segunda-feira, 17 de outubro de 2022

Mostra Visual de Poesia Brasileira - Poesia em Movimento

 



"fogo-urucum"

 

fogo-

-urucum:

terror

terra

subjugada

floresta

em degredo.

queimadas:

homens-

-monstros-

-antinômicos-

-agros-

-devoradores

ceifadores

da morte.

através

do fogo-

-urucum

expõem

vísceras

de ínsulas.

ogros-

-grileiros-

-garimpeiros

idólatras

de moedas

deuses-

-mercado

de métodos

manuais-

-mecânicos-

-pneumáticos-

-predatórios

abatem

madeira

plantam

pasto

furtam (c)

ouro

propagam

soja

criam

gado.

rompem

territórios

com imensas

línguas

de fogo.

e em

vivicombúrio

exterminam

nativos

jardins

em meta

morfoses

de helicônias

em agonia.

flor

esta em

inflorescência

terminal.

lepidópteros

abatidos

em céus

de mercúrio-

-mármore

– helicópteros

aturdindo

a geografia

dos rios-

-meandros.

terror

no interior

da flor.

da selva

abrasada

das entranhas

de árvores

e animais

(desarvorados)

dentro

de um tempo

cicatriz

das atro(zes)

cidades.

*

by Ziul Serip, in "gênesis" [inédito]

imagem: "fogo na floresta", by ©Luiz Fernandes.





 Dosimetria

 

Sob a luz candeia

dos pensamentos versos

um girassol

vagueia...

 

Tal qual prancha à vela

desliza sobre um mar

de ideias e,

nada...

 

–Nada de mais nem de menos–

 

A nobre flor

Passeia, passeia

Perdida entre caos

e destemperos...

 

De outro plano, tempo e destino

– calculam a pena –

aquela talvez que caiba à mim...

 

Mas o girassol, este, tão somente contempla o sol,

reabastece

e fim.

 

Paulo Roberto Cunha



O Amor e o Outro


Não amo
melhor
        nem pior
do que ninguém.

Do meu jeito amo.
Ora esquisito, ora fogoso,
às vezes aflito
ou ensandecido de gozo.
Já amei
               até com nojo.

Coisas fabulosas
acontecem-me no leito. Nem sempre
de mim dependem, confesso.
O corpo do outro
é que é sempre surpreendente.


Affonso Romano de Sant’Anna 



 

Três amores

 

Maria

Dolores

Nina

Três amores eu sentia

Maria não me queria

Dolores enlouqueceu

Nina fez o que quis

Olhei Maria aflito

Dolores - o infinito

Nina amor de Sísifo

Tudo assim invertido

Tempo do sofro sofrido

Era sulco grave vida

Era uma saga espantalha

Se quase a minha mortalha

Quase fui tanto e feliz

 

Hamilton Faria



ANOITECER

         A Dolores

 

É a hora em que o sino toca,

mas aqui não há sinos;

há somente buzinas,

sirenes roucas, apitos

aflitos, pungentes, trágicos,

uivando escuro segredo;

desta hora tenho medo.

 

É a hora em que o pássaro volta,

mas de há muito não há pássaros;

só multidões compactas

escorrendo exaustas

como espesso óleo

que impregna o lajedo;

desta hora tenho medo.

 

É a hora do descanso,

mas o descanso vem tarde,

o corpo não pede sono,

depois de tanto rodar;

pede paz - morte - mergulho

no poço mais ermo e quedo;

desta hora tenho medo.

 

Hora da delicadeza,

gasalho, sombra, silêncio.

Haverá disso no mundo?

É antes a hora dos corvos,

bicando em mim, meu passado,

meu futuro, meu degredo;

desta hora, sim, tenho medo.

