sábado, 26 de agosto de 2023

OcupAção Poética

Beatriz – A Morta

Oswald de Andrade Re-Visitado

como pedra me olhas
como fedra te vejo
vestida de carne nua
a língua na maçã navalha
tua alma transparente crua
o olho por detrás da porta
poema com pavio aceso
quando Oswald pariu A Morta
tinha os dentes
                   nos teus olhos preso
 

 

 Artur Gomes

O Homem Com A Flor Na Boca

Lançamento previsto para o dia 27 de novembro no Sarau Gente de Palavra

São Paulo-SP

Leia mais no blog

https://coletivomacunaimadecultura.blogspot.com/

Mostra Visual de Poesia Brasileira

Muito em breve Ocupação Poética no Palácio da Cultura – Campos dos Goytacazes-RJ


OFÍCIO ESQUISITO

 

hoje acordei meio Bandeira

com a sombra da Derradeira

cutucando as minhas costas

não é o delírio que me apavora

é o agora!

são os planos, o olhar pra frente

e ao mesmo tempo a memória

a impulsividade por dentro

ainda me controla

são pensamentos se debatendo

por um rápido momento

malditos 15 minutos...

me inflamam!

o que me salva

ou me armadilha em precipício

me mantém cada vez mais vivo:

o embate literário em busca

de um motivo pra tudo isso

eu me alimento dos riscos!

vou rasgar a noite embriagado em palavras

sacudir minha alma inquieta

afogar meus excessos

violentar minha máquina

 

Marcelo Perez


 cacomanga


vou xingar minha poesia
em teus ouvidos cacomanga
de onde saí, sem de mim
você nunca ter saído

espalhar teus versos,
moídos em carne crua,
pelos saraus cariocas
e pelas pauliceias desvairadas...

nua dos teus canaviais,
vi passarem por ali
na velocidade dos automóveis,
na vertigem dos viadutos,
na beleza fria dos neons,
na tontura inebriante dos vapores...
enfim, em tudo que devorava
tuas planícies lamacentas,
os sonhos antropofágicos
de uma geração.

espargi por todos os cantos
o açúcar que deliu entre os dentes,
o caldo que escorreu entre os ossos,
o prazer que rodopiou no corpo,
feito algazarra de boi pintadinho...

e das agruras de quem sangra
com ternura, cacomanga
50 anos depois de tantas fulinaimagens
50 anos após tantas sagaranagens,
tantos ventos, tantos sóis, tanta nervura,
vejo-te ainda nos aceiros de paralepípedos
sobre os quais construí minha ventura.

Joilson Bessa da Silva

Alphaville, 18 de agosto - 2023


   Cogito


eu sou como eu sou

pronome

pessoal intransferível

do homem que iniciei

na medida do impossível


eu sou como eu sou

agora

sem grandes segredos dantes

sem novos secretos dentes

nesta hora


eu sou como eu sou

presente

desferrolhado indecente

feito um pedaço de mim


eu sou como eu sou

vidente

e vivo tranqüilamente

todas as horas do fim.

 

Torquato Neto 


 Bem no fundo

No fundo, no fundo,

bem lá no fundo,

a gente gostaria

de ver nossos problemas

resolvidos por decreto

a partir desta data,

aquela mágoa sem remédio

é considerada nula

e sobre ela — silêncio perpétuo

extinto por lei todo o remorso,

maldito seja quem olhar pra trás,

lá pra trás não há nada,

e nada mais

mas problemas não se resolvem,

problemas têm família grande,

e aos domingos

saem todos a passear

o problema, sua senhora

e outros pequenos probleminhas.

