e nos atira aos fios elétricos
do corpo liberdade vem de dentro do motor dos músculos os ponteiros
que só se movem quando querem o repouso absoluto é uma forma de silêncio não
vejo muita graça em ser sozinho solidão as vezes faz bem noutras assusta mas se
tenho um amor que ainda não me diz abertamente do diamante que mora dentro dele
toco - a música dela tem itálias e
palavrões as vezes quando me pergunto onde vou nem sempre tenho respostas aliás respostas é o que menos
tenho encontrado para as 25 mil perguntas paradas no ar no além da amesa
posta o rascunho dos meus primeiros dias ficou esquecido numa tipografia do
tempo emoldurado na tinta que mudou de cor
pedra
dourada
amo a pedra
onde ela mora
estive lá
já vim embora
assim sozinho
mas é como se essa pedra
estivesse ainda em meu caminho
pérola dourada
houve
um tempo numa primavera passada conheci pérola dourada numa pedra onde o tempo agora é saudade por
toda pele grafia na minha íris/retina trouxe a pérola dourada na menina dos meus olhos olhando os olhos da menina em cada pedra que havia
drummundianas
no hotel amazonas - galvez o imperador do acre hospedou-se
em sua passagem por campos dos
goytacazes em direção a vitória do espírito santo e deixou por aqui o vampiro
goytacá que mora neste hotel até hoje e passa as madrugadas na janela do quarto
olhando o pátio interno tentando reencontrar o seu amor nina aroeira vestida de
benta pereira nos cavalos do imperador muitas vezes vi lágrimas descendo dos
seus olhos e as mãos apontadas para o telhado do outro lado do corredor
enquanto rezava para santo antônio se
espantou com alguns passos nos corredores da linda flor florlisbella
dos passos que ali mesmo conquistou
princesa morta
I
dorme a princesa encantada
no portal dos desenredos
na bruma das madrugadas
evoé - Eros meus dedos
tocando o vinho na língua
da saliva em tua boca
ó princesa adormecida
que vens na pele da pedra
quantos anos quantas Eras
tivemos nesse abandono
por estações de primaveras
sem chegadas só partidas
nas luas de tanta espera
nas marés das despedidas
na carne o sal das promessas
silêncio o som das feridas
II
ó princesa adormecida
enquanto guardas na flor da carne
dos teus lábios indefesos
sorrisos palavras mágicas
ou só meus poemas presos
o que imanta teus olhos
que ímã me tens me tesa
me armas com tuas entradas
de tantas delicadezas
elétrico me põe na fala
faíscas de um tempo aceso
no mito a chave da porta
a corda que o plumo estica
no mito a princesa morta
no poema onde vivafica
pedra brava
a vida aqui no recife é
pedra brava federika não dá mole só quer me ver duro não compartilha a grana
diz que não paga cerveja pra amante tremenda sagaranagem além de amante sou o
seu acessor nas artemanhas pelas areias da boa viagem pedra por pedra estou
pensando voltar pra itabira para iriri nem pensar o espírito santo mora longe não passa por aqui federika está pior
que lampião pensei que vindo para pernambuco fosse amolecer seu coração qual nada virou
pedra que nem marreta quebra
o último
goytacá
quando te tocar
é para alvoroçar os teus cabelos
eriçar teus pelos
molhar os teus mamilos de saliva
com essa língua viva
aqui na minha boca
o último goytacá
coisa muito louca
feiticeiro – resistente
mastiga os mamilos da musa
a(r)mado com poesia nos dentes
Studio 52
nada como uma noite
de queijos e vinhos
um belo poema
e uma musa levemente leviana
seria uma puta sagaranagem
bem sacana
se o poeta não conhecesse
as dunas do barato
altas ondas de ipanema
e um edifício chamado 200
na barata ribeiro em copacabana
serAfim 4 - gigi mocidade rainha da bateria
um dia
desses
quero ser sérgio sampaio
porque hoje tô de bode
na cabeça um para raio
tô comigo ninguém pode
soltando bichos no porão
tô faísca tô kabrunco
tô um relâmpago lamparão
a vida não basta
se me bastasse seria outra
clarice quem sabe
beatriz que fosse
fruta que gosto de comer
antropofagia canibal
pronta para o bacanal
filha que sou deste país
de fevereiro
onde todo ano é carnaval
e a vida do meu pai
se foi em sangue
uma bala no estômago
e uma manchete de jornal
insônia
I
nesta noite quieta
entre lençóis e travesseiros
eu aqui inquieta no meu canto
ouço bob dylan
bebendo esse conhac
com tua língua
em minha boca
pelas noites lá do sul
meu brinquedo verde/azul
II
trago de volta os vinhedos
tua pele entre meus dedos
o poema em guardanapo
até hoje está guardado
na moldura em teu retrato
voragem
para ferreira gullar -
in memória
não sou casta
e sei o quanto custa
me jogar as quantas
quando vejo tantas
que não tem coragem
presa a covardia
eu sou voragem
dentro da noite veloz
e na vertigem do dia
geleia geral
I
geleia é um personagem misterioso meio dionisíaco que vivia nos porões do studio 52 lá pelos idos de 1987 nem sei quando onde como nasceu vivia aprontando com o seu projeto de psicanálise popular com um divã em cada esquina na primeira festa das bacantes nos altos da catedral quando pensávamos ser eunuco devorou a santíssima trindade dela hoje só resta rúbia querubim e um sacrossanto serafim que despachou federika para os corais do recife nas marés de pernambuco
II
vez em quando
geleia passeia pela igreja universal do reino de zeus para tirar um sarro com seu
pastor de andrade na missa pagã do sétimo dia coloca os dedos e a hóstia na língua das ovelhinhas para a encenação
do ciúme nos olhos da sacristia em tudo que é sagrado pra ele não tem segredo os cinismos da hipocrisia em suas juras secretas decreta estado de sítio
em estado de poesia
com o
amor trincando os dentes
parece
até que eu não sabia
que ela fugiria da raia
golpe com rabo de arraia
deixa qualquer uma tonta
ela não estava pronta
se encontrava semi nua
sem coragem de despir o resto
sem coragem de encarar a cama
amarrou-se nas correntes
sem coragem de escancarar a porta
fechou-se então nas janelas
com o
amor trincando os dentes
anti/lírica
um poema bashô aqui
nas 7 paredes do corpo
nos 4 cantos da casa
instigante satírico sarcástico
e ao mesmo tempo
esse ácido lirismo
é como um anjo
de belas brancas asas
que me
toma arrasta domina arrasa
poética 86
teu silêncio
pedra na garganta
saliva seca
nessa língua faca
por quê não canta
a dor de cotovelo?