 

Carlos Drummond de Andrade

[A rosa do povo]





ressignificar eis o verbo

no poema do absinto

o sentido mais concreto

ou mesmo o abstrato

na argamassa do absurdo

 

Artur Fulinaíma




chamaram-me de atrevido

o fonema entrou pelos ouvidos

como um raio de Iansã

Federika nem percebeu

a serpente no espelho

     a mordida na Maçã

 

Federico Baudelaire 






FlorBela

 

A moça de longe

Do outro lado da janela

nos retalhos imortais do SerAfim

nunca olha para mim

mesmo quando estou na casa dela

 

EuGênio Mallarmè 






tenho pelas coisas simples
um tremendo apreço

uma coleção de pedras
para sedimentar um rio

asas de borboletas
para atravessar o oceano

cavacos de madeira
para reflorestar a Amazônia

 

pétalas de flores
para ornamentar milhares de jardins

percebi a tempo o exagero

hoje só coleciono poemas

 

Dinovaldo Gilioli



ANGÚSTIA E REAÇÃO

 

Há noites intransponíveis,

Há dias em que para nosso movimento em Deus,

Há tardes em que qualquer vagabunda

Parece mais alta do que a própria musa.

Há instantes em que um avião

Nos parece mais belo que um mistério de fé,

Em que uma teoria política

Tem mais realidade que o Evangelho.

Em que Jesus foge de nós, foi para o Egito;

O tempo sobrepõe-se à ideia do eterno.

É necessário morrer de tristeza e de nojo

Por viver num mundo aparentemente abandonado por Deus,

E ressuscitar pela força da prece, da poesia e do amor.

É necessário multiplicar-se em dez, em cinco mil.

É necessário chicotear os que profanam as igrejas

É necessário caminhar sobre as ondas.

 

Murilo Mendes




ADEUS, MEU CANTO

 

I

Adeus, meu canto! É a hora da partida...

O oceano do povo sencapela.

Filho da tempestade, irmão do raio,

Lança teu grito ao vento da procela.

O inverno envolto em mantos de geada

Cresta a rosa de amor que além se erguera...

Ave de arribação, voa, anuncia

Da liberdade a santa primavera.

É preciso partir, aos horizontes

Mandar o grito errante da vedeta.

Ergue-te, ó luz! — estrela para o povo,

— Para os tiranos — lúgubre cometa.

Adeus, meu canto! Na revolta praça

Ruge o clarim tremendo da batalha.

Águia — talvez as asas te espedacem,

Bandeira — talvez rasgue-te a metralha.

Mas não importa a ti, que no banquete

O manto sibarita não trajaste —,

Que se louros não tens na altiva fronte

Também da orgia a coroa renegaste.

A ti que herdeiro duma raça livre

Tomaste o velho arnês e a cota darmas;

E no ginete que escarvava os vales

A corneta esperaste dos alarmas.

É tempo agora pra quem sonha a glória

E a luta... e a luta, essa fatal fornalha,

Onde referve o bronze das estátuas,

Que a mão dos seclos no futuro talha ...

Parte, pois, solta livre aos quatro ventos

A alma cheia das crenças do poeta!...

Ergue-te ó luz! — estrela para o povo,

Para os tiranos — lúgubre cometa.

Há muita virgem que ao prostíbulo impuro

A mão do algoz arrasta pela trança;

Muita cabeça dancião curvada,

Muito riso afogado de criança.

Dirás à virgem: — Minha irmã, espera:

Eu vejo ao longe a pomba do futuro.

— Meu pai, dirás ao velho, dá-me o fardo

Que atropela-te o passo mal seguro ...

A cada berço levarás a crença.

A cada campa levarás o pranto.

Nos berços nus, nas sepulturas rasas,

— Irmão do pobre — viverás, meu canto.

E pendido através de dois abismos,

Com os pés na terra e a fronte no infinito,

Traze a bênção de Deus ao cativeiro,

Levanta a Deus do cativeiro o grito!

 

II

Eu sei que ao longe na praça,

Ferve a onda popular,

Que às vezes é pelourinho,

Mas poucas vezes — altar.

Que zombam do bardo atento,

Curvo aos murmúrios do vento

Nas florestas do existir,

Que babam fel e ironia

Sobre o ovo da utopia

Que guarda a ave do porvir.

Eu sei que o ódio, o egoísmo,

A hipocrisia, a ambição,

Almas escuras de grutas,

Onde não desce um clarão,

Peitos surdos às conquistas,

Olhos fechados às vistas,

Vistas fechadas à luz,

Do poeta solitário

Lançam pedras ao calvário,

Lançam blasfêmias à cruz.

Eu sei que a raça impudente

Do escriba, do fariseu,

Que ao Cristo eleva o patíbulo,

A fogueira a Galileu,

É o fumo da chama vasta,

Sombra — que o século arrasta,

Negra, torcida, a seus pés;

Tronco enraizado no inferno,

Que se arqueia escuro, eterno,

Das idades através.