 

Paulo Leminski


          SagaraNAgens Fulinaímicas


guima meu mestre guima

em mil perdões eu vos peço

por esta obra encarnada

na carne cabra da peste

da hygia ferreira bem casta

aqui nas bandas do leste

a fome de carne é madrasta

 

ave palavra profana

cabala que vos fazia

veredas em mais sagaranas

a morte em vidas severinas

tal qual antropofagia

teu grande serTão vou cumer

 

nem joão cabral severino

nem virgulino de matraca

nem meu padrinho de pia

me ensinou usar faca

ou da palavra o fazer

a ferramenta que afino

roubei do meste drummundo

que o diabo giramundo

é o narciso do meu Ser



 Jura secreta 57

meta metáfora no poema meta

como alcançá-la plena
no impulso onde universo pulsa
no poema onde estico prumo
onde o nervo da palavra cresce
onde a linha que separa a pele
é o tecido que o teu corpo veste

como alcançá-la pluma
nessa teia que aranha tece
entre um beijo outro no mamilo
onde aquilo que a pele em prumo
rompe a linha do sentido e cresce
onde o nervo da palavra sobe
o tecido do teu corpo desce
onde a teia que o alcançar descobre
no sentido que o poema é prece


jura não secreta 19

 

quero dizer que ainda arde

tua manhã em minha tarde

a tua noite no meu dia

tudo em nós que já foi feito

com prazer inda faria

 

quero dizer que ainda é cedo

inda tenho um samba-enredo

e tudo em nós é carnaval

é só vestir a fantasia

 

quero ser teu mestre-sala

e você porta/bandeira

quando chegar na quarta-feira

a gente inventa outra fulia


 


Artur Gomes

in Juras Secretas

Editora Penaluz – 2018

www.secretasjuras.blogspot.com



(Para o poeta, Artur Gomes, no dia do seu aniversário)

 

MARIA BOCA DE POESIA

 

Retirem as crianças da rua,

vai passar a Poesia despudorada,

desencarnada, é só osso luminoso e ofício,

a que não domina sua língua de fogo,

navalha flamejante.

 

Vai descer a avenida central,

se benzer na catedral,

insana matrona

de filhos mortos

dos dilacerantes abortos

em nome do pai que sumiu.

 

Freme os quadris

como se fizesse sexo grupal,

ao sol da via pública.

 

Potra,

pútrida,

puta,

contudo, é Poesia seminal.

 

Literatura do caos.

 

Sua risada estrala,

parece taça de vidro

jogada contra o mármore

do altar-mor.

 

Riso que revela dentes de animal,

dissolvida pastilha de sonrisal,

grossa espuma no canto da boca,

que avisa a hora do vômito,

alerta indômito

da praga rouca:

- aos que roubam nossa saúde,

defuntos no fundo do açude,

que violam a consciência das crianças,

e as deixam desmaiadas nas carteiras escolares,

tumulares.

 

cavaleiros da política

guias da resignada cegueira

da grande malta servil,

desejo-lhes o grande inferno de Dante

e antes que me assassinem,

vão-te à puta que lhes pariu!

 

Fernando Leite Fernandes 



 jogo de dadaísta

 

não sou iluminista/nem pretender

eu quero o cravo e a rosa

cumer o verso e a prosa

amanhecer nova poética

devorar a lírica a métrica

a carne da musa

seja branca/negra

amar/ela vermelha verde

ou cafusa

 

eu sou do mato curupira carrapato

eu sou da febre sou dos ossos

sou da lira do delírio

são  virgílio é o meu sócio

pernambuco amaralina

vida leve ou sempre/vida severina

sendo mulher ou só menina

que sendo santa prostituta

ou cafetina

devorar é minha sina

profanar

é o meu negócio

 

artur gomes

http\://www.youtube.com/watch?v=cy6CTrAgDtA



GOYA TACÁ AMOPI


 ao criar todo o universo

deus foi com campos perverso

tal como diz a piada

em terras de massapê

de vista a se perder

semeou povinho de nada

dizem ser deus brasileiro

mas eu digo que é fuleiro

o deus que fez isto aqui

 

pois quando criou o mundo

não hesitou um segundo

em esta terra punir

é praga de goitacá

é praga de mungunzá

é praga de jesuíta

é tanta desgraça junta

que ninguém mais se pergunta

por que terra tão maldita

 