derruba essa parede
que te cerca
desamarra essa corda
que te enforca
bebe do esperma/leite a nata
e rasga essa mortalha
que te mata
penso em vão não escrever certa vez comecei um
poema com vírgula as curvas dos seios no branco do papel o caminho entre
tecidos sob a pele para o túnel onde não passam automóveis a vírgula não é
ponto apenas um sinal no início do poema que não precisa ter ponto final apenas
curvas em direção a outras curvas para encontrar as outras vírgulas no início do poema
diante do espelho sou
e sempre serei outra
agora o que não sou
fica do outro lado de fora
a lâmina acesa, a brasa
o sal do suor do cio
o mar entre minhas coxas
e mangue entre minhas pernas
os caranguejos que me invadem
sempre que me olham
hoje vou comer
coxinhas na santa ceia paulistana vou comer fiado vou comer de graça coxinha
só se paga a prazo a perder de vista na pia no banheiro no telhado na cozinha
coxinha se come aos montes nas ruas nas praças nos palácios nas garagens
coxinha é massa de manobra amassada com trigo com farinha carne que se presta
pra usar comer e jogar na lata de lixo
coxinha não é gente
coxinha é pior que bicho
linguagem
abraço este poema
como se beijasse meu poeta
com suas linhas tortas
em meu corpo tatuado
teu nome e sobrenome
como um gozo ardente
tua língua ativa
me lambendo quente
e todo líquido escorrendo
por entre o vão dos meus dentes
toda nudez não será castigada
estou nua em pelo
disfarçando o pesadelo
para olhar do alto
o palácio do assalto
e seus metralhas
minha língua é faca
não é palha
é palavra pronta
pra cortar a carne
como fio de navalha
onde houver canalha
toco fogo dentro
pecadora confesso
estando toda no cio
no corpo querendo tudo
minha mãe que me descreve
já me conhece do parto
eu sou vadia e não te iludo
eu tenho as veias abertas
um furacão entre as coxas
um vulcão no ventre/útero
mas só um homem me come
desde a minha tenra idade
nas ostras cravei meu nome
eu sou gigi mocidade
a tentação sou eu
deito pra lua
só ela me p(h)ode como eu quero
penetrar-me com sua luz de fogo
me deleitar com seu leite
eu quero a lua cheia
que me entre o mar das cochas
e me engravide com seu manto
e que não fique algum quebranto
o mal olhado o olho gordo
que me lave com seu líquido
e me leve até são jorge
montado em seu cavalo branco
o rei está Nu
e a rainha
também
o palácio dava para
os fundos
do submundo
onde morava
a loucura tântrica
em suas garras semânticas
como física quântica
ela gozava solitária
no anoitecer de todo dia
E u
não sou santa
a vida é bruta
e vou a luta
uma quadrilha
de filhos da puta
tomou o Planalto de assalto
o lugar deles é a lata de lixo
de onde nunca deveriam ter saído
vamos enxotar essa putada
varrer do mapa esses canalhas
nem que seja a golpe de gilete
a fios de navalhas
se é esse jeito ou única saída
subverter a ordem
acelerar o ritmo da libertação
a Arte é arma
e não temos tempo
de Temer a morte
Arte é intervenção da massa
armemos o povo
para o povo entender
e aprender a Ocupar
Democracia é palavra gasta
“a arte existe
porque a vida não basta”
se a massa está inerte
vamos fermentá-la
vamos fomentá-la
com fermento do biscoito fino
antes do anoitecer
“quem sabe faz a hora
não espera acontecer”
vamos a hora é essa
eu tenho pressa
não temos tempo pra espera
o trem das onze está partindo
e quem perder já era
serAfim 5 - federika lispector a ponta da lança
desconcerto
o poeta é um jogador
joga com palavras
letra por letra
sílaba por sílaba
com nomes sobrenomes
universo das coisas
artifício das cores
tira um sarro com metáforas
desconcerta a lírica
a métrica a fonética
e os significados
onde não tem sentido
enfeitiça o sub-mundo
enaltece o desdentado
não
tenho trava não tenho treta
branca ou preta eu traço o tempo
ao sabor do vento que vem
ao sabor do vento que vai
onda do mar eu tenho o sal
e quero sol a solidão não pega
de surpresa nunca fui presa
fácil pra tua armadilha
eu tenho a trilha que os teus pés
jamais irão pisar
não tenho certeza que isto é um país ando por recife entre
pedras como quem vomita um planalto dentro do palácio grafito a porra no muro
tenho vontade de explodir este barril de pólvora esta é a palavra que não basta
eu trovoada relâmpago ventania temporal elevada a múltipla potencialidade dessa miséria quântica nessa imoral brasilidade
o dia que eu estiver vestida
não me toque
deixe que eu troque
o sentido para o truque
na armadura de ogum
a trama pro desejo
que não dou a qualquer um
desassossego
o meu amor não tem sossego
morde lambe chupa come
teu corpo que ainda não conheço
tua carne - nem se quer tem endereço
o meu amor não tem apego
agarra larga prende solta
atira ampara - é cachoeira
escorre como trovoada
iansã em tempestade
o meu amor é livre e limpo
quando a alma está lavada
desejo sexo amor paixão
fantasia
diante
do espelho fico zen
chamo zeca baleiro de meu bem
canto a mama canto o papa
canto o negão do rappa
canto até quem não conheço
e não preciso de endereço
pra mandar cartão postal
canto a mina da esquina
que se chama lys cabral
lys não a de fando nem do bando do rancho das carmélias
passeava certa noite em itapoã de bunda pra lua ouviu o canto da sereia
se despiu de toda amélia foi me procurar
na federal na ciranda do boi cósmico não ouviu seu pai de santo queria me dar
por todo canto até mesmo na plateia mas voltou pro morro de são paulo para
espanto da geleia
mitológica
fosse afrodite ou fosse vênus
mariana fosse quanto
a flor sagrada de lótus
secreto o espírito santo
os girassóis entre os cabelos
nos lábios lírios do campo
carnívora
o amor é feito de corpos
o amor é feito de membros
o amor é feito de meses
janeiro fevereiro março
todos os dias acordo e me lembro
o amor é feito de abril
maio junho julho
o amor é feito de agosto
setembro outubro novembro
o amor é feito dezembro
o amor é feito de anos
o amor é feito de agora
horas minutos segundos
é razão de estar no mundo
o amor se faz toda hora
serAfim
6 - artur kabrunco garrutio lamparão
Federika
Bezerra: A Porta/Bandeira que Bortou Olivácio Doido
Samba/Enredo
do Grêmio Recreativo e Escola de Samba Mocidade Independente de Padre Olivácio
– A Escola de Samba Oculta no Inconsciente Coletivo no carnaval de 1993 - em 1995 integrou o
repertório do projeto Retalhos Imortais do SerAfim - Oswald de Andrade Nada
Sabia de Mim - Realizado pelo SESC-SP
Em
mil novecentos e vinte e cinco
na noite de orgias satanazes
um raio de trovão incandescente
rachou a Igreja em Goytacazes
um vulto do despacho então desceu
movido por farol de grande luz
tocou na pedra quebrou cruz
a Rainha do Fogo dessa gente
Federika
de ouro azul e prata
na porta da igreja foi parida
criada pelo Padre Olivácio
que logo depois lançou na vida
aos cindo de idade encantada
foi pega masturbando em sacristia
por causa de um sonho com o príncipe
DuBoi da mais sagrada putaria
Expulsa
da cidade foi pra longe
cresceu entre os jardins de JardiNÓpolis
mas se você pergunta Freud Explica:
- o seu palácio agora é em Petrópolis
Aos
dezenove plena de alegria
conheceu Gigi da Bateria
na porta do Beco de Satã
na festa federal do Bar da Lama
a Deusa dos Lençóis de toda cama
sorrindo para ver como é que fica
dá um corte na história
inverte o drama
e transforma Ouro Preto em Vila Rica
e assim vamos cantar em verso e prosa
a saga dessa Deusa Iansã
que em busca da mordida na maçã
sonhava encontrar Guimarães Rosa
Viemos
do SerTão para os seus braços
porque a Mocidade Independente
é a mais fina e pura Flor do Lácio
afilhada do secular Padre Miguel
e fiel ao seu pai Padre Olivácio
e para completar a grande roda
trazemos o cacique Pau Brasil
o centenário Oswald de Andrade
filho da paulicéia que pariu!
Passando pelas bandas do Catete
dançando na maior intensidade
macumba com o índio brasileiro
nossa Ex-Cola campeã da liberdade
Federika engravidou o grafiteiro
do famoso cacete Samaral
que escrevia pelos muros da cidade:
Mocidade já ganhou o Carnaval!
e assim vamos cantar na grande roda
tudo o que deu e o que não deu
o dia que um pastor bem collorido
pensou ser pai de santo e se fudeu!
operação de risco
aqui assumo o kabrunco como sobrenome de um desses
12 apóstolos de zeus nessa profana e canibalesca santa ceia para
provocar os lobisomens assombrados espalhados pelos telhados dos laranjais da paulicea desvairada do presídio federal da
brazilírica do campos dos goytacazes e dos manguezais são francisco
não sou de morder
comer chupar calado como mordo chupo e canto com meu coração de galinha depois
que boto o ovo e o sangue escorre pelos ânus depois da dentada do vampiro por mais que me
chame espanto sou muito mais que isso lingüiça de chouriço sangue de porco na
tripa cachorro louco cão danado nascer em agosto não me é desgosto pelo
contrário me ins-pira
por quê me chamas
fulinaíma? fumaça escorre pelos orifícios de esqueletos refratários caramujos
passeiam paredes emporcalhadas de vinhoto unhas navalhas sangram carnes dos
deuses desencarnados os vermes ainda mordem nas camas dos palácios urubus
pantanais pastos de minotauros no planeta não sei onde ó minha nossa senhora
das tempestades quando me livrar desse pesadelo?
