Prefácio
Quem fez esta manhã, quem
penetrou
À noite os labirintos do
tesouro,
Quem fez esta manhã
predominou
Seus temas a paráfrases do
touro,
As traduções do cisne:
fê-la para
Abandonar-se a mitos
essenciais,
Deflorada por ímpetos de
rara
Metamorfose alada, onde
jamais
Se exaure o deus que muda,
que transvive.
Quem fez esta manhã fê-la
por ser
Um raio a fecundá-la, não
por lívida
Ausência sem pecado e fê-la
ter
Em si princípio e fim; ter
entre aurora
E meio-dia um homem e sua
hora
Mário Faustino
O Homem E Sua Hora
Org. Benedito Nunes
Cia das Letras - 2002
Lendo seus poemas, Artur Gomes, acabei lembrando deste poema
que escrevi em 2016, para Dilma Rousseff, quando do golpe:
VELHAS
VOZES ÁSPERAS DO GOLPE RÍSPIDO
Ouviram das urnas
velhas vozes ásperas
de um outro tolo
fascista retumbante
e as antigas vozes do golpe
em brados ríspidos
outra vez inundam
de penumbra o céu da pátria
neste instante.
Se o sabor da igualdade
outrora conquistada
com laços fortes
já não pode mais ser
sentido em nossas
almas
já carentes de liberdade,
hoje o golpe novamente
desafia a nossa sorte,
nesse espasmo retardado
de um tolo perturbado
que contraria a
honestidade
até a morte!
Ó pátria amada idolatrada
tão massacrada salve-nos,
salve-nos!
Brasil sonho de tantos,
hoje um constante pesadelo
que agora desce
de teu formoso céu
antes límpido a imagem
da antiga ditadura
outra vez o
escurece.
Monstro pela própria natureza
sois corrupto, sois
infame
a espalhar violências
e mentiras sem medidas,
da idade das trevas
em gigantes medidas
e o futuro vos
garante essa certeza!
Ó pátria adorada idolatrada
és tu Brasil a nossa terra
tão amada dos filhos
deste solo
somos aqueles que não
fogem
e não fingem na sua
luta,
ó pátria amada
Brasil.
Não somos os que nasceram
deitados em berço
esplêndido
somos aqueles que
levantaram
muito cedo e desde
então
foram à rua semear o pão,
a labuta, a coragem e a boa conduta,
ao som do mar e à luz do céu escuro
ao nascer de tantos sóis
e tantas luas à espera da colheita
e do florescer de um novo mundo...
Do que a espera mais cansativa
nossa garra sempre foi a mais bonita
nosso sangue bem vermelho
tem mais vida nossa vida
de verdades nossa alma
de valores não há de fazer valer
a sua vida sem escrúpulos
ou pudores!
Ó pátria amada idolatrada
tão massacrada salve-nos, salve-nos!
Brasil nosso amor eterno
é nosso símbolo a democracia
é nossa glória
do passado nossa vitória
do presente conquistado
e a paz de um futuro esperado!
Mas se um tolo de um brado
retumbante nos assusta
com seus amigos torturantes
não pensem que os filhos teus
fugirão à luta verão que nenhum
dos filhos teus entregarão
a estrela à noite escura
nem entregarão suas crianças
à própria sorte!
Terra adorada és tu Brasil
a pátria amada dos filhos teus
54 milhões não fugirão à luta
nem por temer a própria morte
nem por cunhar a
própria história
em igual consorte pátria amada idolatrada
igual a ti mulher altiva nunca se viu!
(Nic Cardeal/2016, para Dilma Rousseff)
Zhô Bertholini
Teatro do Absurdo
O quarteto da hipotenusa
versus o quadrado do quarteto
da hipotenusa a musa do quadrado
fosse apenas o retrato na fotografia
mas não sendo hipotenusa
somente musa algaravia
uma palavra mais que estrada
sendo musa multi-via
me levou nessa jornada
para fora da Bahia
todos os santos mar aberto
no abismo a fantasia
de querer mus entretanto
muito mais que poesia
e ela vai pintando
o homem com a flor na boca
com seus pincéis de aquarela
poema que só é possível
pelas lentes dos olhos dela
na balada ou no bolero
nossas letras se entrelaçaram
pele corpo carne sangue pelos
poros entre tintas entre tantos
anos que foram pintados
sobre papéis de cartas em fogo
sob o sol chuva verão inverno
quando qualquer das estações
é primavera
e ela era uma estudante de arquitetura que pintou poemas no cachorro louco
e desenhou imagens em Brazilírica Pereira : A Traição das Metáforas
Artur Gomes
O Homem Com A Flor Na Boca
https://fulinaimatupiniquim.blogspot.com/
O Auto do Boi Macutraia
por onde andará
Macunaíma
tá no rabo da sereia
tá no rabo da arraia
já passou por Gargaú
tomou pinga em Bracutaia
?
não
Joilson Bessa já me disse
Kapi do céu já ensaia
Macunaíma vem dançando
na farra do boi Macutraia
levanta meu boi levanta
que é hora de viajar
acorda boi povo todo
povo e boi tem de lutar
olha o rabo do boi é boi
a barriga do boi é boi
olha o chifre do boi é boi
e o couro do boi é boi
o meu boi é valente é boi
já chifrou o tenente é boi
é um boi de mercado é boi
e também o delegado é boi
e lá vem Toninho Xita
todos vestido de rosário
vai cantar mais samba-enredo
pra enriquecer o relicário
ê meu boi brasileiro ê boi
pintadinho sem dinheiro ê boi
ê meu boi alazão ê boi
que chifrou o capetão ê boi
o meu boi é kabrunco é boi
o meu boi garrutio é boi
o meu boi lamparão ê boi
pra encantar a multidão é boi
o meu boi é jaguar é boi
mãe maria vem cantar vem boi
e meu boi sapatão ê boi
vem também pai joão vem boi
o meu boi julivete é boi
já comeu a micheque ê boi
e meu boi operário é boi
já chifrou salafrário ê boi
o meu boi é cigano é boi
o meu boi é baiano é boi
é também pernambucano é boi
tá no canto da sereia é boi
tá no rabo da arraia é boi
é um boi carnavalhado é boi
veste calça e veste saia é boi
eita boi da macutraia ê boi
o meu boi jaburu é boi
enfrentou o bangu ê boi
desfilou no ururau ê boi
e ganhou carnaval é boi
esse boi sem segredo ê boi
esse boi não tem medo ê boi
se um dia passa fome ê boi
noutro dia nós vira samba-enredo
Artur Gomes
www.arturkabrunco.blogspot.com
Algo sobre céu
Pousam nas xícaras da noite passada
borboletas da Índia, tons de corais.
Sobre a borra de café, aroma salino
e profundo do Índico.
Asas transparentes, projetam azuis
no banco silencioso e frio da parede
como se fosse primavera.
Telas de anjos e outras divindades
(dessas que não lembramos de onde vem)
como se vivas, vertiam lágrimas
intactas pétalas de flores
bordando o tapete da sala
da mais pura igualdade e paz.
Nas borras do café da noite passada
abriu-se cristalino, o destino
nas asas das borboletas da Índia
no cheiro de incenso de mirra.
E todo ser fez-se um pedaço do Divino
pausa no tempo, no acorde menino
por instantes, o brinde do vinho
e tudo em volta fez-se céu
e tudo em volta, céu
profundamente céu.
Tonho França
Do livro Quarto de Azulejos
Editora Penalux - 2014
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