segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

múltiplas poéticas

aquário
 
quando a polícia chegou
ela estava na sala
sentada no sofá
a boca arreganhada
a dor arredando-se troppo tarde

o gato miava

o olhar preso no tempo
ignorava a janela aberta
temporal relâmpagos ventania
ana maria braga na tevê
contas vencidas no chão

o gato miava

havia sangue por todo canto
e o sorriso estava no fundo:
abaixo do peixinho vermelho
seus 32 dentes de porcelana
trovejavam impecáveis

o gato miava

 

sil guimarães

[ imagem meus gatos lola & barthô ]


O demiurgo


do vírus

nova ordem virá

o humano

demasiado humano

continuará


César Augusto de Carvalho 



POEMA XXII

 

Os amantes

não são eternos.

Disse-me uma mulher

que traía sua companheira.

São como as calçadas

e as casas de cavalo.

São como

as lâmpadas fluorescentes

e os copos de vidro.

Nunca ousamos dizer:

lealdade no deserto de dedos!

Disse-me uma mulher

que traía sua companheira:

Olha as águas

do rio sonolento.

Observa se nele

vivem pescadores embriagados.

Vê se respiram

fogueira com aroma de cravo.

Os amantes não são eternos.

Disse-me uma mulher

quando se dobrava em mim.

 

Celso de Alencar

 

Publicado no livro SETE, 2001- Vinte e cinco xilogravuras do artista plástico Valdir Rocha e vinte e cinco poemas de Celso de Alencar



A METAFÍSICA IMPUNE

eis a metafísica impune

nas escamas dos peixes

que saltam nas redes

reluzindo o resto de negrume

da noite que fugaz se evade:

 

Ademir Demarchi

Pirão de Sereia

Realejo Edições - 2012


Jura Secreta 45

fulinaimagem

 

1

por enquanto

vou te amar assim em segredo

como se o sagrado fosse

o maior dos pecados originais

e minha língua fosse

só furor dos Canibais

e essa lua mansa fosse faca

a afiar os versos que inda não fiz

e as brigas de amor que nunca quis

mesmo quando o projeto

aponta outra direção embaixo do nariz

e é mais concreto

que a argamassa do abstrato

por enquanto vou te amar assim

admirando teu retrato

enquanto penso minha idade

e o que trago da cidade

embaixo as solas dos sapatos

 

2

o que trago

embaixo as solas dos sapatos é fato

bagana acesa

sobra do cigarro é sarro

dentro do carro

ainda ouço Jimmi Hendrix

quando quero

dancei bolero

sampleAndo rock and roll

prá colher lírios

há que se por o pé na lama

a seda pura foto-síntese do papel

tem Flor de Lótus nos bordéis Copacabana

procuro um mix da guitarra de Santanna

com os espinhos da Rosa de Noel


Artur Gomes

do livro Juras Secretas

Editora Penalux - 2018

imagem: Felipe Stefani

www.secretasjuras.blospot.com



essa costela arrancada
suja de dor & mel


" Ao abismo caímos
e não era voo aquilo "

Ludwig Zeller


eu faço
porque faço
como se fácil fosse

como se eu
fosse um
fosso fértil
fogo - fátuo

um filho
do farto idílio
ou
do fausto desígnio

( oito mil
olhos mortos
me olham oblíquos )

eu faço
porque se não faço
a língua seca
como se lírio fosse

como se
fosse um
fato fútil
feto fosco
fonte falsa
ou uma
folha solta
salto falho

( urubus passeiam
sobre sete encantadores
assombros
e sobre seis avenidas
selvagens
cinco silêncios supersônicos
trafegam trêmulos )

eu faço
porque faço
como se festa fosse

como se eu
fosse um
filisteu filósofo
filipino andrógino
paladino erótico
girassol perplexo
vestígio herético

( &
oito mil
olhos

se abrem
ébrios

se calam
mortos )

garbo gomes
( texto)

Valdir Rocha

( Arte)