arte
manha
depois de ler o mapa da tribo como um tigre incendiado me visto agora com a flor da pele de salgado maranhão nem sei se wally sabia dessa arte manha salomão não posso dizer o que o poema espreita
nestas tardes de brazilha o sol o céu em
quantas bocas tudo que é meu está
guardado em tudo o que eu criei e o que ainda está pra ser criado e depois do que for re inventado na cor da pele um serAfim
res-guardarei como uma onça em
pantanal quem sabe até flor do cerrado mandacaru brotando em mim por serTão do carnaval
talvez não tenha lógica o que escrevo minha escrita grita do
inconsciente coletivo vivo re-par-ti-do em três em quatro em cinco em seis em sete quem não conhece não se mete
em tudo aquilo que excita
salve meus erês meus
eguns meus xangôs e meus exus salve meus oguns meus oxossis omulus salve
iemanjás oxuns e iansãs todas as manhãs que ainda ardem minhas mordidas nas
maçãs das plenas coxas de das santas filhas de nanãs
irreverência ou morte
disse gigi mocidade pra federico baudelaire homem com flor na boca mestre/sala
dos mares mocidade independente de padre olivácio escola de samba oculta no inconsciente
coletivo não fujo do perigo no asfalto o beijo sujo “é preciso estar atento e
forte não temos tempo de temer a morte” disse-me caetano na canção tropicalista
o genocida anda solto ainda não podemos nos perder de vista
linguagem
o que vai
de um lado da ponte
a outra
é o que sai da boca
o que entra é a língua
a que entorta
beija sem pedir licença
chupa morde goza
na entrada e na saída
sem ter adeus na despedida
a traição das metáforas
durante a viagem olhava a paisagem através da janela árvores montanhas casas abandonadas gado bovino ferro velho onde foi que não estive neste país mal assombrado tenho a leve sensação que o outono nunca vai chegar o patriarca nem vem vindo e um morcego continua na porta principal na entrada da cidade minha avó xingava quando fugia do curral e minha mãe nunca mais me esperou desde o dia em que me fui embora e o 02 não é apenas um traficante de joias no lado b da nossa história
a paisagem vista durante a viagem na janela mexeu com as
minhas unhas sujas de lorca nem era nova granada de espanha nem canção de
milton nascimento ouvia caetano cantando -
"o haiti é aqui'
- com sua língua pontiaguda e pensava o
dia que o genocida vai me olhar com seus olhos ensandecidos detrás das grades da papuda
se eu não fosse Macunaíma
fulinaíma também não
seria
por qualquer coisa que fosse
poeta não caberia
mesmo se filho eu fosse
de uma
nossa senhora
ou de uma santa maria
afilhado de grande otelo
neto da romaria
e quando ao mundo eu viesse
em outro lugar não podia
tinha que ser cacomanga
onde EU então nasceria
poema
atávico
e se a gente se amasse uma vez só a tarde ainda arde primavera tanta
nesse outubro quanto de manhãs tão cinzas nesse momento em bento gonçalves mauri
menegotto termina de lapidar mais uma pedra tem seus olhos no brilho da
escultura confesso tenho andado meio triste na geografia da distância esse
poema atávico tem a cor da tua pele a carne sob os lençóis onde meus dedos
ainda não nasceram algum deus anda me pregando peças num lance de dados
mallarmaicos comovido ainda te procuro em palavras aramaicas e a pele dos meus
olhos anda perdida em teu vestido
para gigi mocidade
procuro uma menina
que seja assim quase criança
que seja assim quase mulher
procuro uma menina
que saiba bem a diferença
entre o mal e o bem-me-quer
que saiba bem a flor que cheira
pra desfolhar o mal-me-quer
sabendo tudo brincadeira
saiba beijar o que ela quer
saiba que o beijo é um desejo
que nasce da flor quando mulher
saiba que o desejo quando beijo
não é por amor qualquer
miles davis fisgou na agulha
oscar no foco de palavra
cobra de vidro sangue na fagulha
carne de peixe maracangalha
que mar eu bebo na telha
que a minha língua não tralha?
eros
tua blusa de seda
entre meus dentes
o nó se desfez depois do vinho
sob as folhas dos parreirais
vale - os vinhedos
quantas vezes eros
eletrizou os nossos dedos?
escridura
esse poema absurdo
direto no ouvido do surdo
escridura nos olhos dela
ela bem sabe o que desejo
ela bem sabe o que espero
tem canivete no sangue
tem um alfinete entre dentes
a faca que corta a navalha
sangrou as tripas no ventre
o beijo quando for que seja
de língua mordendo a carne quente
algaravia
eu sou o vento que remove teus
cabelos e
repousa em tua face a
outra face do que sente mas
não vê a
palavra que um dia escreverá
– algaravia nas
películas da memória na
ficção que entender come
poesia menina come
poesia pois
não há mais metafísica no mundo do que comer poesia
come poesia menina come
poesia não há mais metafísica no mundo do
que comer poesia come poema menina come
poema temos delicados drops de anis ou chocolate de café para festejar leila diniz
temos as líricas tímidas românticas abstratas metafóricas atrevidas temos os chuviscos
bomucados maria mole rapadura
temos também as ácidas viscerais eróticas concretas sensuais as que não livram a cara dos
fascistas e dão porrada em ditadura
embriague-se
já me dizia Charles Baudelaire
hoje estou em estado de vinho
só venha comigo quem flor acaso
bem-me-quer
suspenso no Ar não penso
atravesso
o portão da tua
casa
o corpo em fogo
a carne em brasa
tudo arde nas cinzas das
horas
no silêncio da
tarde
vou
entrando sem alarde
sem comício como o pássaro
que acaba de cantar
em pleno hospício
se me perguntam
respondo
:
não tenho a mínima ilusão pelo futuro dessa cidade veracidade
mas não me entrego
sou curisco kabrunco capeta
candeias
ainda tenho muitos poemas de brecht
pulsando em minhas veias
leandra andra como quem escapa da cilada de uma palavra acesa
e eu kabrunco acendo a lamparina para iluminar a encruzilhada ainda hoje os
dentes mordem a lavra da palavra quando ela se despe atrás da porta para ter
sua carne devorada no poema sem nenhum pudor ou receio de problemas
serAfim 7 - artur fulinaíma o outro
se o amor fosse apenas
desejo quantos beijos neste dia roubaria do teu corpo por inteiro se a paixão
fosse primeiro
quantas horas passaria no
teu corpo noite e dia de janeiro a janeiro
se nada disso resolvesse fome sede fogo febre mergulharia em ondas novas
todo mês de fevereiro
cidade
veracidade
campos
189
transverso atravesso esta cidade que me atravessa em silêncio
ouço o gemido dos teus ecos por ruas avenidas e vielas sinto saudade dos
terreiros de jongo nas favelas e as
lavadeiras das pinturas aquarelas em teus aceiros fiz meus trilhos em cada
trilha dos meus traços no encontro ao ururau no cais da lapa teu por do
sol pode ser beijo ou também pode ser tapa quando olho a catedral e seu contorno seres famintos alimentando o
desalento me solto ao vento quando penso
o infinito beijo teu rio o paraíba que me leva
em teu lamento me concentro em
minha reza
carne viva da loucura
escrevo pra não morrer antes da morte me disse gigi mocidade no homem com a flor na boca transitivo ou intransitivo vivo na mais sagrada ilógica do inconsciente coletivo na semeadura dos ossos carnadura enquanto posso palavrar o que procuro enquanto ócio vou lavrando o criativo na carne viva da loucura quando da morte sobrevivo
irina é um sol
que dói
no crânio
quando
dentes ardem
e mordem
os
beiços da tarde
não posso permitir irina vestida de cetim de seda
fina se a quero felimina vestida de sombra e luz a carne em flocos de lua olhos
de não sonhar um abajur cor de carne nas pedras de lumiar
impossível pensar irina vestida com outras vestes este ser cabra da peste do inconsciente coletivo do imaginário incandescente
inútil pensar irina vestida de
serpentina como fez cinzia farina em seu poema visual era uma tarde de chuva
num sonho de carnaval
meta metáfora no
poema meta
como alcançá-la plena
no impulso onde universo pulsa
no poema onde estico plumo
onde o nervo da palavra cresce
onde a linha que separa a pele
é o tecido que o teu corpo veste
como alcançá-la pluma
nessa teia que aranha tece
entre um beijo outro no mamilo
onde aquilo que a pele em plumo
rompe a linha do sentido e cresce
onde o nervo da palavra sobe
o tecido do teu corpo desce
onde a teia que o alcançar descobre
no sentido que o poema é prece
eu sou avesso atravesso a cidade com o que me interessa as vezes sou sossego outras vezes tenho pressa não procuro o que não quero me abstenho no que faço me abstrato quando posso me concreto em cada passo o compasso é argamassa o absinto é quando traço uma linha nunca reta da palavra em descompasso se sou torta não importa em cada porta risco um ponto pra revelar os meus destroços no alfabeto do desterro a carnadura dos meus ossos
um dia
desses
um dia desses não quero ser paulo leminski nem dançar como nijinski ou escrever feito pessoa numa boa /
quero voltar a curitiba e sair da pindaíba escancarar o Beleléu - quero ouvir carlos careqa esse - filho de ninguém
e botar fogo no céu onde o anjo diz: amém!