E eles dizem, reclinados

Nos festins de Baltasar:

"Que importuno é esse que canta

Lá no Eufrate a soluçar?

Prende aos ramos do salgueiro

A lira do cativeiro,

Profeta da maldição,

Ou cingindo a augusta fronte

Com as rosas dAnacreonte

Canta o amor e a criação. . ."

Sim! cantar o campo, as selvas,

As tardes, a sombra, a luz;

Soltar sualma com o bando

Das borboletas azuis;

Ouvir o vento que geme,

Sentir a folha que treme,

Como um seio que pulou,

Das matas entre os desvios,

Passar nos antros bravios

Por onde o jaguar passou;

É belo... E já quantas vezes

Não saudei a terra — o céu,

E o Universo — Bíblia imensa

Que Deus no espaço escreveu?1

Que vezes nas cordilheiras,

Ao canto das cachoeiras,

Eu lancei minha canção,

Escutando as ventanias

Vagas, tristes profecias

Gemerem na escuridão?! ...

Já também amei as flores,

As mulheres, o arrebol,

E o sino que chora triste,

Ao morno calor do sol.

Ouvi saudoso a viola,

Que ao sertanejo consola,

Junto à fogueira do lar,

Amei a linda serrana,

Cantando a mole tirana,

Pelas noites de luar!

Da infância o tempo fugindo

Tudo mudou-se em redor.

Um dia passa em minhaalma

Das cidades o rumor.

Soa a idéia, soa o malho,

O ciclope do trabalho

Prepara o raio do sol.

Tem o povo — mar violento —

Por armas o pensamento,

A verdade por farol.

E o homem, vaga que nasce

No oceano popular,

Tem que impelir os espíritos,

Tem uma plaga a buscar

Oh! maldição ao poeta

Que foge — falso profeta —

Nos dias de provação!

Que mistura o tosco iambo

Com o tírio ditirambo

Nos poemas daflição! ...

"Trabalhar!" brada na sombra

A voz imensa, de Deus —

"Braços! voltai-vos pra terra,

Frontes voltai-vos pros céus!"

Poeta, sábio, selvagem,

Vós sois a santa equipagem

Da nau da civilização!

Marinheiro, — sobe aos mastros,

Piloto, — estuda nos astros,

Gajeiro, — olha a cerração!"

Uivava a negra tormenta

Na enxárcia, nos mastaréus.

Uivavam nos tombadilhos,

Gritos insontes de réus.

Vi a equipagem medrosa

Da morte à vaga horrorosa

Seu próprio irmão sacudir.

E bradei: — "Meu canto, voa,

Terra ao longe! terra à proa! ...

Vejo a terra do porvir!. . . "

 

III

Companheiro da noite mal dormida,

Que a mocidade vela sonhadora,

Primeira folha dárvore da vida.

Estrela que anuncia a luz da aurora,

Da harpa do meu amor nota perdida,

Orvalho que do seio se evapora,

É tempo de partir... Voa, meu canto, —

Que tantas vezes orvalhei de pranto.

Tu foste a estrela vésper que alumia

Aos pastores dArcádia nos fraguedos!

Ave que no meu peito se aquecia

Ao murmúrio talvez dos meus segredos.

Mas hoje que sinistra ventania

Muge nas selvas, ruge nos rochedos,

Condor sem rumo, errante, que esvoaça,

Deixo-te entregue ao vento da desgraça.

Quero-te assim; na terra o teu fadário

É ser o irmão do escravo que trabalha,

É chorar junto à cruz do seu calvário,

É bramir do senhor na bacanália...

Se — vivo — seguirás o itinerário,

Mas, se — morto — rolares na mortalha,

Terás, selvagem filho da floresta,

Nos raios e trovões hinos de festa.

Quando a piedosa, errante caravana,

Se perde nos desertos, peregrina,

Buscando na cidade muçulmana,

Do sepulcro de Deus a vasta ruína,

Olha o sol que se esconde na savana

Pensa em Jerusalém, sempre divina,

Morre feliz, deixando sobre a estrada

O marco miliário duma ossada.

