sábado, 28 de janeiro de 2023

Mostra Visual de Poesia Brasileira - Poesia Em Movimento

poesia suja e cruel desses dias de verão


a música que aumenta a audiência do programa de televisão no sábado à noite não fala do homem trans assassinado na porta da boate. não diz nada a respeito das crianças pobres e famintas largadas no meio da rua. nem denuncia o genocídio categoricamente planejado dos povos indígenas yanomami. 

não fala não diz nada a respeito

nem denuncia.

a música que toca no rádio portátil do moço na beira da praia não diz nada a respeito dos corpos seputados em valas clandestinas. não denuncia os ignominiosos machos que mantém suas reféns tensas e aflitas sob a mira de absurdos sentimentos. nem fala dos vergonhosos mapas da fome que territorializam a morte por inanição.

não diz nada a respeito não

denuncia nem fala.

a música que sai das cornetas estacionadas perto do cruzamento entre o bar e a igreja presbiteriana não denuncia o extermínio do povo preto de todas as periferias. não fala do exorbitante preço do gás de cozinha. nem diz nada a respeito da professora assassinada à facadas pelo ex-aluno dentro da sua própria casa no meio da noite.

não denuncia não fala nem

diz nada a respeito.

a música que empobrece o rebolado das meninas no frenesi da boca não fala dos tribunais do tráfico instalados nos morros cariocas. não diz nada a respeito da devastação criminosa dos nossos biomas. nem denuncia os corpos soterrados pela lama devido ao descaso dos últimos governantes deste país de merda.

não fala não diz nada a respeito

nem denuncia. 

parece até que o comprimento de ondas das antenas de tv não captam as dores humanas. parece até que os decibéis emitidos pelos aparelhos portáteis são insuficientes para anunciar a pungência dos dramas alheios. parece até que o som estrondante das cornetas só reproduzem o que superficialmente chamam de alegria.

parece até que... parece até

que... parece até que...

parece até que ninguém some que ninguém morre que ninguém é exterminado por essas favelas afora na agitação da noite mais sangrenta entre o espalhamento de bundas álcool pó e fumaça. parece até que todos estão surdos para as coisas do mundo que vibram dentro desse peito contemporâneo cheio de remendos e suturas de onde vazam palavras tortas sem adjetivo algum que as dignifiquem.

 parece até que ninguém... parece

até que todos...

 abro uma lata de cerveja no meio da multidão. esvazio ali o cotidiano das minhas aflições. e timidamente vejo pingar sobre o chão feito sangue a poesia suja e cruel desses dias de verão...

 

Joilson Bessa

Parque Aurora e Alphaville, 19 a 25 de janeiro de 2023.



 

a musa da rua formosa

 

nem tudo ou nada

me leva para o outro lado 

quando não quero

quero quero 

carne de tapioca

farinha de mandioca

temperada com azeite

sal pimenta

nada discreta

tecida de carioca

no morro de Ibitioca

minha sede não aguenta

essa cerveja campista

nem fiado nem a vista

nem sua fórmula secreta

tem musa que não entende

a linguagem de um  poeta

 

Artur Gomes

https://fulinaimagens.blogspot.com/

 


ontem não fui nem vim

fiquei sem onda magnética

feito folha seca no chão sem vento

 

Itabapoana Pedra Pássaro Poema 

https://porradalirica.blogspot.com/



Juras secreta 62

 

tenho estado

entre o fio e a navalha

perigosamente – no limite

pulando a cerca da fronteira

entre o teu estado de sítio

e o meu estado de surto

 

só curto a palavra viva

odeio uma língua morta

 

poema que presta é linguagem

pratico a SagaraNAgem

na esquina da rua torta

 

Artur Gomes

Juras Secretas

Edititora Penalux – 2018

https://secretasjuras.blogspot.com/



jura secreta 129

poema do livro SagaraNAgens Fulinaímicas

 

a coisa que me habita é pólvora

dinamite em ponto de explosão

o país em que habito é nunca

me verás rendido a normas

ou leis que me impeçam a fala

a rua onde trafego é amplo

atalho pra o submundo

o poço onde mergulho é fundo

vai da pele que me cobre a carne

ao nervo mais íntimo do osso

 