e pensar que o paraíba

rasgando a serra em ferida

um dia pariu a planície

enfeitou-a de ingazeiros

e de pássaros trigueiros

e por fim nos deu habite-se

e nos deu tanta riqueza

que engalanada nobreza

pra do povo se servir

 

não mediu regras e esforços

dizimou a indiada

escravizou a negada

sem pena, dó ou remorso

e em seus campos primeiros

semeou mato brejeiro

transformando em aceiro

este jardim de delícias

 

cultuado em prosa e verso

por poetas ufanistas

“Ó Paraíba, ó mágica torrente

Soberana dos prados e vergéis

Por onde passas como um rei do oriente

Os teus vassalos vêm beijar-te os pés”

 

eta destino perverso

que pra ti deus reservou

pois onde o verde se espraia

chove fuligem nas saias

do santíssimo salvador

 

pois dele é mais que preciso

proteger-se do inimigo

que em teus brejais hoje grassa

pois tanto que lhe usurparam

tanto que lhe ultrajaram

tanto lhe vilipendiaram

que caístes em desgraça

apesar do ouro negro

és em si nosso degredo

 

em ti somos expatriados

de ti somos extirpados

nada do que é seu é nosso

trazemos no peito remorso

já não temos amor próprio

mais andamos cabisbaixos

sem saber pronde seguir

goya tacá amopi

 

o que fizeram de ti

nesta virada de século

foi um estupro perverso

de colo seio e gentio

que em nada lembra o bravio

e ancestral goitacá

goya tacá amopi

 

mais que nunca precisamos

as tuas rédeas tomar

e recantar com prazer

os versos de azevedo

na música de perissé

e de você nos orgulhar

“Campos Formosa, intrépida amazona

do viridente plaino goitacás

predileta do luar como Verona

terra feita de luz e madrigais”

 

Antonio Roberto Góis Cavalcanti - Kapi


Porque não só rio

 

Porque me cortas a cidade

E o peito

Com águas e lembranças,

Deságuas nos meus olhos

Alegrias e detritos,

Alimentas e derrubas

Minhas casas e esperanças

E quando seco

Meninos brincam nas areias de teus quintais

Porque inspiras protestos e poesias

Dais abrigo a beatas e piranhas,

Lavas homens e animais...

Rio

E te atravesso apesar das correntezas

E

Rio

Porque tens lágrimas demais

E meus dentes se misturaram a teu lodo fértil,

Manguezais formaram-se em minha boca,

Guaiamuns fartaram-se de poesia

E as palavras tragaram os catadores de livros

E puãs

Entre a minha

e a tua vida

há o naufrágio de grandes vapores

e a teimosia de pequenos barcos

Rio

Porque me guarda um beijo quente

O oceano

 

Adriano Moura



Goytacá Boy
musicado e cantado por Naiman
no CD fulinaíma sax blues poesia - 2002

ando por São Paulo meio Araraquara
a pele índia do meu corpo
concha de sangue em tua veia
sangrada ao sol na carne clara

juntei meu goytacá teu guarani
tupy or not tupy
não foi a língua que ouvi
em tua boca caiçara

para falar para lamber para lembrar
da sua língua arco íris litoral
como colar de uiara
é que eu choro como a chuva curuminha
mineral da mais profunda
lágrima que mãe chorara

para roçar para provar para tocar
na sua pele urucum de carne e osso
a minha língua tara
sonha cumer do teu almoço
e ainda como um doido curuminha
a lamber o chão que restou da Guanabara


metáfora

 

meta dentro
meta fora
que a meta desse trem agora
é seta nesse tempo duro
meta palavra reta
para abrir qualquer trincheira
na carne seca do futuro 
meta dentro dessa meta
a chama da lamparina 
com facho de fogo na retina 
pra clarear o fosso escuro

 

Artur Gomes

Campos dos Goytacazes-RJ


Artur Gomes
do Livro Juras Secretas
Editora Penalux – 2018
leia mais no blog 
www.centrodeartefulinaima.blogspot.com

 

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