Assim, quando essa turba horripilante,

Hipócrita sem fé, bacante impura,

Possa curvar-te a fronte de gigante,

Possa quebrar-te as malhas da armadura,

Tu deixarás na liça o férreo guante

Que há de colher a geração futura...

Mas, não... crê no porvir, na mocidade,

Sol brilhante do céu da liberdade.

Canta, filho da luz da zona ardente,

Destes cerros soberbos, altanados!

Emboca a tuba lúgubre, estridente,

Em que aprendeste a rebramir teus brados.

Levanta das orgias — o presente,

Levanta dos sepulcros — o passado,

Voz de ferro! desperta as almas grandes

Do sul ao norte... do oceano aos Andes!!...

 

Castro Alves



 

Vozes-mulheres


A voz de minha bisavó
ecoou criança
nos porões do navio.
ecoou lamentos
de uma infância perdida.

A voz de minha avó
ecoou obediência
aos brancos-donos de tudo.

A voz de minha mãe
ecoou baixinho revolta
no fundo das cozinhas alheias
debaixo das trouxas
roupagens sujas dos brancos
pelo caminho empoeirado
rumo à favela

A minha voz ainda
ecoa versos perplexos
com rimas de sangue
e
fome.

A voz de minha filha
recolhe todas as nossas vozes
recolhe em si
as vozes mudas caladas
engasgadas nas gargantas.

A voz de minha filha
recolhe em si
a fala e o ato.
O ontem — o hoje — o agora.
Na voz de minha filha
se fará ouvir a ressonância
O eco da vida-liberdade.

 

Conceição Evaristo 




"Violões que Choram

Ah! plangentes violões dormentes, mornos,
Soluços ao luar, choros ao vento...
Tristes perfis, os mais vagos contornos,
Bocas murmurejantes de lamento.

Noites de além, remotas, que eu recordo,
Noites da solidão, noites remotas
Que nos azuis da fantasia bordo,
Vou constelando de visões ignotas.

Sutis palpitações à luz da lua.
Anseio dos momentos mais saudosos,
Quando lá choram na deserta rua
As cordas vivas dos violões chorosos.

Quando os sons dos violões vão soluçando,
Quando os sons dos violões nas cordas gemem,
E vão dilacerando e deliciando,
Rasgando as almas que nas sombras tremem.

Harmonias que pungem, que laceram,
Dedos nervosos e ágeis que percorrem
Cordas e um mundo de dolências geram,
Gemidos, prantos, que no espaço morrem...

E sons soturnos, suspiradas mágoas,
Mágoas amargas e melancolias,
No sussurro monótono das águas,
Noturnamente, entre ramagens frias.

Vozes veladas, veludosas vozes,
Volúpias dos violões, vozes veladas,
Vagam nos velhos vórtices velozes
Dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas.
Tudo nas cordas dos violões ecoa
E vibra e se contorce no ar, convulso...
Tudo na noite, tudo clama e voa
Sob a febril agitação de um pulso.

Que esses violões nevoentos e tristonhos
São ilhas de degredo atroz, funéreo,
Para onde vão, fatigadas no sonho,
Almas que se abismaram no mistério.

CRUZ E SOUSA. Violões que choram.





Pátria Minha

 

A minha pátria é como se não fosse, é íntima
Doçura e vontade de chorar; uma criança dormindo
É minha pátria. Por isso, no exílio
Assistindo dormir meu filho
Choro de saudades de minha pátria.

Se me perguntarem o que é a minha pátria, direi:
Não sei. De fato, não sei
Como, por que e quando a minha pátria
Mas sei que a minha pátria é a luz, o sal e a água
Que elaboram e liquefazem a minha mágoa
Em longas lágrimas amargas.

Vontade de beijar os olhos de minha pátria
De niná-la, de passar-lhe a mão pelos cabelos...
Vontade de mudar as cores do vestido (auriverde!) tão feias
De minha pátria, de minha pátria sem sapatos
E sem meias, pátria minha
Tão pobrinha!

Porque te amo tanto, pátria minha, eu que não tenho
Pátria, eu semente que nasci do vento
Eu que não vou e não venho, eu que permaneço
Em contato com a dor do tempo, eu elemento
De ligação entre a ação e o pensamento
Eu fio invisível no espaço de todo adeus
Eu, o sem Deus!