quero ser o nego dito ou será o benedito do itamar da assumpção
um dia desses quero ser um joão gilberto e quem sabe caetano seja como for em dó ré mi fá lá si dó pra explodir o meu silêncio e tropicanizar em salvador um dia desses quero ser um pai de santo para fazer da flor de lys a minha flor e como um filho de xangô festejar o meu amor com meu salgueiro campeão.
um dia desses quero ser
um celso borges quero ser um cláudio willer quero ser eliakin um ademir assunção quero ser sempre plural estar sempre em profusão um dia desses quero ser zeca baleiro pra dançar boi no terreiro com salgado maranhão
um dia desses quero ser
celso de alencar para esporrar com as 111 picas do massacre do carandiru na cara
dos fascistas de brasil de norte a sul
um dia desse quero ser césar augusto de carvalho anistia pra
golpista é o caralho!
fulinaíma sax blues poesia
ela era Bruna
em noite de blues
rasgado
soltou a voz
feito Joplin
num canto
desesperado
por ser primeiro
de abril
aquele dia
marcado
a voz rasgou a
garganta
da santa loucura
santa
com tanta força
no canto
que até hoje me
lembro
daquela musa na
sala
com tua boca do
inferno
beijando meus
dentes na fala
poÉtica fulinaímica:
fulinaimicamente falando dar - é se doar emprestar a voz a quem está mais
necessitado do que nós quem
quiser que pense o que quiser escrevo
no instante visceral que sou esteja onde estiver venha o que vier posso ser um homem ou emprestar a voz a
uma mulher profana qualquer pense o que quiser escrevo o que me dá na telha centelha da faísca viva brasa cerebral do instinto animal pensante
que sou : insPiração é um estado de purificação divina do humano ser
quem disse
que amor
é mudo surdo
cego
não sabe o que carrego
em meu
estado de sítio
em meu instante
de surto
“uma palavra LIMPA é uma palavra possível”
(Viviane
Mosé)
passeio os pés descalços sobre covas rasas contando ossos no
poema exposto
no sujeito do objeto
tudo isso exposto nesse papo reto
segue o passo norte
não leio cartas de suicídio
nem decreto de hospício
na tentação que me conforte
quero matar o genocídio
pra não morrer
antes da morte
o outubro
me deixou no tudo nada
a luz branca sem sono
em nossos corpos de abandono
ela arquitetava uma nesga
entre as frestas da janela
luz do luar nos olhos dela
girassóis em desmantelos
por entre poros entre pelos
minhas unhas tuas costas
amsterdã nos teus cabelos
o que van gog me trazia
era branca noite de outono
que amanheceu sem ver o dia
nossos corpos estavam tomados
de vinho tinto e poesia
diante de tudo que tenho falado despido lido escrito ser mestre sala não é uma missão apenas por ter incorporado a mocidade independente de padre olivácio em ouro preto das minas e não é sina tem mais angu nesse caroço cabeça nesse prego não nego estou metido nessa trama dos pés aos fios de cabelo em cada uma das nervuras desse osso debaixo dos lençóis de cada cama tem segredos e mistérios que sendo revelados deixariam qualquer país em alvoroço
aves de rapina sobrevoam os céus de brazilírica vender é o grande jogo dos governantes de negócios não é metáfora metafísica figura de
linguagem é a mais pura sacanagem eles dão o golpe na calada da noite no romper da madrugada vendem a coisa pública porque gostam da privada
irina se escondeu na pluma feito bruna se libertou da bruma e
flutuou no ar voou de nova deli a bagdá
tentou me encontrar mas foi inútil eu tinha seguido para o norte procurando a
sorte que não tive aqui no sul bati em
portas de marabaia a estambul e foi um
corte que dei no tal destino e num instante meio brusco repentino rasguei os
trilhos e fui parar em paraty federika
desembestou foi pra recife desde então
nunca mais em telavive desde então
nunca mais em tela vi
o primeiro encontro
Federico – o que é que você está fazendo
aqui?
Irina – procurando o que fazer
Federico – o que fazer aqui é difícil!
Irina - acho não
Federico – então venha
Irina – primeiro preciso criar meu
figurino e me maquiar
Federico – nada disso, faz assim mesmo
como você está
Irina – não, assim não, assim eles vão
pensar que não sou ela
Federico – Ela quem?
Irina – posso ser a serafina, clarice beatriz, ou qualquer outra. só não posso ser a rúbia querubim porque essa é
meio complicada, porque gosta de quibe de peixe
Federico – e por quê?
Irina – não gosto de quibe nem de peixe
e em Iriri parece que só tem isso pra comer
Federico – você quer um espelho?
Irina – pra quê?
Federico – pra você ver como está
vermelha!
Irina – ando meio assustada
mesmo, muito estranho isso aqui
Federico – teatro do absurdo
Irina – mas parece que era o que eu tanto procurava. mas não sei
se realmente encontrei
Federico – por quê?
Irina – minha mãe é muito estranha
Federico – é assim mesmo, aqui todos nós
somos estranhos somos vampiros serafins
Irina – uma ora ela é clarice e de
repente beatriz, e não tem nada a ver uma com a outra, não se parecem nem um
pouco, isso quase me pira
Federico – mas aqui numa página a gente
transa noutra página a gente pira
Irina – mas isso pra mim é muito novo
e chega a ser pirante mesmo
Federico -ah! relaxa e goza, que as
metáforas dessa cruel realidade são
sempre mais reais
Irina – então deixa eu ir ali me
maquiar
Federico – precisa não transa assim mesmo
Irina – transa? como assim?
Federico – aqui transa é trabalho, quando
mais a gente transa mais experientes ficamos
Irina – você é experiente?
Federico – acho que sim, pelo menos é o
que dizem por aí?
Irina – ah, então quero trabalhar com
você. Vou criar um figurino massa e uma maquiagem vampiresca quero me tornar a
grande vampira serafim na grande aldeia do canibal tupiniquim
Federico – então vai quero ver você nessa
vampirinha serafina pra macunaíma nenhuma colocar defeito
Irina – macunaíma? quem é ele?
Federico – é o nosso herói sem nenhum
caráter
Irina – como assim?
Federico – é porque ele é uma mistura
quase assim como a clarice/beatriz, sua mãe, e a gente pra entender mesmo quem
ele é temos que procurar muito, e mergulhar profundamente numa leitura sobre o
povo brasileiro, da mesma forma como fez darcy ribeiro.
Irina – mas isso dá muito trabalho?