Artur Gomes

https://www.facebook.com/groups/155521691464333/?fref=ts






passo a passo

passo

carros, árvores

passo

passos apressados

passo

jornais, revistas

passo

manifestantes

passo

tela de TV

passo

glórias antigas

passo

passo errado

passo

autoridades

passo

passo em falso

passo

amigos do rei

passo

passo extremo

passo

gente armada

passo

passo errado

passo

passam mentiras

passo

ódio e raiva

passo

passo a passo

passo

carros, árvores

passo

pássaros voam

 

César Augusto de Carvalho




nos currais dos mares salgados
Federico pensou Iracema
com seus grandes vestidos folgados
como a grande ninfeta Iolanda
trajada em vestes de penas
nos bailes do império em Luanda

nas barras da saia da fama
ele então grafitou grumixama
palavra que ouviu numa cena
na língua da formosa dama
no teatro da rua ipanema
nos bordeís de copacabana

os cogumelos de Santa Cecília
nas barras incandescentes da cama
pornofônicas palavras fonemas
pitanga urucum colorau açucena
com os caldos da salsaparrilha
qualquer grande orgia é pequena

Artur Gomes Fulinaíma



abstração

 

com minha ingenuidade

de poeta & poesia

tateio palavras

 

como tateio sentimentos

& nuvens

 

& confesso:

não tenho

pés no chão

 

sou ser de asas & vôos

sou ser de nuvens

 

& acrescento:

meu desejo mesmo

é ser paisagem

 

& acredito:

só é real

o que a poesia toca

 

josafá Santana

Brasília-DF


poema visual - Tchello d´Barros 


ÁRVORE GENEALÓGICA

 

O ascendente mais remoto

de que se tem notícia

jamais se pautou pela lógica.

 

Sabe-se que se dizia tataraneto

de Dante Alighieri

e avô de Vasco da Gama.

 

Acreditava que o tempo é circular

e pode se movimentar para frente ou para trás ao seu bel prazer.

 

Jurava ter lutado na derrocada de Troia,

tripulado uma das naves de Colombo

e massacrado 32 espanhóis na Noite de São Bartolomeu.

 

Consta que foi condenado à morte

pelos tribunais da Santa Inquisição,

não por suas ideias, nem por seus feitos,

que, afinal, não ameaçavam ninguém,

mas pelo valiosíssimo rebanho de formigas

que possuía nas Ilhas Canárias.

 

Morreu queimado em 1583,

porém, foi visto entre os templários otomanos

que expulsaram os turcos de Constantinopla.

 

Ademir Assunção

*****

Poema do livro

Um nome escrito no vento

Grafatório (2021)


 Panelaço de Domingo


não sou demo tucana

nem assembléia universal

não sou coxinha paulistana

meu ministério é carnaval

 

não sou mineira das Neves

nem paulista D´Alkimim

não sou a filha da santa

sou a mulher do Serafim

 

as flores de Baudelaire

podem ser flores do mal

não sou santa sou mulher

posso ser vento e vendaval

 

na veia tenho nordeste

não sou do norte nem do sul

brasileiríssima da peste

sou cascavel surucucu

 

muito antes das Diretas

botei o bloco na rua

hoje sou torta em linha reta

nasci de bunda prá lua

 

Gigi da Bateria -

Rainha da Mocidade Independente de Padre Olivácio -  A Escola de Samba Oculta no Inconsciente Coletivo




tem dias que a gente se sente

me sinto agora

só e bem acompanhado

meu lado de dentro

olhando meu lado de fora

 

Artur Fulinaíma

https://arturkabrunco.blogspot.com/



Trova Indecorosa


eu sou a carne que você não come
a faca que você não usa
a pele que você não toca
a placa que você recusa

eu sou o que não tem nome

na cabeça da medusa
e vou matar a tua fome
e vou rasgar a tua blusa

Federico Baudelaire

https://coletivomacunaimadecultura.blogspot.com/


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