Tenho-te no entanto em mim como um gemido
De flor; tenho-te como um amor morrido
A quem se jurou; tenho-te como uma fé
Sem dogma; tenho-te em tudo em que não me sinto a jeito
Nesta sala estrangeira com lareira
E sem pé-direito.

Ah, pátria minha, lembra-me uma noite no Maine, Nova Inglaterra
Quando tudo passou a ser infinito e nada terra
E eu vi alfa e beta de Centauro escalarem o monte até o céu
Muitos me surpreenderam parado no campo sem luz
À espera de ver surgir a Cruz do Sul
Que eu sabia, mas amanheceu...

Fonte de mel, bicho triste, pátria minha
Amada, idolatrada, salve, salve!
Que mais doce esperança acorrentada
O não poder dizer-te: aguarda...
Não tardo!

Quero rever-te, pátria minha, e para
Rever-te me esqueci de tudo
Fui cego, estropiado, surdo, mudo
Vi minha humilde morte cara a cara
Rasguei poemas, mulheres, horizontes
Fiquei simples, sem fontes.

Pátria minha... A minha pátria não é florão, nem ostenta
Lábaro não; a minha pátria é desolação
De caminhos, a minha pátria é terra sedenta
E praia branca; a minha pátria é o grande rio secular
Que bebe nuvem, come terra
E urina mar.

Mais do que a mais garrida a minha pátria tem
Uma quentura, um querer bem, um bem
Um libertas quae sera tamen
Que um dia traduzi num exame escrito:
"Liberta que serás também"
E repito!

Ponho no vento o ouvido e escuto a brisa
Que brinca em teus cabelos e te alisa
Pátria minha, e perfuma o teu chão...
Que vontade me vem de adormecer-me
Entre teus doces montes, pátria minha
Atento à fome em tuas entranhas
E ao batuque em teu coração.

Não te direi o nome, pátria minha
Teu nome é pátria amada, é patriazinha
Não rima com mãe gentil
Vives em mim como uma filha, que és
Uma ilha de ternura: a Ilha
Brasil, talvez.

Agora chamarei a amiga cotovia
E pedirei que peça ao rouxinol do dia
Que peça ao sabiá
Para levar-te presto este avigrama:
"Pátria minha, saudades de quem te ama…

Vinicius de Moraes."

 

Clique no link para ouvir o poema na voz do próprio Vinicius

https://www.youtube.com/watch?v=zra_IHH6mrE&t=5s






testamento

 

a tesoura rasga o tecido da carne

enquanto sangra

no processo cirúrgico do poema

corta de cada palavra a sílaba

que não presta

de cada frase a palavra

de cada sílaba a letra morfa

e o poeta vai vivendo no que resta

 

Artur Gomes

Pátria A(r )mada

Desconcertos Editora - 2022



entretanto

 

eu tenho sede

eu tenho fome

eu tenho sede de canto

eu tenho fome de conto

assim quando me encontro

ou desencontro

 canto e conto

a música do desconcerto

o conto do desencanto

e no entanto confesso

que não sou triste

um poema ainda existe

pra me animar do desconforto

para me salvar do entretanto

 

Rúbia Querubim

https://coletivomacunaimadecultura.blogspot.com/






Amor

 

Amor, então

também acaba?

Não que eu saiba.

O que eu sei

é que se transforma

numa matéria-prima

que a vida se encarrega

de transformar em raiva.

Ou em rima

 

Paulo Leminski



18 de outubro: outro aniversário sem festa: o caminhão, na Estrada de Santos.

houve uma vez um verão
[sil guimarães]

fumava minister
usava azzaro
mascava ping-pong

seu nome no obituário antigo
lembrou-me o caminho da ilha
a árvore com nossas letras
entrelaçadas dentro de um coração

quem recolheu suas asas, meu anjo torto?
quem contou suas fraturas, catou os ossos?

guardo para sempre
os estilhaços que vi em seus olhos claros
na hora da despedida

um gosto de naufrágio
o coração submerso
o lenço vermelho — inútil patuá

a tristeza é um passarinho que não sabe voar


[imagem laura makabresku ]

 




Nenhum comentário:

Postar um comentário

Vampiro Goytacá Canibal Tupiniquim

                                                    Artur Gomes   vampiro goytacá canibal tupiniquim   *             poesia muit...