Federico – mas tudo que a gente faz aqui é
parte do trabalho
Irina - pois então, já vou – (abraça federico
afetuosamente simula um beijo, olha olho no olho, é agora? ainda não, e sai de
cena)
Federico – vou ficar aqui orando pra ela
voltar – como poesia devoro pra matar a fome, quando oro o prazer tem outro
nome
um girassol se escondeu por trás do portão de entrada. Entre
suas pétalas cantava minha amada um blues rasgado desses que não se houve mais
-
a branca flor o azul do mar e a menina dos meus olhos com a
luz de Iemanjá quem dera fosse a minha namorada e chegasse sem aviso só preciso
dos teus olhos e da luz do teu sorriso
o impulso aqui não é pouco o espírito grita dentro do corpo deliro feito louco de tanta sede e fome como quem não vive em paz como quem não come há muitos séculos atrás
serAfim 8
- euGênio mallarmè o filho de
Severina conterrâneo de torquato
eu sou menino
eu sou menina
e não venham me dizer
que lança perfume é parafina
diversidade de gêneros
podes crer – não me alucina
eu nasci da minha mãe
que se chama severina
lá dos sertões do nordeste nor/destino nor/destina
como o sal do maranhão
bumba-meu-boi não desafina
conterrâneo do Torquato
eu nasci em Teresina
aqui
em casa
lavo pinto
bordo
o corpo
a alma
os pelos
cada um que
pinte seus
delírios
cada um que
desenrole
seus novelos
irina me
disse há um poema seu debaixo das escadas atrás de cada porta dos palácios
metaforicamente fulinaíma desvenda todos os mistérios interplanetários na invasão dos intra poderes que comandam a invasão da fonética dos ventos e por consequência a invasão cibernética dos corpos
ouvindo
música pra remédio
quando se trata de metáforas macabea invade a meta do poema afora e se esconde atrás do personagem trancada no sub-inconsciente semi-morta pra toda fauna toda flora na moralidade mata o que o corpo sente deixa a carne apodrecer ao sol da mordacidade
entre hóstias e cultos anti-bíblicos
castrada de toda e qualquer sexualidade prende o gozo na boca quando se masturba mentalmente ouvindo
música pra remédio travestida em todo
tédio
que o histerismo a
converteu
você
pensa que escrevo em rua reta ou estrada sinuosa para você poesia é verso do
inverso ou avesso de uma prosa? escrevi pscanalítica 67 em mil novecentos e
sessenta e sete numa madrugada de setembro/outubro quando visitei meu pai no
henrique roxo e vi vespasiano contra a parede dando cabeçadas no manicômio mais
uma vida exterminada e no fim das contas noves fora nada tudo o que eu queria
dizer naquela hora explode agora quando atravesso o portão da tua casa o corpo
em fogo a carne em brasa sem pensar estética estrutura estilo de linguagem
sinto o desejo entre os teus mamilos a espera do beijo da esfinge que devora
irina serafina onça branquinha
brincando de ninfeta com sua língua de fogo devassa o imoral queima boletos da
sabesp na cara do tarcínico narcotarso desfila na paulista com sua bu(a)nda de metal
poética 48
era quase uma menina
nem bem sei se era
pois me dera amor carnal
como o que eu quisera
como nunca antes
outra mulher me dera
de maneira assim tão normal
tão distante teresina
me lembro da cajuína
saudade da faustina
que conheci no carnaval
da mostra visual de poesia
brasileira
tinha carlos careqa
jormmad muniz de brito
rubervam du nascimento
o verbo então carnal
argamassa no cimento
mas a carne tão macia
viva crua quase nua
acendeu a luz no apartamento
poética
38
enquanto
escavo a seiva
entre o vão das suas coxas
para desfrutar do teu cio
e santificar o nosso ócio
a
selva amazônica perde
mais 200 mil hectares de mata virgem
para as moto serras assassinas
desse venal agro negócio
na língua do meu delírio
agora que Isadora em mim amoras no pomar da minha casa meu corpo incêndio no barril é pólvora a carne em chamas no esqueleto brasa o fogo acende os pavios entorpecidos e o instinto volta a fazer parte dos sentidos
incontinência verbal
eles
tentaram
além de nos calar/apagar
um espaço/tempo
do país onde nascemos
viemos dos
40 50 60 70 80 90 2000
o que vivemoso que fizemos
o que fazemos onde estamos
o que faremos pra onde iremos
o que sabemos
incomoda/desconforta
conhecimento liberta
é porta aberta
e não um vão estreito
em cada porta
a
pedra na carne
a carne na pedra
nem tudo que reluz é ouro
nem tudo que cobre a carne
é couro
nem tudo o que me fere
fedra
nunca estou
mesmo estando
onde nunca estive
mesmo tendo estado
isso me provoca sérias dúvidas
dívidas pra resgatar no fim do mês
e o preço da carne seca
está muito caro no mercado
na pele do poema
o cavalo selvagem
cavalga a pele do poema
enquanto transa na pastagem
um novo trote
a deusa do rock
berra em outro canto
enquanto na voragem da vertigem
assento a pedra de xangô
na vitória do espírito
santo
naquela noite de chuva
as cores no vestido de iansã passaram despercebidas por aqui o sangue encarnado
nas matas de oxossi e o olho do dragão na ponta da espada de ogum ainda que
aline na porta da casa velha tivesse sobre a pele meus olhos presos por palavras escritas na parede as sagradas
escrituras não dissessem o quanto ali brotavam flores naquela noite de chuva um
coração estraçalhado
61
revirei sacramento pelo avesso do avesso aline
me acompanhou passo a passo pela ladeira até a casa dos fundos canários no
quintal catavam o que comer fotografamos e filmamos o que pairou no ar e não
perdemos o éter dentro e o cafezal nos convidava ao êxtase aline olhou pelo
espelho da janela que dava para o outro lado da alma e levitou entre as trilhas
dos canteiros ouvindo o som que nos unia
frente ao espelho
penso o tempo que não veio o mar que
se foi o amor que não ficou o mamilo dos teus seios os olhos de um boi tudo que
restou o sol a luz a cruz a dor de não dormir o berro a barra a lua o punhal a
faca a fruta no quintal a pele o tecido a cor do teu vestido a flor no temporal
a chuva o arco íris teus olhos a retina a cera a parafina e a nossa vida de
animal
faroeste lamparão
para torquato neto – in memória
quando saí de casa ia dar um tiro na cara do
delegado mas estava desarmado estão me colocando em histórias dos tempos do não
sei onde como se eu durando kid comesse a filha do conde nunca comi amarela em
cinema mexicano muito menos a ruiva do faroeste americano disseram que eu tive
caso de amor que se tornou pernambucano quando encontrei o poeta no trailer do
ricardinho foi me falando de mansinho como se trampa uma batalha pra não cair
na armadilha a - grana - palavra - cilada
agora não se fala mais agora não se fala nada
o homem com a flor na boca
federico pensou iracema
com seus grandes vestidos folgados como a gringa ninfeta iolanda trajada em
vestes de penas nos bailes do império em luanda nas barras das saias da fama
ele então grafitou grumixama palavra que ouviu numa cena na língua da formosa
dama no teatro da rua ipanema nos bordéis de copacabana os cogumelos
de santa cecília nas barras incandescentes da cama pornofônicas palavras
fonemas pitanga urucum colorau açucena com os caldos da salsaparrilha qualquer grande
orgia é pequena
o sobrinho do meu tio
marcou o boi com ferro em brasa
por ordens de dom diego de la riva
e na janela da grande casa
do mosteiro de são bento
azeredo furtado garruchava
lençóis de trigos ao vento
enquanto o boi estribuchava
com a metáfora ensanguentada
no couro cru na carne viva
do santíssimo
sacramento
lamparina acesa no trovão
relâmpagos atravessam corredores
lá fora chove canivetes e navalhas
quebradeira geral no umbral
das coisas incompletas
relampejam nos currais sacramentados
entre a desgraça e a glória
aqui incorporados
nos porões
da nossa história
são saruê
festa no sertão é bala
bola no buraco é búlica
cabral não descobriu a pólvora
por trás de cada coisa pública
a chama do lampião na palha
fogueira sempre quero acesa
linguagem meu fuzil metralha
explosão como feijão na mesa
são saruê 1
o vento nordeste
atiça meu ser cabra da peste
assumo o risco