A descoberta

Seguimos nosso caminho por este mar de longo
Até a oitava da Páscoa
Topamos aves
E houvemos vista de terra
os selvagens
Mostraram-lhes uma galinha
Quase haviam medo dela
E não queriam por a mão
E depois a tomaram como espantados
primeiro chá
Depois de dançarem
Diogo Dias
Fez o salto real
as meninas da gare
Eram três ou quatro moças bem moças e bem gentis
Com cabelos mui pretos pelas espáduas
E suas vergonhas tão altas e tão saradinhas
Que de nós as muito bem olharmos
Não tínhamos nenhuma vergonha.

 

Oswald de Andrade
(in Poesias Reunidas. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1971.)



cato cacos de azuis

nos alumínios

em cada mínimo

que vejo  azulejo

 

Federico Baudelaire

https://fulinaimagemfreudelerico.blogspot.com/




E como a máquina marcasse o meu desejo

e minha mão latente se perdesse

no ato frio que a vida emana

 

só pude ver um rosto inacabado

e uma entranha mais q se pusesse

no rastro do entorno já perdido

 

no fogo q arrebenta uma pupila

que só dardeja na noite do teu ventre

e num somenos acaba de apagar.

 

Romério Rômulo

A máquina do mundo pós-Drummond)



sua língua

          na minha

                     corpo

                              todo

                                                caminha

 

Dinovaldo Giliolli


  

ainda que hoje não fosse

o dia que queremos

é carnaval

é carNAvalha

navalha na carne

carne na navalha

despir os panos

pensar os planos

soltar o berro

e ferro na boneca

que ninguém é de ferro

 

Artur Gomes Fulinaíma

https://braziliricapereira.blogspot.com/



ancestral

 pelo dorso da minha gata

desliza uma mulher

em chamas

em seu miado

um rio me atravessa

em tumulto

nas suas antenas-orelhas

vislumbro o mundo

encardido

a flor: a náusea: o nojo

a morte: esse desperdício

o amor: essa condenação

  Sil Guimarães

 [ imagem minhas gatas madah & miu

— ou dona onça ]


ALINHAVOS

Minha carne é fraca

- sou tecida

em curtos pavios -

o fogo arde

a água invade

a beira é rasa

o tempo é breve.

De que me serve

vento sem folha

terra sem ventre

escuro sem lume?

Quero um pouco mais de improviso

nesse riso guardado em estoques.

Busco a alma escondida na gaveta

onde guardo tantos medos desde sempre.


Desalinhei minhas simetrias

descosturei minhas mãos

e libertei meus receios do blackout.


Hoje adormeço mais contente:

tenho um sonho iluminando meus

escuros

e uma alma germinada pra semente.


(Nic

Cardeal, 'Sede de céu', Penalux/2019)


Jura Secreta 32

fosse apenas o que já foi dito
escrito falado pensado
não fosse tudo o que já foi maldito
e nada do que nunca foi sagrado

falo em tua boca enquanto em transe
um anjo me ilumina tanto
que mesmo mudo em tua língua canto

como um diabo que subindo aos céus
tentou muito mais de uma vez
quem sabe Gregório ou quem sabe Castro
descendo aos infernos como sempre fez

talvez Camões no corpo de um astro
me lance a infinita chama da pornô Gráfica lucidez

Artur Gomes
do livro Juras Secretas
Editora Penalux – 2018

www.secretasjuras.blogspot.com



F E N DA

estala-se o sol sobre a terra

rebenta a casca

sumo

seiva

carne

cerne

desenterra


abre a fenda

brita

debridamento

da ferida


camada funda

surge

dor que é grande

regurgita


Divanize Carboniere

FURAGEM – 2020

Carlini e Caniato Editorial



Desabafo

não tenho a nada a ver

com o teu complexo

e por favor

não tente definir meu sexo

Rúbia Querubim

www.porradalirica.blogspot.com


levanta meu boi

levanta

que é hora de levantar

acorda boi, povo todo

povo e boi tem de lutar


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