sou diabo sou curisco
boto a peixeira na cinta
pra pular fogueira
em noites de são joão
meu xangô xangô menino
viva o povo nordestino
nosso deus é lampião
profana
tenho apenas
esse punhal de
prata
e a lua já não
é mais cheia
poesia sempre
na veia
e aquele beijo
guardado
que ainda não
foi roubado
na noite da santa ceia
serAfim 10 –
lady gumes
ponte grande
com dois
me deito
com três me levanto
com a graça de zeus
e do divino espírito santo
mariana de piracicaba
registro um mar de fogo
mariana um rio de piracicaba
escorre em minha cama
sob os lençóis de cananeia
nem jocasta nem medeia
na minha camisa de vênus
na tua boca de lótus
por tantos anos que não passam
nesse torpor que não me cessa
nem mesmo o chá me acalma
o teu corpo em minhas unhas
no espelho tua alma
por mais que eu queira sonhar
meu amor por tantas eras
que nem mesmo sei contar
macabea chorava osso
a ponte quebrada não me leva para o outro lado olho o espelho d´água e tenho certeza que vou me afogar engoli o vento da primeira madrugada a casa era cacos de vidros minha filha vaza os pés em rio das ostras nunca mais pensei o mangue como a morada dos peixes e o canal passava atrás da varanda da cozinha hoje estou sóbria muito mais que embriagada pela maresia com esse cheiro de sexo evaporando pelo olhos e o corpo tremendo de susto por não ter com quem gozar
algumas imagens permanecem na medula da memória e me mantém
viva água viva ontem mesmo te vi à estrela do
mar e mesmo não estando foi como se estivesse tatuada em minha pele com
letras de sol e sal nos raios de luz do luar beijei teu nome nas algas e mergulhei no teu olhar
fulinaímica
não sei escrevo tanto
não sei se escrevo tenso
um fio elétrico suspenso
com tanta coisa no Ar
não sei se olho em teu olho
pra encontrar a entrada
da porta da tua casa
onde a palavra estiver
não sei se pinto um van gog
ou se escrevo um baudelaire
entriDentes 5
ou uma segunda a tarde em campos
ex-dos goytacazes
o grito desestrutura o silêncio atrás da porta a lâmina acesa sangra sob a luz
do abajour lilás a faca escreve a palavra morta dois gumes na noite que estremece
a voz que cala e o assassino limpa a lâmina como quem come sua última refeição
poundianas
torquato era um poeta
que amou a ana
leminski profeta
que amou alice
um dia pós
veio uilcon torto
e pegou a jóia diana
juntou na pereiralice
com o corpo & alma
das duas
foi beauvoir assombradado
roendo o osso do mito
pra lá de frança ou bahia
pois tudo que sartre dizia
o anjo jurou já ter dito
NONADA
biúte: ria
fricção
quem passou a língua nas coxas da caipora? me pergunta federico baudelaire
cheirando as flores d0 mal no sarau de euGênio mallarmè gigi então invoca a
dona santa federika que baixa na mesma hora - ora bolas fui eu com minha língua
de faca cortei a cara da vaca a começar pelas coxas depois subi pelo corpo até
o buraco da boca e meti a língua na
língua e na suruba das línguas a dela mordendo a minha a minha mordendo a dela a
arte então se revela não existe arte sem língua nem teatro sem linguagem a arte
é uma grande suruba no segundo andar da padaria e o resto mais é paisagem
altar da perfumaria
fé cega faca
amolada
não quero paz
nem harmonia
na nova ordem do dia
procuro a lucidez
na desordem da orgia
irina me disse ontem que não quer
saber de nada que aconteceu ou que vai acontecer seu prazer é mais intenso
quando não sabe nem pensa no que irá fazer anda muito dada ultimamente não mente quando o
assunto é paixão ou sexo seu desejo é mais complexo que o recôncavo do convexo
do baiano da santíssima salvador e seja
como for tem andado muito pensativa com
as frases positivas do seu anjo serAfim nas páginas ainda brancas do vampiro
goytacá canibal tupiniquim
a poesia é meta física
meta quântica
itaipu é um paraíso
dentro do que restou
da devastada mata atlântica
serAfim 11 – irina serafina januária vascaína
ele me provoca me invoca me incorpora enfia toda palavra nos
porões das coxas passeia o litoral das costas da nuca ao cóccix
fricção ação movimento o poema voa pelos poros pele ao sabor do vento beija
lambe morde minha carne trêmula coloca um trema no meu ( ) tranqüilo
como quem constante sempre come aquilo desconcerta desconforta não
tendo como fugir me entrego intensa/inteira como a mulher aos pés da porta
irina serafina
quem quiser
que me defina
então me canta
não sou assim
tão santa
como uma bela rima
quem pensa assim se engana
quem pensa assim desafina
menina oxum
é por
você que me deleito
só por você que me deliro
do lado esquerdo do peito
é por você que me trans-piro
por tudo que foi secreto
por tudo que é sagrado
por quanto já foi escrito
ou ainda não falado
na pedra itapemirim
na pedra de itaocara
guapimirim curumim
guarapari guanabara
em toda água seus mitos
tua flor de lótus tão rara
menina oxum infinito
minha folha verde bonsai
na/mora dentro de mim
de dentro de mim não sai
certa
vez em vila velha na vitória do espírito santo trepei no bonde no centro
histórico da cidade velha enquanto andra mirava seus olhos sobre os meus entretanto
no entanto nada me disse em seu silêncio
de tanto de tanto dizer tanto no trem um tanto no
centro um encanto metafórico no engenho de fora no trem do engenho de dentro
da cana
o açúcar
o melado
a rapa dura
o chuvisco da gema do ovo
e a minha língua sacana
bagunçando
a ditadura
falando a língua do povo
devorável
mais uma vez te venho
porque com essa flecha
que me acerta o peito
teu coração me devora
e me desfaz na pétala
como o vôo de um colibri
velocidade de um beija-flor
tire o seu pircing do caminho
que eu quero passar com meu amor
fosse apenas
uma palavra reta carinho afeto e uma que ainda falta nesse novo alfabeto que
procuro tateio no escuro outras palavras signos signi ficar signi ficando signi
ficado na hipotemusa do quadrado do cateto no silêncio que muitas vezes ouvi da
flauta do hermeto nas trinta e cinco pausas de renata persigo a trilha em
movimento pés descalços sobre a mata e as palavras brotam cachoeiras água
corrente vem da fonte como sementes desejadas de brotar
marcabra perambulava ainda as tontas
pelo mar vermelho procurando por carlitos argentino (o criador dos
moranguinhos) vomitava marimbondos depois que assistiu pelas ruas assombradadas
de campos ex-dos goytacazes as
mirabolantes peripécias de lady tempestade desnudando coronéis e lobisomens com
suas rajadas de vento confesso que não invento a hipocrisia dos homens
lady tempestade a freudelírica satiriza macabea no presídio
federal de brazilírica interpretando luz del fuego no festival internacional
das artes cínicas com uma serpente de cobre no pescoço
serafina macunaímica
ontem
disse que me amava
queria até transar comigo
hoje foge de mim
tranca a tranca do umbigo
fecha a porta entre as coxas
ela sabe que me deixa louca
e adora provocação
mas vou buscar no cu do mundo
sua libido o seu
tesão
dialogando com o
mestre
o poema pode ser
um trem fora do trilho
a ponte que caiu
a mulher que não deu filho
ou a pedra que pariu
domingo
mar de barco
mar de pele
mar de peixes
mar de algas
como um poema de olga
onda de sal nas minhas mágoas
com sua pele de mel
com sua pele de água
pra amenizar tanta saudade
o poema as vezes é sabre
lâmina
fina como o vento
ou folhas suspensas
sobre um verde
quase água
quase pluma
levita sobrevoa se espraia
na voragem do dia
como os dedos da moça
ao atiçar o clic
no instante exato da fotografia
cidade voracidade
ainda ontem queria te ver mas não pude – cidade rude oculta atrás do
espelho do outro lado da calçada não decifrei teu mapa muito menos cais da lapa
onde queria mergulhar teu rio desbravar teu cio para depois dormir
até onde
teus segredos me
aceitam?
até quando
teus mistérios me pertencem?
até onde
teus silêncios tem meus gritos?
quando me deixas
assim aflita
perco o chão por
onde pisa
por onde teu pé
desliza
que não sei quando
ele está
e se perco teus pés
de mim
por onde vou caminhar?
se ela
vier
no frescor da maresia
lhe darei milhões de beijos
antes do amanhecer
de um novo dia
e do corpo que comer
a carne
espalharei tabacaria
moro no teu mato dentro
não gosto de estar por fora
tudo que me pintar eu invento
como um beijo no teu corpo agora
desejo-te pelo menos enquanto resta
partícula mínima micro solar floresta sendo
animal da mata atlântica quântico amor ou
metafísica tudo que em mim não há
respostas
metáfora d´alkimim fugaz brazílica
beijo-te a carne que te cobre os ossos
pele por pele sobre as tuas costas
os bichos amam em comunhão na mata como se fosse
aquela hora exata
em que despes de mim o ser humano e do corpo rasgamos todo pano
e como um deus pagão pensamos sexo
em todas minhas partes
concretas abstratas
o amor sempre retrata
todo espelho que vivi
mariana
gaivotas sobrevoam os cílios da lagoa teus cabelos louros espelham sal na lâmina d´água o
mar – complemento do teu nome naquela
noite de música mágica – quando vozes da
áfrica saltaram da garganta canto de todos os povos no verde da mata luzes na flor da
pele líquida cerveja na sede que não cessa éramos mais que tímpanos absortos
naquele espaço templo com os olhos
famintos devorando luas na constelação
de orions como uma flor de cactos sobre um chão de estrelas
meta morfose
muitas vezes no instante uma
mulher por perto noutras meio distante
como alcançá-la plena pele
pluma palavra carne sal água de mar
mesmo fosse água de rio se
o que gosta é tempestade só sabe amar quando cala por inteiro meu
eu perdido em sua fala
sou uma mulher da vida irina severina januária
vascaína uso a minha arma branca pra enfrentar a tirania transo em qualquer rua
de qualquer esquina qualquer encruzilhada de qualquer lua com jorge de
ogum federico de oxum mallarmè de yansã não sou pagã fui batizada na igreja
universal do reino de zeus nasci em ouro preto vila rica sou filha de deus irmã
de federika
o tempo
tem seu avesso
para
Prata Tavares in memória
cidade quando penso nela lembro nossas angústias dormem em camas de ferro madeira ou palha nossas palavras também são foices facões ou car/navalhas nossos poemas estiletes canivetes para rasgarem o pano de luxo das mortalhas nossas mágoas lavamos nas águas do paraíba enquanto eles que pensaram serem donos da cidade incineraram corpos na usina cambaíba
esta noite me preparo para o sagrado de amanhã alguma coisa me diz alguma coisa me conta que vamos nos fartar de carne humana num banquete antropofágico algum acidente trágico pode estar pra acontecer alguma força simbólica entre nós assim pressinto com a química do absinto caldeirão da alquimia como nas noites da cacomanga preparava minha tia alguma bruxa quem sabe em campos dos goytacazes está pronta pra atacar ou quem sabe pastor de andrade é quem vai representar
o som vem do sopro penetra na palavra dentro do poema flutua
no ar como os olhos verdes da menina de pele preta que oculta sobrevoa na sala
sobre cabeças incrédulas que ainda não
conhecem o estado de poesia
sua flauta está fazendo
falta na minha boca de batom teu sax uma
máquina de som
fulinaimicamente a boca
do desejo morde a carne dos meus dentes e desassossega minha língua em tua boca quando dá o tom : fulinaimicamente
serafina
escrevo sem pensar qualquer sentido ou significado o leitor
que defina da melhor forma que lhe convier não sou homem/mulher menino/menina
para pensar o que não sou o rato roeu a roupa do rei de roma comeu o queijo na
ratoeira durante a missa de segunda feira e de bandeja cuspiu na boca da rainha a culpa não é do rato e mito menos
minha
canibal tupiniquim
rocei a língua
nos dentes da vampira
antes que piracicaba
os dentes cravei no pescoço
em mariana
a sorocabana curuminha
que sangrei no zepelin
chico pensou fosse geni
genipapo no olho do cego
é tangerina
virgindade entre as coxas da menina
com um beijo a gente faz
um trampolim
“contra todas as catequeses
lei do homem lei do antropófago”
Oswald de Andrade
serAfim 12 – pastor de andrade o antropófago
Cidade VeraCidade
as vezes me inquieto e me pergunto: uma cidade só é uma cidade
se de forma plena e total ela se concreta se conhecimento é o que liberta e
indignação o que desperta nilo peçanha deve estar se perguntando: "por
onde andará minha biblioteca" ?
balbúrdia
no meio do caminho
poema na veia
sangue quente
carNAvalha
seja herói seja marginal poema
que me valha
bacanal
onde é que fica?
cara de cavalo
debaixo da bandeira
de hélio oiticicca
absinto
impossível
te sentir mais do que já sinto
poesia muito prosa
poesia
muito prosa as vezes pedra noutras vezes fedra quero dizer que ainda arde a
palavra na palavra corpo quando carne e sangue incendeiam paiol de milho na
fazenda da infância cacomanga era um tempo de fartura enxada na palavra do poema
ela vendia
brigadeiro
e eu não fui o
primeiro
a provar suas
delícias
federico passou na frente
como expresso
do oriente
nos levando à
boa vista
de onde ela
tinha vindo
a curuminha
contente
vendeu tudo em
um só dia
o doce que o
povo comeu
sorrindo ainda
dizia
:
- vocês são
mais loucos do que eu
discípulo de rimbaud
minha tv pifou nem tenho ido ao
cinema meu filme está carne da palavra
esse poema é trágico me lembra infância lá na cacomanga televisão nunca tivemos era rádio de pilha depois de bateria meu pai criava porcos para vender
na primavera e complementar o seu salário
que nem o mínimo era carteira de trabalho nunca teve como administrador de uma fazenda com mais de 1000 alqueires de terra com produção agropecuária canavieira e cerâmica industrial (usina de moer
gente) esse é um poema em linha reta nem sei por quê e para que me tornei poeta discípulo de rimbaud talvez só para
escrever que no brasil mesmo depois da
abolição escravidão nunca terminou
o curral das merdavilhas
o brasil já foi ilha de vera cruz
e nunca foi ilha
já foi terra de santa cruz
e nunca foi santa
hoje ninguém mais se espanta
com o volume das trapaças
no curral das merdavilhas
na cara da hipocrisia
desde
que resolvi abrir o meu baú de ossos da memória que algumas pessoas, que antes
desfilavam por aqui como amigas agora fogem da página como diabo foge da cruz
não escrevo para sacerdotes, escrevo para quem vive em liberdade e faz da
liberdade o seu sentido maior de viver não vivo atrás de portas/cortinas
escondido embaixo de panos a minha língua é explícita linguagem voraz e sacana
aprendi com oswald que humor sarcasmo ironia são armas mortais na cara da hipocrisia
irina também passeia
itamarna
é uma cidade morna quase cinza sem brilho mesmo assim pelas noites passeiam por
ali vaga-lumes vagabundos com suas asas
lâmpadas/lamparinas irina também passeia por ali pelas madrugadas
vestida de quase nada
mini conto
no livro as vísceras expostas em
grande estilo tudo aquilo que é ferida aberta passeia sobre o branco do papel
todos os órgãos extirpados por uma única facada
sagaraNAgens
a terra aqui é vermelha - branca - é a carne de dracena tudo cena – dela
- só quero a boca seus olhos de fogo me
engolem da janela em frente estou no oitavo andar de um hotel qualquer seus
pelos são pétalas eletrizantes de um maldito mal-me-quer ajeito o foco da lente
para vê-la mais de perto avisto a púbis de vênus a língua cresce não seria por
menos nem no mais banal dos melodramas com essa linda louca que me acena aqui
agora no meu quarto
embaixo dos lençóis na minha cama com suas fendas de moema
fruta farta
amoras
nus - teus pelos
quantas línguas
já provaram
mangas
na carne ancestral
da uva roxa
pra desbravar
o sexo
no pomar
das tuas coxas
igreja universal do
reino de zeus
minha ovelha preferida está se
rebelando os ensaios da mocidade independente de padre olivácio estão se aproximando e ela não dá as caras vou baixar decreto vou baixar o
santo e não diga no entanto que sou linha dura dessa rapadura você ainda não
viu ela não é santa e não duvido nada que a sua mãe foi a ovelh/ana que pariu
metafórica
dialética
quantas teorias terei
para escrever o que falo
quantos sapatos ainda apertam
os calcanhares do meu calo?
mar cela
esse mar que eu tanto quero
se não vem me desespero
esse mar me faz suspenso
esse mar que as vezes penso
e não sei onde vai dar
nesse mar onde mergulho
esse mar me faz barulho
nesse mar tanto silêncio
esse mar que as vezes tenso
e não sei se vai passar
para o mar que mora em mim
o enigma não está propriamente
na meta física da metáfora mar de carne e osso se eu não falasse ou não dissesse esse
relógio trágico com seus ponteiros
mágicos arrastando segundo por segundo
tudo o que não passa tudo o que não cessa
o fluxo em tua boca de vênus - minhas unhas
só o céu é testemunha desse instante único em que passeio em tua pele como
uma flor de lótus flor de cactos flor de
lírios ou mesmo sexo sendo flor ou faca
fosse mar de tanta espuma com minha
língua de espera em tua língua de amora em tua língua de mar(a) em tua língua
de mar
labirinto
beber dessa tua língua
luziana o líquido da maresia
o suor do mar da linguagem
e tudo mais beberia
no teu corpo em desalinho
em luas de tempestades
em lençóis de calmaria
palavras em tua boca
levaram-me ao descaminho
amarraste-me em tua cama
com tuas garras de linho
depois que me embriagaste
com mil garrafas de vinho
beatriz – a morta
oswald de andrade re-visitado
como pedra me olhas
como fedra te vejo
vestida de carne nua
a língua na maçã navalha
tua alma transparente crua
o olho por detrás da porta
poema com pavio aceso
quando oswald pariu a morta
tinha o dente
nos teus olhos preso
angra
assim como
o pau-brasil
a flor do mangue
também sangra
a traição das metáforas
caipora tem andado atormentada pelos corredores do presídio
federal de brazilírica a maconha mofada de juiz de fora deve ter
provocado um efeito negativo em seus neurônios ela tem andado surtada
delirando com perturbações mentais, da ordem dos apocalípticos seguidores do
santo daime dai-lhe misericórdia santo zeus caso contrário ela vai acabar no
cais da lapa ou procurando jongo em custodópolis tendo alucinações com maria
anita e se arriscando a levar uma coça de umbigo de boi e aprender a não olhar
só para o seu próprio umbigo
bebo a tempestade
na traição das metáforas macabea já sofreu as consequências pelos mesmos
delírios e nem psicanálise lhe devolveu a sobriedade ficou cada vez mais
dilacerada pela própria língua/espora com que tentava ferir a barriga do
cavalo ouça um bom conselho caipora aprendi com chico buarque – “eu lhe dou de
graça, venha minha amiga faça como eu faço inútil dormir que a dor não passa
venha minha amiga brinque com o meu fogo venha se queimar eu semeio
vento na minha cidade vou pra rua e bebo a tempestade”
saliva
escorria
gosto da
leveza dos dedos deslizando feito pluma penetrar a carne e as sensações
saltarem para o abismo do poema depois dos saraus ela ia de pele e na pele dela
eu ia para trancoso no litoral da bahia
ou para raposo estação d´água de itaperuna curtir a pedra do toque ela sempre
me disse sentir mais minha carne que a pedra do arpoador em maresia
e sempre gozou mais quando a saliva escorria entre o anus
com prazer ainda
faria
e ela era uma estudante de
arquitetura que pintou poemas no cachorro louco e escavou imagens em
brazilírica pereira : a traição das metáforas - e quero dizer que ainda arde
tua manhã na minha tarde a tua noite no meu dia tudo em nós que já foi feito
com prazer ainda faria
veneno da serpente
certa vez numa visita que fiz ao presídio federal de
brazilírica com o objetivo de levar
algum alívio para algumas daquelas almas pecadoras me surpreendi com a oferta
de macabea
:
- morda o meu pescoço prove do meu sangue
- cruz credo zeus me livre teu sangue não me serve deve estar contaminado de repente com o veneno ardiloso da serpente
o cu do mundo
o cu do mundo onde fica?
minha língua afiada
onde enfiá-la?
fulinaimagem
metáfora nua na janela
meter a língua na linguagem dela
o frevo rolou na esplanada
rocei suas mãos em conchas pele
de ostra molhada mel escorreu por entre as coxas beijei o éter no ar pesquei
tua língua que voou depois do coito oito horas depois do abstrato esse lugar
enigmático onde estou quando te quero quero quero no pátio da sala plínio
marcos foi embora alceu valença manda um frevo na esplanada no festival de
pernambuco o eunuco dançarino enrola um papel de seda o pó da pluma na penumbra
penetrou minha asp/irina
A
mulher que goza assistindo futebol
irina serafina januária vascaína goza assistindo
futebol na televisão do vizinho da esquina geme berra urra quando atinge o
ponto g eu peço não gema não grite e ela grita: - é gol de roberto dinamite!
enigma no cinema
tem uma coisa aqui que ainda não sei decifrar o código do
significado 7776668 é o número do apartamento na quinta avenida e não estou em
new york muito menos bagdá estou mirando
itapoã em salvador - dali me disse: meus bigodes são mais lindos do que
qualquer fellini no cinema meu sangue está na lama misturado a cocaína com a
língua clara dessa gosmenta gelatina - enquanto do outro lado da avenida
joaquim pedro de andrade me pergunta: e por onde andará macunaíma?
oferenda
sou a lenda
oculta
para o imposto de renda
deixa star
presente
na oferenda
que fiz ontem
pra minha mãe yemanjá
antropofagia
esse poema é um tratado entre o poeta que tem fome de clareza e sua musa
simbolismo de beleza
se eu não beber teus olhos não serei eu
nem mais ninguém disse o poeta a sua musa ainda esfinge
beber na fonte dos seus olhos sem medo de ser feliz : ela completa “não quero poema em linha reta ainda
sou clarice/beatriz” é ela quem me diz
mas eu não sou discreto no abstrato do concreto no concreto do abstrato todo
homem que tem fome abapuru é o teu auto-retrato
mitologia fulinaimânica
explicitamente picasso nunca nos disse guernica o que
signi-fica o corpo do fonema aliterações alisam a orelha de van gog
fartura farta fogo farra festa federico baudelaire tocando fado pras fadinhas
de vênus falarem com a fênix do farol de alexandria enquanto freud
nem fode nem explica o que aconteceu na sexta feira no luau das laranjeiras
depois que federika furtou a farinha do desejo de toda família do império das
bananas no largo do machado infeliz das oliveiras
mitologia sagarínica
macabea a rainha das artes cínicas insatisfeita com o
rumo dos canaviais aliciara presidiários a saltarem os muros do
presídio federal de brazilírica federico o carcereiro desconfiou da
facada que levaria pelas costas mas o matuto astuto como era invocou nossa
senhora das cabeças tortas e rezou uma ladainha com os caramurus dos serAfins
convocando eros e vênus para o banquete pornolírico com as descendentes de
olivácio e gigi remexendo seus colírios que trouxera atrás dos braços deposita
sua iansã por sobre a mesa e despacha macabea pro espaço
mitologia brazilianas
breton mastigava poemas de baudelaire no jantar da quinta da
boa vista dois anos depois da independência d pedro não conseguiu engolir
abapuru no quartel da realeza leopoldina perambulava distraída e
preocupada com as cartas de bonifácio recebeu notícias que em pernambuco
havia chegado um ser estranho pintado em cores assombrosas perturbava a
calmaria daquele estado de incertezas para os caminhos da imperatriz uma sombra
pairava sobre as chaves do seu guarda-roupa sem saber ao menos com que
roupa iria desfilar no dia de são cristóvão na confeitaria colombo a sua
afrodite de vênus
mitologia serafínica
irina estava vestida de beatriz primeira posava para mais um
clássico do surrealismo de magrite no quarto preparava a cama para a chegada de
wermer a alta temperatura do verão de sorocaba alterou a visão pictórica
do pintor da menina dos brincos de pérola que no jardim enfiava o pincel por
entre a espessa barba esperando a primavera lady gumes apressada como sempre se
aproveitou da cama e vive uma calorosa noite de amor sem mesmo querer saber
quem era a serafina debaixo dos lençóis maranhenses
mitologia fulinaimânica 2
cubismo é um objeto estranho encontrado por uma sereia nos
lençóis do maranhão em noite d e lua cheia teria vindo do mar ou foi criado ali
mesmo naquele chão de areia onde nenhum rabo de arraia resistiu a ventania não
pense filme de terro porque já tem gente por aí dizendo que este samba é pra
você ó meu amor! e que eu só escrevo putaria
santa ceia
com uma dentada na veia do pescoço matei o prefeito de cambaíba limpei desossei lavei assei no mesmo forno da usina recheado com maçãs do paraíso e servi a santa ceia aos meus 12 apóstolos das bacantes com um farto altar das mil e umas noites decoradas com milhares de garrafas de vinho para o deleite das 7 eras de vênus afrodite quem quiser
Artur Gomes
A
Biografia De Um Poeta Absurdo
leia
no biografia no blog
















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